Boaventura Santos quer o fim da impunidade do imperalismo econômico

20/01/2004
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Participante do seminário que discutiu os rumos do Fórum Social Mundial, o cientista político português Boaventura Sousa Santos acredita que o modelo do evento pode ser aprofundado, com a elaboração de propostas de ação concretas, resultantes de ampla consulta às redes de organizações da sociedade civil. Apontando o neoliberalismo como o inimigo a ser combatido pelos participantes do Fórum, Boaventura afirma: "Estamos alertas ao que está em curso e, neste momento, temos mais força para poder lutar contra o imperialismo tal e qual se manifestou até agora - de uma maneira totalmente impune. Daqui por diante não vai ser impune, vai haver ações contra isso". Rets – O senhor afirmou que o liberalismo e a guerra são duas faces da mesma moeda. A OMC é o braço diplomático dessa mesma guerra? Boaventura Sousa Santos – Eu penso que sim. É o braço diplomático, é o braço econômico da mesma guerra. É importante que seja vista como tal. Rets – E o G-20 pode se transformar em um exército nessa batalha? Boaventura Sousa Santos – Não devemos falar em termos de guerra porque é isso que eles nos estão a convidar. Com seu belicismo, seu militarismo, querem que toda a linguagem da guerra entre no movimento. Nós vamos, obviamente, mostrar que não estamos, de modo nenhum, sozinhos, que estamos alertas ao que está em curso e que, neste momento, temos mais força para poder lutar exatamente contra o imperialismo tal e qual se manifestou até agora - de uma maneira totalmente impune. Daqui por diante não vai ser impune, vai haver ações contra isso. Rets – O senhor propôs que o Fórum Social Mundial adote práticas participativas e propositivas. O modelo atual está esgotado? Para onde caminha o Fórum Social Mundial? Boaventura Sousa Santos – O modelo não está esgotado, o modelo tem é que se aprofundar. Nós fomos excelentes para criar um consenso, fomos excelentes para agregar e celebrar a diversidade. No momento em que estamos preocupados com os planos de ação, com mais atividade, com propostas concretas que devem ser avançadas em nome das redes que constituem - algumas delas, pelo menos - o Fórum Social Mundial, temos que encontrar formas de o fazer de forma participativa. Não pode ser a antiga, em que os líderes das organizações e dos movimentos decidem. Eu penso que tem de haver muita consulta a partir de agora. A partir de janeiro, deviam estar a fazer consultas as organizações - porque nós já sabemos, através dos estudos que foram feitos sobre os fóruns anteriores – onde estão as nossas convergências, onde estão as divergências. Nas convergências, há propostas. Então elas devem ser preparadas por consulta e, em meu entender, devem ser referendadas por mecanismos de democracia participativa no próximo Fórum, quando vamos ter, certamente, outras cem mil pessoas. Rets – O Fórum Social em Mumbai teve uma significativa participação popular. Muita gente dos movimentos sociais asiáticos nas ruas, em centenas de passeatas. Contudo essa gente não participa das conferências e dos debates. Como os movimentos sociais podem se integrar aos processos do Fórum Social Mundial? Boaventura Sousa Santos – Participam. Estive em muitos dos pequenos seminários, onde os dalits, por exemplo, e outros estavam a discutir a questão do trabalho infantil, a questão da proteção das florestas... eles discutem também. O que acontece, obviamente, é que para eles é importante neste momento fazer uma manifestação pública das suas reivindicações e da sua existência. Estão a reafirmar sua identidade, e identidade não se afirma apenas com palavras – é por tambores, é por uniformes, é pela festa, é por entusiasmo, é pela organização, é pelos cartazes. Isso é muito importante, neste momento, para eles, e estão a fazer com muita força, em meu entender. Agora, o que eu penso, sim, é que tem de haver o outro lado do debate. E é por isso que eu digo: temos que ir além do reconhecimento - sabemos que existem dalits, mas vamos começar a discutir mais com eles, porque cada movimento necessita de se abrir a outros movimentos, para ver, inclusivamente, quem são seus inimigos internos. Há pouco me perguntavam quem é o inimigo interno. É que, realmente, cada movimento também faz suas próprias regressões. Por exemplo: as mulheres, dentro dos dalits, não são iguais aos homens. Algumas mulheres dalits dizem que elas são os dalits dos dalits. E os dalits só vão começar a conhecer isso quando começarem a trabalhar com os movimentos de mulheres - eles vão interiorizar para esta luta. E o mesmo com o trabalho operário, portanto. É isto que está a suceder, e o fato de termos toda esta riqueza na rua é fundamental, é a forma de mostrarem ao mundo que existem. Rets – O Fórum Social Mundial volta a Porto Alegre em 2005. Já terá passado metade do governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Como o senhor avalia os sucesso econômicos do Brasil e os resultados no campo social do governo PT? Boaventura Sousa Santos – Quando chegarmos a Porto Alegre, estaremos no fim do segundo ano e o avaliarei. Neste momento, acho que é demasiado cedo. * Paulo Lima, Rits http://fsm2004.rits.org.br/conteudo.asp?conteudo_id=90
https://www.alainet.org/pt/articulo/109181
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