Biocombustíveis: Os Cinco Mitos da Transição dos Agro-combustíveis

09/07/2007
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Biocombustíveis. O termo invoca a imagem vital de renovação e abundância – uma garantia limpa, verde, sustentável em tecnologia e no poder do progresso. Essa imagem permite que a indústria, os políticos, o Banco Mundial, as Nações Unidas, e até mesmo o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas apresentem os combustíveis feitos de milho, cana de açúcar, soja e outras plantas como sendo o próximo passo de uma transição sutil da economia do petróleo para uma economia renovável ainda a ser definida. Extraindo o seu poder de um simples feixe de mitos cornucópios de abundância, os “biocombustíveis” dirigem a nossa atenção para longe dos poderosos interesses econômicos que irão se beneficiar com essa transição. Evita discussões sobre o crescente desequilíbrio de alimentos e energia  entre o Norte-Sul. Obscurece fundamentalmente as relações político–econômicas entre terra, povo, recursos e alimentos. Ao nos mostrar apenas um lado, os “biocombustíveis” não conseguem nos auxiliar a entender as profundas consequencias da transformação industrial do nosso sistema alimentar e de combustíveis. A Transição dos Agro-combustíveis

O rápido aumento dos Agro-combustíveis

Os países industrializados liberaram o “rápido aumento” dos agro-combustíveis através de um ambicioso plano de metas para os combustíveis renováveis. Os combustíveis renováveis devem suprir 5,75% de todo combustível de transporte na Europa até 2010, e 10 por cento até 2020. Os Estados Unidos esperam obter 35 milhões de galões ao ano. Essas metas excedem em muito a capacidade agrícola do Norte industrial. A Europa teria que usar 70% de suas terras agrícolas para combustíveis. Toda a colheita de soja e milho dos EUA  teria que ser processada para o etanol e bio-dísel. Convertendo toda a sua terra arável para a produção de combustíveis iria causar um grande desastre no sistema alimentar do Norte. Portanto os países do OCED [Organização de Cooperação Econômica e Desenvolvimento] estão considerando o Sul global para atender as suas demandas de combustível. Os governos do Sul parecem estar ansiosamente disponíveis. A Indonésia e a Malásia estão expandindo rapidamente as suas plantações de óleo de palma para suprir até 20 por cento do mercado de bio-dísel da UE. No Brasil – onde a area ocupada por combustíveis já ocupa uma área de terra equivalente ao tamanho da Holanda, Bélgica, Luxemburgo e Reino Unido juntos – o governo está planejando um aumento cinco vezes maior na produção de cana de açúcar. A meta é repor 10 por cento da gasolina mundial até 2025.

A rápida capitalização e concentração de poder na indústria de agro-combustíveis é impressionante. Nos últimos três anos o capital especulativo aumentou oito vezes. O investimento  privado tem atolado as instituições de pesquisa públicas, como foi evidenciado pelo recente prêmio de meio milhão de dólares concedido pela BP [British Petroleum] à Universidade da Califórnia. Nos bastidores – e debaixo do nariz das leis anti-trust –gigantes petroleiras, de grãos, automóveis e engenharia genética estão formando parcerias poderosas: ADM e Monsanto, Chevron e Volkswagen; BP, DuPont, e Toyota. Essas corporações estão consolidando a pesquisa, produção, processamento e cadeias de distribuição dos nosso alimentos e sistemas de combustível sob um teto industrial colossal.

Os campeões dos agro-combustíveis nos garantem que que as sementes usadas são renováveis, são ambientamental corretas, podem reduzir o aquecimento global e iraõ promover o desenvolvimento rural. Mas o tremendo poder de mercado das corporações de agro-combustíveis aliadas a uma vontade política fraca, por parte dos governos, para regulamentar as suas atividades, nos leva a duvidar des cenários felizes. Antes de nos atirarmos nessa onda, a bagagem mítica da transição dos agro-combustíveis deve ser aberta publicamente.

Mito n° 1: Agro-combustíveis são limpos e verde

Por que a fotosíntese das plantas usadas para combustível remove gazes do efeito estufa da atmosfera e pode reduzir o oconsumo de combustíveis fósseis, nos dizem que as plantas para a produção de combustível são verdes. Mas quando se leva em consideração o “ciclo de vida” completo dos agro-combustíveis – desde o desmatamento até o consumo automotivo  - a moderada economia de emissões se desfaz em vista de mais emissões causadas pelo desmatamento, queimadas, drenagem de fossas, os cultivos e as perdas de carbono do solo. Cada tonelada de óleo de palma produzida resulta em 33 toneladas de emissões de dióxido de carbono - -10 vezes mais que o petróleo.
[1] O desmatamento das florestas tropicais para produzir etanol através da cana de açúcar emite 50 por cento mais gazes do efeito estufa e usa a mesma quantidade de gasolina.[2] Comentando sobre o equilibrio global de carbon, Doug Parr, cientista chefe do greenpeace no Reino Unido afirma categoricamente, que “Se mesmo cinco por cento dos bio-combustíveis são obtidos através da destruição de florestas ancestrais, você perdeu todo o seu ganho de carbono.”

Há outros problemas ambientais também. Os agro-combustíveis industriais requerem grandes aplicações de fertilizantes à base de petróleo, cujo consumo global - hoje em 45 milhões de toneladas/ano-  aumentaram mais do que o dobro o nitrogênio biológico disponível no mundo, contribuindo pesadamente para as emissões de óxido nitrico, um gaz estufa – 300 vezes mais potente do que o CO². Nos trópicos – onde a maior parte dos agro-combustíveis muito em breve estarão sendo cultivados – os fertilizantes químicos têm 10-100 vezes mais impacto na aquecimento global do que nas aplicações em solos temperados.
[3] Para produzir um litro de etanol é necessário de três a cinco litros de agua para irrigação, produzindo até treze litros de água suja. O tratamento dessa água consome a energia equivalente a 113 litros de gás natural, aumentando as chances de que seja simplesmente despejada no ambiente poluindo córregos, rios e o lençól freático.[4] O cultivo intensivo de plantas para a produção de combustível também causa altos indices de erosão, especialmente na produção de soja – de 6,5 ton/hectare nos EUA e até 12 ton/hectare no Brasil e na Argentina.

Mito n°2: Os agro-combustíveis não irão causar desmatamento

Os proponents dos agro-combustíveis argumentam que as plantas usadas na produção de combustível que são plantadas em terras degradadas ecológicamente irão melhorar e não piorar o meio ambiente. Talvez o governo do Brasil tivesse isso em mente quando re-classificou alguns dos 200 milhões de hectares de floresta tropical seca [serrado], pastos, e pântanos como “degradados” e aptos para cultivo.
[5] Na verdade, esses são ecosistemas bio-diversos da Mata Atlântica, Cerrado e Pantanal, ocupados  por povos indígenas, pela agricultura de subsistência, e por grandes fazendas de gado. A introdução das plantações de agro-combustível irá simplesmente  empurrar essas comunidades para as “fronteiras agrícolas” do Amazonas onde os padrões devastadores de  desmatamento são bem conhecidos. A soja supre 40 por cento do bio-diesel do Brasil. A NASA já correlacionou positivamente o seu preço de Mercado com a destruição da floresta Amazônica – que atualmente esta  ao redor de 325. 00 hectares ao ano. Chamado de “O diesel do Desmatamento”, as plantações do óleo de palma para o bio-diesel são a causa primordial de perda de floresta na Indonésia, um país com um dos maiores índices de desmatamento do mundo. Em 2020, as plantações de óleo de palma na Indonésia irão triplicar em tamanho para 16,5 milhões de hectares – uma área equivalente ao tamanho da Inglaterra e País de Gales juntos – resultando na perda de 98% de cobertura de floresta.[6] A Malásia que é a maior produtora de óleo de palma do mundo, já perdeu 87% de suas florestas tropicais e continua desmatando num índice de sete por cento ao ano.

Mito n° 3; Os Agro-combustíveis irão gerar desenvolvimento rural

Nos trópicos, 100 hectares dedicados a agricultura familiar gera trinta e cinco empregos. O óleo de palma e a cana de açúcar criam 10 empregos, o eucalipto dois, e a soja apenas meio emprego por 100 hectares, todos mal remunerados. Até recentemente, os agrocombustíveis supriam primordialmente os mercados locais e regionais. Mesmo nos EUA, a maior parte das usinas de  etanol eram relativamente pequenas, e controladas por agricultores. Com o rápido aumento dos agro-combustíveis as grandes indústrias estão rápidamente entrando nesse mercado, centralizando as operações e criando gigantescas economias de escala. As grandes indústrias de petróleo, de grãos e a indústria genética estão rapidamente consolidando o seu controle sobre toda cadeia de valor do agro-combustível. O poder de mercado dessas corporações é impressionante: a Cargill e a ADM controlam  65 por cento de todo o comércio global de grãos, a Monsanto e a Syngenta controlam um quarto dos $60 bilhões de dólares da indústria de tecnologia genética. Esse poder de mercado permite que essas companhias extraiam lucros do segmento mais lucrativo e de baixo risco da cadeia de valor;que são, os insumos, processamento e distribuição. Os produtores do agro-combustível irão se tornar cada vez mais dependentes de um grupo extremamente organizado de empresas para obter suas sementes, insumos, serviços, processamentos e vendas. E provávelmente não irão receber muitos benefícios.
[7] Certamente, os pequenos proprietários serão forçados a sair do mercado e serão expulsos da terra. Centenas e milhares já forma deslocados pelas plantações de soja na “República da Soja”, uma área de mais de 50 milhões de hectares no sul do Brasil, norte da Argentina, Paraguai e leste da Bolívia.[8]

Mito n°4: Os agro-combustíveis não causarão fome

A fome, disse Amartya Sen, não resulta da excasses, mas da pobreza. Segundo a FAO, há alimento suficiente no mundo para alimentar o mundo todo com uma dieta de 3,200 calorias  por dia, com frutas frescas, nozes, legumes, laticínio e carne. Entretanto, por que são pobres, 824 milhões de pessoas continuam passando fome. Em 2000, os líderes mundiais prometeram, até 2015, reduzir à metade a proporção de pessoas famintas vivendo abaixo da linha de pobreza no mundo. Pouco progresso foialcançado. As pessoas mais pobres do mundo atualmente gastam 50-80% de toda a renda familiar com alimentos. E eles sofrem quando os altos preços dos combustíveis causam o aumento dos preços dos alimentos. Hoje, por que os alimentos e as plantações de combustíveis estão competindo por terrra e recursos, os altos preços dos alimentos podem na verdade, vir forçar a alta dos preços dos combustíveis. Ambos fazem subir os preços da terra e água.  Essa espiral perversa e inflacinária coloca os alimentos e os recurso produtivos fora do alcance dos pobres. O instituto Internacional de Políticas de Alimentos estimou que o preço da cesta básica irá subir 20-33 por cento até o ano 2010 e 26-135 por cento até 2020. O consumo calórico tipicamente declina quando os preços sobem na razão de 1:2. A cada 1por cento de aumento no custo dos alimentos, 16 milhões de pessoas perdem a sua segurança alimentar. Se as atuais tendências continuarem, 1.2 bilhões de pessoas poderiam estar crônicamente famintos em 2025 – 600 milhões a mais do que havia sido previsto anteriormente.
[9] O apoio internacional com alimentos provávelmente não irá socorrer por que  o nosso  excedente irá para os tanques de combustível.  Perversamente, o apoio com alimentos somente aumenta quando os preços dos  alimentos estão baixos, não alto. Ao invés de converter terra para a produção de combustível, o que é urgentemente necessário são tranferências maciças de recursos para a produção de alimentos para os pobres rurais.

Mito  n° 5: A segunda geração de “agro-combustíveis” aperfeiçoados já está a caminho 

Os proponents dos agro-combustíveis gostam de assegurar os céticos do “alimento versus combustível” afirmando que os atuais agro-combustíveis feitos de plantas serão muito em breve substituídos com plantas ecológicamente adaptadas como  árvores de crescimento rápido e grama perene [switch-grass]. Esse mito, irônicamente citado como o jogo de “isca e a grama perene” [bait and switch-grassa] juda  a tornar a primeira geração de agro-combustíveis socialmente aceitáveis.

A transição do agro-combustível transforma o uso da terra em escala maciça, jogando a produção de alimentos contra a produção de combustível, agua e recursos por terra. É irrelevante perguntar quais plantas devem ser convertidas em combustível. Plantas selvagens cultivadas para a produção de combustível não terão nenhum “impacto no meio-ambiente” por que a comercialização irá transformar a sua ecologia. Elas irão migrar rápidamente das cercas e pequenos bosques para as terras agrícolas para serem cultivadas intensivamente como qualquer outra produção agrícola industrial – com todas as externalidades ambientais associadas. 

Usando plantas genéticamente modificadas com menos linina e cellulose, a industry planeja produzir plantas para o agro combustível que são fácilmente quebradas liberando açúcares, principalmente as árvores de rápido crescimento. As árvores são perenes e espalham polem muito além das sementes de plantas alimentícias. As candidatas celulósicas miscanthus, grama perene e grama canária são species invasivas. Dada a promiscuidade demonstrada das plantas genéticamente modificadas, podemos esperar contaminações genéticas maciças. Isso vai deixar a  Monsanto e a Syngenta muito satisfeitas. Os agro-combustíveis vão servir como o seu Cavalo de Tróia genético, lhes permitindo colonizar completamente o nosso sistema de combustíveis e alimentos.

Qualquer tecnologia com potencial para evitar os piores impactos do aquecimento global deve ser comercialmente viável em escala global nos próximos 5-8 anos. É altamente improvável com o etanol celulósico, um produto que até agora não demonstrou nenhuma economia de carbono. Torná-lo um produto verde e viável não é apenas uma questão de mudar a escala da tecnologia existente, mas sim de avanços significativos em fisiologia das plantas que permita a quebra economicamente eficiente da celulose, hemi-celulose e a linina. A indústria dos agro-combustíveis ou está apostanto em milagres  ou contanto com o apoio do dinheiro dos nossos impostos.
A fé na ciência não é ciência. A fé seletiva na segunda geração de combustíveis – ao invés de trabalhar para melhorar  as atuais tecnologias solares, vento ou de conservação –tende a favor dos que fazem a maior aposta.

O Gêmeo está Morto , Vida Longa ao Gêmeo

A Agência Internacional de Energia estima que nos próximos 23 anos, o mundo poderia produzir até 147 milhões de toneladas de agro-combustíveis. Isso será acompanhado por muito carbono, óxido nítrico, erosão e mais de 2 bilhões de toneladas de água poluída. Notávelmente, esse combustível irá apenas compensar o aumento anual da demanda por petróleo, que hoje está em 136 milhões de toneladas ao ano – sem nenhuma compesação alguma da demanda existente. Vale a pena?


A transição do agro-combustível encerra um capítulo de 200 anos na relação entre a gricultura e a indústria que se iniciou durante a Revolução Industrial. Naquele momento, a invenção da máquina a vapor prometia o fim da labuta. Entretanto, a decolagem da indústria foi retardada até que o governo privatizasse as areas comuns, expulsando os camponeses mais pobres da agricultura para as fábricas urbanas. A agricultura camponesa efetivamente subisidiou a indústria com alimento e força de trabalho baratos. Nos 100 anos seguintes enquanto a indústria crescia, também cresceu a porcentagem urbana da população mundial: de 3% para 13%. O petróleo e os fertilizantes a base de petróleo baratos abriram a agricultura para o capital industrial. A mecanização intensificou a produção, mantendo os preços dos alimentos baixos e a indústria crescendo rápidamente. Os próximos cem anos testemunharam uma mudança global para a vida urbana. Hoje o mundo tem o mesmo número de pessoas vivendo nas cidades e no campo.[10] A transferência maciça de riquezas da agricultura para a indústria, a industrialização da agricultura, e a mudança rural-urbano são todos parte da “Transição Agrária’, o irmão gêmeo menos conhecido da Revolução Industrial. Os gêmeos Agrário/Industrial transformaram a maior parte do combustível do mundo e sistemas alimentares e estabeleceram o petróleo não renovável como a base do atual complexo multi-trilhonário em dólares, dos agro-alimentos.

Os pilares da indústria dos agro-alimentos são as grandes corporações de grãos, como a, ADM, Cargill e Bunge. Elas estão cercadas por uma falange igualmente formidável de processadores de alimentos, distribuidores, e redes de supermercados por um lado e do outro as empresas agro-químicas, de sementes e maquinário. Juntas, essas indústrias consomem quatro de cada cinco dólar alimento. Por algum tempo, o lado da produção do complexo dos agro-alimentos sofre uma “involução” agrícola na qual porcentagens crescentes de investimento (insumos químicos, engenharia genética e maquinário) não aumentaram a porcentagem da produtividade agrícola – o complexo dos agro-alimentos esta pagando mais e colhendo menos.

Os agro-combustíveis são a resposta perfeita para involução por que são subsidiados, crescem enquanto o petróleo diminui, e facilitam a concentração do poder de mercado em mãos dos mais poderosos jogadores das indústrias de alimentos e combustível. Como a Transição Agrária original, a atual Transição dos Agro-Combustíveis irá “cercar as areas comuns” [commons] ao industrializar as florestas e prados remanecentes do mundo. Irá levar os pequenos produstores, agricultores familiars, e povos indígenas para as cidades. Irá afunilar aos recursos rurais para os centros urbanos na forma de combustível, e irá gerar quantidades maciças de riqueza industrial.

Infelizmente a transição dos agro-combustíveis sofre de um defeito congênito: o seu gêmeo fraternal está morto. Não há uma nova revoluçãoo Industrial. Nenhum setor industrial em expansão espera para receber  as comunidades indígenas deslocadas, pequenos produtores e trabalhadores rurais. Não há avanços de produção equilibradas para inundar o mundo com alimentos baratos. Dessa vez, o combustível não vai subisidiar a agricultura com energia barata. Ao contrário, o combustível irá competir com os alimentos pelo acesso a terra, água e recursos. Os agro-combustíveis geram um colapso na ligação entre alimento e combustível. Levado ao extremo, o agro-combustível será usado para plantar agro-combustíveis – uma proposição termodinâmica patética. A entropia inerente da agricultura industrial era invisível enquanto o petróleo era abundante.  Hoje, os sistemas de alimento e combustível devem passar da poupança para conta corrente para a poupança.  Os agro-combustíveis nos levam a usar o “cheque especial”. “Renovável” não quer dizer “ sem limite”. Mesmo podendo replantar a terra, a terra, água e nutrientes são limitantes. Fingir  que isso não é verdade serve os interesses dos que monopolizam os recursos.

O apelo dos agro-combustíveis reside no seu potencial de prolongar a economia do petróleo. Com uma estimativa de reserva de apenas um trilhão de barris de petróleo no planeta, o barril de petróleo a $100 dólares  não está muito longe. Quanto mais alto os preços do petróleo, mais o custo do etanol pode subir para se manter competitivo. Aqui reside a contradição para a segunda geração de agro-combustíveis: quando o petróleo se torna mais caro, a primeira geração de agro-combustíveis se torna mais lucrativa, desistimulando  o desenvolvimento de uma segunda-geração de combustíveis. Se o petróleo chegar a $80 dólares o barril,, os  produtores de etanol poderiam pagar mais de 45 dólares pelo alqueire  (~127 kg.) de milho, tornando-o justamente com a cana de açucar também. mais competitivo. A crise de energia do planeta é potencialmente uma bonanza de $80—100 trilhões de dólares para as corporações de alimento e combustível. Não é pra menos que estamos sendo convidados a consumir  enquanto encontramos soluções para o super-consumismo.

Limites – não incentivos  - devem ser estabelecidos para a indústria de agro-combustíveis. É inconsciente para o Norte a tranferir o problema do super-consumismo para o Sul Global simplesmente por que os trópicos tem mais luz solar, chuva e terra arável. Se os agrocombustíveis vão auxiliar na manutenção das florestas e na produção de alimentos, claramente a indústria de grãos, cana de açúcar, e óleo de palma tem que ser regulamentadas, e não de maneira branda. Medidas fortes e passíveis de serem cumpridas, baseadas no controle da área a ser plantada com agro-combustíveis, são urgentemente necessários, assim como leis poderosas anti-trust para prevenir  a concentração corporativa do poder de mercado na indústria. Benefícios sustentáveis para campo irão apenas aumentar se os agro-combustíveis forem um complemento para planos territoriais de um desenvolvimento rural sustentável, não a sua peça sentral.

Construindo Soberania Alimentar e de Combustível

A transição dos Agro-combustíveis não é inevitável. Não há razão para sacrificar a possibilidade de sistemas de alimento e combustível sustentáveis e equitativos para uma estratégia industrial que compromete ambos. Muitas alternativas bem sucedidas, locais, energéticamente eficientes e centradas  nas pessoas estão atualmente produzindo alimentos e combustível de maneira a não ameaçar o sistema de alimentos, o meio-ambiente e  a subsistência. A questão não é se o etanol e o bio-disel por si têm uma função no nosso futuro, mas sim se devemos ou não permitir que uma meia duzia de corporações determinem o nosso futuro nos levando por caminho sem saída durante a transição dos agro-combustíveis. Para evitar essa armadilha temos que abandonar o mito da cornucópia como legado da idade do petróleo abundante. Temos que ousar imaginar uma transição agrária diferente, constante construída com base na reforma agrária redistributiva que repovoa e estabiliza as comunidades rurais em dificuldades do mundo. Temos que reconstruir e fortalecer nossos sistemas locais, e garantir o reinvestimento da riqueza rural  local. Colocar o ser humano e o meio-ambiente – ao invés dos mega-lucros corporativos – no centro do desenvolvimento rural requer soberania alimentar: o direito dos povos de  determinarem os seus próprios sistemas alimentares.

No Norte Industrila e no Sull Global, centenas de milhares de produtores e consumidores estão ativamente se organizando pelo direito  a um alimento saudável e culturalmente adequado produzido através de métodos ecológicamente corretos e sustentáveis. Eles estão também reconstruindo a arquitetura de sistemas alimentares locais para garantir que a maior parte da riqueza e dos benefícios cresça localmente – não nos distantes cofres corporativos das gigantes dos agro-alimentos. Eles estão responsabilizando as corporações do agro-alimento pelas externalidades que a sua indústria impõe aos contribuintes sob a forma de fome, destruição ambiental e má saúde causada por alimentos processados de baixa qualidade. Os movimentos sociais pela reforma agrária, direitos indígenas, agricultura sustentável de  agricultor para agricultor, comércio ético, feiras dos agricultores, agricultura apoiada pela comunidade,  hortas nas periferias e o desenvolvimento de sistemas alimentares nos bairros, são alguns exemplos do esforços amplos e multi-facetados por soberania alimentar. Organizações como a Via Campesina Internacional, o movimento sem terra no Brasil (MST), a Federação das Cooperativas dos Agricultores Afro-Americanos, e a Coalisão de Comunidades por Segurança Alimentar, estão transformando a vontade social desses movimentos rurais e urbanos em vontade política  - uma fórmula para mudança social.

Os movimentos por Soberania Alimentar já estão preparando para o rápido crescimento dos agro-combustíveis. Quando o presidente dos EUA George Bush chegou no Brasil para estabelecer uma parcenria do etanol com Lula, 700 mulheres da Via campesina em protesto o receberam ocupando a refinaria de milho da Cargill em São Paulo. Mas descarrilhar a jamanta dos agro-combustíveis implica em uma mudança na Transição dos Agro-combustíveis de uma transição agrária que favorece a industria  para uma que na verdade favoreça as comunidades rurais – uma transição que não drena riquezas do campo, mas que coloca os recursos nas mãos da população rural. Esse é um projeto de longo alcance. Seria bom se o próximo passo fosse o lançamento de uma moratória global, pró-ativa na expansão dos agro-combustíveis. É necessário tempo e debate público  para assessar os potenciais impactos dos agro-combustíveis, e para desenvolver estruturas regulatórias, programas e incentivos para a conservação e alternativas  de desenvolvimento de alimentos e combustíveis. Precisamos tempo para forjar uma transição melhor – uma transição agrária para soberania alimentar e de combustíveis.

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Eric Holt-Giménez, Doutor, é Diretor Executivo Food First/Institute for Food and Development Policy


[1] Delft Hydraulics in George Monbiot, “Se queremos salvar o planeta, temos que congelar os bio-combustíveis por cinco anos” The Guardian, 3/27/2007

[2] David Tilman and Jason Hill, Washington Post, 3/25/07

[3] Miguel Altieri and Elizabeth Bravo, “A tragédia elcológica e social dos bio-combustíveis,” 5/1/07, www.foodfirst.org

[4] The Ecologist, May, 2007

[5] Plano Nacional de Agroenergia 2006-2011, In Camila Moreno, “Agroenergia X Soberania Alimentar: a Questão Agrária do século XXI”, 2006

[6] The Ecologist, Ibid

[7] Annie Dufey, “Comércio internacional em bio-combustíveis: Bom para o desenvolvimento? Bom para o meio ambiente?” International Institute for Environment and Development, 2006.

[8] Bravo, E. 2006, Biocombustibles, cutlivos energeticos y soberania alimentaria: encendiendo el debate sobre biocommustibles. Accion Ecologica, Quito, Ecuador

[9] C. Ford Runge and Benjamin Senauer, “Comoo os bio combustíveis podem matar os pobres de fome ”,
Foreign Affairs,
May/June 2007

[10] “The World Goes to Town,” The Economist, 5/11/07

https://www.alainet.org/pt/articulo/122156
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