Fim das doações de empresas:
A democracia exige uma resposta
31/07/2014
- Opinión
As Jornadas de Junho fazem parte do passado. Já as promessas de Reforma Política ou as mudanças substanciais no processo eleitoral prometidas, no entanto, não foram cumpridas pelo Congresso Nacional até agora, o que também não quer dizer que foram esquecidas pela população que foi às ruas.
Diante da omissão do Parlamento, criou-se uma expectativa em torno do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4650, proposta pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para questionar o financiamento de empresas a partidos políticos e campanhas eleitorais. Ficamos na espera de que o fim das doações empresariais pudesse vigorar já nessas eleições de 2014. Infelizmente, fomos vítimas de mais um engodo.
Desde o pedido de vista ao processo do ministro Gilmar Mendes, feito em abril com a nítida intenção de suspender o julgamento (já que o magistrado expressou posição contrária à proibição), muito pouco foi feito. Assim, continuamos numa lógica distorcida do processo eleitoral, com candidatos mais preocupados em buscar o patrocínio de pessoas jurídicas do que o voto de eleitores.
Recentemente, o deputado federal Henrique Fontana (PT), relator da Reforma Política, denunciou que o grupo com as dez maiores doadoras de campanha é formado por construtoras e incorporadoras, que destinam donativos a todos os partidos, sem exceção. Segundo o site Congresso em Foco, aumentou a participação de pessoas jurídicas no processo eleitoral. Em 2008, 86% dos recursos financeiros das campanhas vinham de doações de empresas. Quatro anos depois, o número chegou a 91%. Nas eleições municipais de 2012 foi ainda maior: 95% de todo o dinheiro movimentado veio de pessoas jurídicas. Vale lembrar que a Lei 9.504, de 1997, estabelece como limite de doações para pessoas físicas até 10% do valor bruto auferido no ano anterior; já no caso de pessoa jurídica, o limite é de 2%.
É obvio que a judicialização não resolve a questão por completo. Ela deve ser complementar. Por isso, os movimentos populares (organizações não governamentais, sindicais e sociais) estão propondo a realização do Plebiscito Popular por uma Constituinte Exclusiva, na primeira semana de setembro. O objetivo é fazer pressão por mudanças significativas e substanciais nas regras do jogo eleitoral de forma a tirar do papel a tão esperada Reforma Política.
Com as eleições de 2014 é possível que seja feita uma renovação no Congresso Nacional. Uma oportunidade histórica para superar as graves distorções do sistema democrático e corrigir o modelo atual, para que haja um melhor nivelamento do processo eleitoral. Assim, o julgamento favorável da ADI 4650 pelo STF poderá garantir a independência das instituições políticas com relação ao poder econômico, de forma com que os candidatos possam disputar o voto dos eleitores com mais igualdade e transparência. Ao contrário do que acontece hoje, quando conquistar o apoio das empresas, e as polpudas doações, a parece valer mais do que a confiança das pessoas, apresentando propostas e programas de governo.
De fato, enquanto não tivermos a coragem de estabelecer limites adequados e razoáveis para o financiamento de campanhas eleitorais, o processo de mercadorização do voto será cada vez mais um fator decisivo na eleição. Dessa forma, quanto mais verbas um candidato arrecadar, maiores serão as chances de ser eleito. E seguiremos nesse círculo vicioso. Até quando?
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- Cristiano Lange dos Santos é advogado. Especialista e Mestre em Direito, foi Professor de Direito Constitucional. Atua como Procurador Jurídico do Laboratório de Políticas Públicas e Sociais – LAPPUS.
- Marcelo Sgarbossa é advogado. Mestre em Análise de Políticas Públicas pela Universidade de Turim (Itália) e Doutorando em Direito pela UFRGS. Vereador pelo Partido dos Trabalhadores (PT) em Porto Alegre.
1/ago/2014
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