“República de bananas”: a imprensa internacional deu ao golpe o nome que ele tem

20/04/2016
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A tentativa de Michel Temer de iniciar uma “ofensiva” no exterior contra a percepção de que não somos uma república de bananas fracassou antes de começar.

 

O senador Aloysio Nunes, do PSDB, pau mandado de Temer, foi a Washington para explicar a situação. Havia tomado uma invertida de Luis Almagro, secretário-geral da Organização dos Estados Americanos, OEA, e de Ernesto Samper, Secretário Geral da União de Nações Sul-Americanas, Unasul.

 

Almagro afirmou não ver “fundamento” para o impeachment. “Se houvesse uma acusação bem fundamentada, como houve em outros casos no Brasil, então perfeito. Mas isso não existe e é muito desonesto apresentar nesses termos”.

 

“Vamos explicar que no Brasil as instituições funcionam e os direitos são respeitados, ao contrário do que petistas vêm dizendo”, falou Aloysio. Ele teria encontros com um subsecretário e outros membros do governo americano.

 

O problema é que não são só “petistas” dizendo. A iniciativa dos Trapalhões já dá, de cara, uma dimensão do que se pode esperar. É tarde demais para tirar da lata de lixo o esquema. Lá fora, a história já está sendo contada como ela é.

 

Se Temer e sua turma podem contar com a imprensa brasileira, isso não ocorre com a imprensa internacional. Correspondentes e analistas europeus e americanos fizeram o que a grande mídia brasileira não faz: apuraram os fatos e os publicaram.

 

O resultado é uma desmoralização do impeachment, de seus autores e, por extensão, do país.

 

Christiane Amanpour, da CNN, realizou uma bela matéria sobre a votação do domingo, tendo como convidado especial o sempre lúcido Glenn Greenwald — o mesmo Greenwald que, na entrevista com Lula, se declarou “chocado como as Organizações Globo, Veja, Estadão, tão envolvidos no movimento contra o governo, defendendo os partidos da oposição. “.

 

A edição espanhola do “El País” falou em “circo” e deu a manchete “Deus enterra a presidente do Brasil”. A revista alemã Der Spiegel deu o título de “A insurreição dos hipócritas” para a matéria em que lembrou que o Congresso usou meios “constitucionalmente questionáveis” para colocar o “avariado navio Brasil” numa “robusta rota de direita”.

 

Segundo o Guardian, temos uma Câmara “hostil e manchada pela corrupção”. “O ponto mais baixo foi quando Jair Bolsonaro, o deputado de extrema direita do Rio de Janeiro, dedicou seu voto a Carlos Brilhante Ulstra, o coronel que comandou a tortura do DOI-Codi durante a era ditatorial”, e levou “uma cusparada do deputado de esquerda Jean Wyllys”, lê-se.

 

Antes disso, o “seminário” de Gilmar Mendes em Lisboa já havia sido esvaziado de autoridades portuguesas e alvo de reportagens e artigos contundentes e certeiros do jornal Público.

 

A lista inclui a Economist, o New York Times, o Los Angeles Times. Em qualquer lugar do mundo, parlamentares corruptos e desqualificados não estão em posição de julgar uma presidente que não cometeu crime. Ponto.

 

O golpe paraguaio só encontra justificativa em malabarismos da lógica com as elianes, mervals, reinaldos, jabores etc.

 

Nessa hora, surge entre muitos deles o oposto do complexo de vira-latas: a soberba (que, no final das contas, é a mesma coisa, dois extremos que se tocam).

 

Eliane Cantanhêde, do Estadão e da GloboNews, deu bandeira no dia 19. No Twitter, Eliane atacou os correspondentes: “eles ficam no Rio e em SP, sujeitos às versões pop e longe das múltiplas visões de país que se concentram em Brasília.”

 

Sabe-se lá o que são “versões pop”. Segundo Eliane, eles devem se estabelecer não nas duas maiores cidades do Brasil, mas na capital. Eliane acredita tanto nisso que nem ela mora lá. Caio Blinder dá lições para Greenwald. Caio Blinder.

 

É o mito grego de Procusto. Bandido que vivia numa floresta, ele mandou fazer uma cama com as medidas exatas de seu corpo, nem um milímetro a mais.

 

Quando capturava alguém na estrada, ele amarrava a pessoa àquele móvel. Se fosse maior, cortava o que estava sobrando. Se menor, espichava até caber.

 

A imprensa brasileira faz isso com o noticiário do impedimento: tem de caber na narrativa. As publicações do estrangeiro estão dando ao golpe o nome que ele tem. Ninguém, muitos Michel Temer e seus cúmplices, vai mudar isso agora.

 

 

Kiko Nogueira é Diretor-adjunto do Diário do Centro do Mundo. Jornalista e músico. Foi fundador e diretor de redação da Revista Alfa; editor da Veja São Paulo; diretor de redação da Viagem e Turismo e do Guia Quatro Rodas.

 

19 Apr 2016

http://www.diariodocentrodomundo.com.br/republica-de-bananas-a-imprensa-internacional-deu-ao-golpe-o-nome-que-ele-tem-por-kiko-nogueira/

 

https://www.alainet.org/pt/articulo/176905
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