Violências contra a mulher

15/07/2010
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 O hediondo crime que envolve o  goleiro Bruno – a mulher, após ser assassinada, teve o corpo destroçado e  devorado por cães, segundo denúncia – é a ponta do iceberg de um problema  recorrente: a agressão masculina à mulher.

 Entre 1997 e 2007,  segundo o Mapa da Violência no Brasil/2010, 41.532 mulheres foram  assassinadas no país. Um índice de 4,2 vítimas por cada grupo de 100 mil  habitantes, bem acima da média internacional. O Espírito Santo apresenta o  quadro mais grave: 10,3 assassinatos de mulheres/100 mil.

 O  Núcleo de Violência da Universidade de São Paulo identifica como assassinos  maridos, ex-maridos e namorados inconformados com o fim da relação. Ao forte  componente de misoginia (aversão à mulher), acresce-se a prepotência machista  de quem se julga dono da parceira e, portanto, senhor absoluto sobre o destino  dela.

A Central de Atendimento à Mulher (telefone 180) recebeu,  nos primeiros cinco meses deste ano, 95% mais denúncias do que no mesmo  período do ano passado. Mais de 50 mil mulheres denunciaram agressões verbais  e físicas. A maioria é de mulheres negras, casadas, com idade entre 20 e 45  anos e nível médio de escolaridade. Os agressores são, em maioria, homens com  idade entre 20 e 55 anos e nível médio de escolaridade.  

 Acredita-se que o aumento de denúncias se deve à Lei Maria da  Penha, sancionada em 2006 pelo presidente Lula, e que aumenta o rigor da  punição aos agressores. Apesar desse avanço, tudo indica que muitos lares  brasileiros são verdadeiras casas dos horrores. A mulher é humilhada,  destratada, surrada, por vezes vive em regime de encarceramento virtual e de  semiescravidão no trabalho doméstico. Sem contar os casos de pedofilia e  agressão sexual de crianças e adolescentes por parte do próprio  pai.

 A violência contra a mulher decorre de vários fatores, a  começar pela omissão das próprias vítimas que, dependentes emocional e  financeiramente do agressor, ou em nome da preservação do núcleo familiar,  ficam caladas ou dominadas pelo pavor frente aos efeitos de uma denúncia.  Soma-se a isso a impunidade. Eliza Zamudio, ex-namorada do goleiro Bruno,  teria recorrido à Delegacia de Defesa da Mulher, sem que sua queixa tivesse  sido levada a sério. Raramente o poder público assegura proteção à vítima e é  ágil na punição ao agressor.

 A violência contra a mulher não  ocorre apenas nas relações interpessoais. Ela é generalizada pela cultura  mercantilizada em que vivemos. Basta observar a multiplicidade de anúncios  televisivos que fazem  da mulher isca pornográfica de consumo.  

 Pare diante de uma banca de revistas e confira a diversidade do  “açougue” fotográfico! Preste atenção no papéis femininos em programas  humorísticos. Ora, se a mulher é reduzida às suas nádegas e atributos físicos,  tratada como “gata” ou “avião”, exposta como mero objeto de uso masculino,  como esperar que seja respeitada?

 Nossas escolas, de uns anos  para cá, introduziram no currículo aulas que abordam o tema da sexualidade. Em  geral se restringem a noções de higiene corporal para se evitar doenças  sexualmente transmissíveis. Não tratam do afeto, do amor, da alteridade entre  parceiros, da família como projeto de vida, da irredutível dignidade do outro,  incluídos os/as homossexuais.

 Nas famílias, ainda há pais que  conservam o tabu de não falar de sexo e afeto com os filhos ou julgam melhor o  extremo oposto, o “liberou geral”, a total falta de limites, o que favorece a  erotização precoce de crianças e a promiscuidade de adolescentes, agravada  pelos casos de gravidez inesperada e indesejada.

 Onde andam os  movimentos de mulheres? Onde a indignação frente às várias formas de violência  contra elas?

 Os clubes esportivos deveriam impor a seus atletas,  como fazem empresas e denominações religiosas, um código de ética. Talvez  assim a fama repentina e o dinheiro excessivo não virassem a cabeça de ídolos  de pés de barro...
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Frei Betto é escritor, autor de  “Diário de Fernando – nos cárceres da ditadura militar brasileira” (Rocco),  entre outros livros. www.freibetto.org –  twitter:@freibetto

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