Perguntas aos manifestantes

20/03/2015
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Os jornais, as rádios e as TVs no Brasil inteiro informam, eufóricos, a grandeza das manifestações do dia 15, domingo. Sua satisfação é evidente, pois foram os grandes anunciantes e estimuladores da massividade dos eventos.

 

Seus âncoras e locutores narravam os acontecimentos como uma final de campeonato. “Saiam de casa, venham, ainda há lugares”. “Nâo percam o espetáculo”.

 

A grande unanimidade era o verde-amarelo, afinal, continuamos todos brasileiros e a bandeira unifica facilmente, como a velha marca de cigarros, “preferência nacional”.

 

O coro dos descontentes também estava afinado contra Dilma e contra o PT. Ao menos, essas duas bandeiras foram as prediletas da cobertura televisiva. Seus preciosos segundos chegavam a minutos para que não perdessem o foco da ira popular: Dilma e PT.

 

Não queremos empanar a festa, mas não seria demais perguntar onde estavam os cartazes contra os mega-empresários, contra os tecnocratas diretores da Petrobras, os mafiosos doleiros da lavagem das propinas, enfim, os verdadeiros culpados pela corrupção e que estão presos e são réus confessos??

 

Uma verdadeira injustiça! Nenhum cartazinho contra a Camargo Correa, nenhuma menção à OAS, Andrade Gutierrez e seus honrados proprietários. Por sinal, não havia nada também sobre a lista do HSBC onde estão todas as famílias da grande mídia nacional.

 

Será que não ocorreu a nenhum dos manifestantes fazer-se a pergunta: é crível que um bilionário todo-poderoso desses não seria ouvido pela polícia, pelo presidente (a) da República, pelo Ministério Público na primeira tentativa de ser achacado, sofrer chantagem ou “ser tentado” pelos tecnocratas da Petrobrás??

 

Não passou e não passa pela cabeça dos marchadores pela ética e pela moral que, inversamente, os altos funcionários da estatal – muito bem remunerados – se eles fossem tentados ou corrompidos pelo poder do capital, não poderiam ter procurado as mesmas instituições para, como qualquer cidadão de bem, denunciar os corruptores??

 

Praticam isso há décadas, em conluio, de comum acordo. As burras cheias do diretor Barusco estavam em nome de quem? De algum Partido, da presidente Dilma ou dele mesmo??

 

Sem cartazes, bandeiras ou palavras de ordem que incluam os réus confessos e presos na Operação Lava-Jato, o movimento, por maior que seja, perde razão e legitimidade!

 

Vira preconceito e intolerância, coisas que não combinam com a democracia.

 

Da mesma forma, cobrar da presidenta Dilma a responsabilidade da “crise que se avizinha”, “da espiral inflacionária prestes a explodir”, é algo, no mínimo, esquizofrênico.

 

A pressão do grande capital, do rentismo financeiro, da grande mídia monopólica, verdadeiro cerco permanente sobre o governo, levou a presidenta a indicar para o Ministério da Fazenda, Joaquim Levy, homem de confiança desses setores e que sintonizado com o discurso da oposição mesmo antes da posse já prometia “ajuste fiscal”, ‘austeridade econômica”, leia-se diminuir gastos públicos, gerar desemprego e cortar salários. A taxa Selic foi a quase 13% para locupletar a agiotagem financeira e paralisar o investimento produtivo.

 

Cercado pela mídia, pelo Congresso opositor que quer ser situação nos cargos e oposição na política, o governo sinaliza uma mudança econômica de viés neoliberal e a resposta da mídia, do empresariado e os manifestantes é o impedimento?

 

O que pensam os manifestantes sobre isso? O pendão verde-amarelo e o moralismo lacerdista não respondem essa questão.

 

Os grupos da mídia, as entidades empresariais que estimularam, apoiaram as manifestações precisam responder a esta questão. As iniciativas do ministro Levy estão certas? Estão de acordo com o que os senhores queriam? Essa é a forma de sair da “grave crise econômica” que foi inventada para justificar a barragem de fogo contra a presidenta Dilma?

 

Não retiramos o direito de ninguém se manifestar, marchar, reivindicar, lutar por seus interesses. Toda nossa trajetória política foi assim e continuará sendo. É necessário, no entanto, ter consciência e clareza pelo que se luta. Estivemos nas ruas em defesa da Petrobrás, símbolo da luta nacional por um desenvolvimento industrial a serviço do país e por uma pauta que não abra mão de direitos já alcançados e de uma política econômica subordinada ao emprego e à distribuição de renda.

 

Nas próximas manifestações seria importante que esses temas também estivessem na pauta.

 

Agora, todos nós podemos ser poupados da demagogia e do oportunismo de dirigentes e deputados de partidos “oposicionistas”, como o jovem e saltitante deputado Van Hatten do Partido Progressista sempre ligeiro na denúncia e na crítica ao PT e que não carregou nenhum cartaz contra toda sua bancada federal gaúcha afundada até o pescoço na Operação Lava-Jato.

 

De nossa parte, continuaremos lutando dentro do nosso Partido para que qualquer filiado denunciado e investigado em processo de corrupção seja, imediatamente, afastado de sua função ou cargo partidário, para que faça sua defesa, sem que paire qualquer dúvida sobre a total e absoluta postura contrária do Partido sobre comportamentos ilegais e anti-éticos.

 

Por fim, estamos convencidos de que o mote das mobilizações oposicionistas para quem as organiza e estimula está menos nas passeatas de domingo e mais nos rumos que a política governamental irá tomar. Certamente, as mobilizações são serão tão homogêneas.

 

Nós queremos que o governo assuma, efetivamente, a pauta que nos trouxe até aqui: crescimento, emprego, distribuição de renda, inclusão social e integração com os povos latino-americanos. Isso não se faz com a pauta neoliberal do Ministro Levy.

 

- Raul Pont é professor aposentado e membro do DN/PT

 

20/mar/2015

http://www.sul21.com.br/jornal/perguntas-aos-manifestantes/

 

https://www.alainet.org/pt/articulo/168343
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