Trabalhadores sem salário na obra da autopista de contorno sul

29/06/2017
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Foto: Vilmar Both
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Enquanto no Senado segue o massacre contra os trabalhadores com a aprovação das contrarreformas trabalhistas, que garantirão aos patrões a possibilidade de explorar ainda mais seus empregados sem que sejam tolhidos pela lei, a vida real já vai mostrando que a tendência é só piorar para os trabalhadores.

 

Hoje, mesmo com leis que supostamente deveriam proteger os que vendem sua força de trabalho dos abusos patronais, os que detém o controle dos meios de produção fazem o que bem entendem, deixando os trabalhadores à mingua quando o que está em jogo é o lucro de seus negócios.

 

É o que acontece nesse momento no complexo das obras do chamado Contorno Rodoviário de Florianópolis, onde caminhoneiros estão parados em manifestação, exigindo o pagamento de salários. Ou seja, eles já cumpriram com sua parte no acordo – trabalharam – mas a empresa que os contratou simplesmente diz que não recebeu da outra que a contratou e assim, não tem como pagar. Simples assim.

 

É o processo de terceirização e até de quarteirização que vai atuando em escala, chegando à ponta do sistema, que é o trabalhador. E nessa articulação macabra, quem perde nunca é o empresário. Esse terror de viver sem amparo legal e precisar lutar até para ganhar o que é de direito é o que os deputados, senadores e governo federal querem para toda a gente.

 

Agora, dezenas de famílias estão na amargura, sem o pagamento de salários. E quem poderá defendê-los?  A lei? Difícil acreditar que o judiciário possa atuar na defesa dos trabalhadores. O que resta é a luta. Por isso, os caminhoneiros montaram um acampamento em frente à empresa responsável pelas obras e exigem seus direitos. 

 

O Contorno Rodoviário de Florianópolis é uma obra gigante, que deveria ser tocada pelo Grupo Arteris, que foi quem ganhou a licitação para  construir a autopista de 50 quilômetros de extensão que contornará a região metropolitana, supostamente melhorando o trânsito.  O traçado passa pelos municípios de Governador Celso Ramos, Biguaçu, São José e Palhoça. O Instituto de Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) já emitiu a Licença de Instalação para a execução da obra, que está em andamento desde 29 de maio de 2014, quando os trabalhos começaram no Trecho Intermediário. Os serviços no Trecho Norte começaram em 27 de abril de 2015.

 

Mas, como acontece num país onde a terceirização é regra, a Arteris não se ocupou do serviço de caminhões, contratando para isso uma segunda empresa, a Pavsolo. Segundo Vilmar Both, que é morador na região e esteve conversando essa manhã com os trabalhadores,  já faz quatro meses que a Arteris não repassa recursos para a Pavsolo, e esta não paga os trabalhadores. 

 

Não bastasse isso, a Pavsolo quarterizou o serviço com outros donos de caminhão e estes também não tiveram seus contratos honrados. Muitos desses caminhoneiros nem são de Santa Catarina, vêm de outros estados buscando trabalho. Alguns estão dormindo agora nos próprios caminhões, pois não têm dinheiro para pagar  o aluguel das casas que haviam alugado para ficar na região. Como estão sem salário também precisam da ajuda da vizinhança para poder comer. A situação é dramática. 

 

No acampamento, localizado no Sertão do Maruim, na Avenida Celso Joaquim da Silva, entrada da UNIVALI, os caminhoneiros reivindicam o salário da empresa responsável pela obra, a Arteris, mas essa diz que a responsabilidade é da Pavsolo. A Pavsolo diz que sem os recursos da Arteris não têm como pagar. É um impasse. Na sede da empresa Arteris a vida segue na normalidade, e ninguém se responsabiliza pelos trabalhadores lá da ponta do sistema. Um setor manda a ligação para outro setor até que uma voz diz que será o setor de comunicação o que dará alguma informação: “Deixe seu telefone que eles vão ligar”. A assessora de imprensa liga e diz que os caminhoneiros não são responsabilidade da Arteris, e sim da Pavasolo. “Tudo está dentro da lei. É melhor você ligar para a Pavsolo”. 

 

Ligo para a Pavsolo. O atendimento tem de ser feito pela assessoria de comunicação, mas o telefone da assessoria não atende. Nem o celular. Silêncio. 

 

É o que acontece no mundo das grandes corporações. A impressão que se tem é de que não existe nenhum ser humano responsável.  A empresa é tão grande e aglomera outro número tão grande de pequenas outras empresas que vai perdendo toda a sua relação com a vida real. E como é comum no sistema capitalista monopólico, o que menos interessa são as necessidades do trabalhador. 

 

A Arteris S.A. é uma empresa de capital aberto com ações listadas no Novo Mercado da Bovespa e tem 69,3% do seu controle detido pela Partícipes en Brasil S.L., que apesar de ter o Brasil no nome tem sua base em Madri, na Espanha. Ela também tem suas ações divididas em 51% pela Abertis Infraestructuras S.A. , igualmente com sede na Espanha e 49% pela Brookfield Motorways Holdings SRL, outro grupo espanhol.  Isso significa que os lucros dessa empresa são todos sangrados para a Espanha. O conglomero é responsável por obras em vários países da América Latina. 

 

A dolorosa luta de um pequeno grupo de caminhoneiros em Santa Catarina é o retrato vivo da ação das grandes empresas com suas práticas de terceirização e até quarteirização, como se pode constatar aqui.

 

Então, para qualquer pessoa fica bem claro o quanto o discurso do governo e dos congressistas é mentiroso quando anuncia que a terceirização é boa para os trabalhadores.  Também é mentira que a reforma trabalhista venha a aumentar empregos e melhorar a vida das gentes. O que vai acontecer é isso que já se vê: empresas gigantes, sem rosto visível, no geral transnacionais, contratam empresas menores, que também ficam reféns e acabam descontando nos trabalhadores. No final, sempre quem sofre as consequências são os que têm apenas a força de trabalho para vender. Essa é a verdade.

 

Como para as empresas o que importa é o seu lucro, os trabalhadores que se danem. Se não tiverem o que comer, ou não puderem pagar seus aluguéis, que sumam. 

 

É assim.  

 

 

 

 

https://www.alainet.org/pt/articulo/186486
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