Domínio do medo

18/05/2003
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Cresce a síndrome do medo. Isso vale para São Paulo, Belo Horizonte e qualquer outra grande capital. O medo, como um vírus, toma conta dos nervos e das mentes das pessoas. Medo de assalto, o que induz o cidadão a tornar-se prisioneiro de sua própria casa, trancada com mil chaves, dotada de alarme de segurança e quebrada, no visual, pelas grades que cobrem as janelas. Hoje, o medo é provocado pelo desconhecido. O porteiro do prédio deve exigir identidade, o nome é anunciado por interfone, o visitante conferido pelo olho mágico e, por fim, as fechaduras, de roliças chaves dentadas, abertas uma a uma. Doença da moda é a agorafobia - medo de lugares públicos. Teme-se que a praça esconda ladrões atrás das árvores e crianças pedintes se transformem em perigosos assaltantes ao se aproximar do carro. Cresce o número de pessoas que preferem não sair à noite, jamais usam jóias e entram em pânico se alguém se dirige a elas para perguntar onde fica tal avenida. O homem é, enfim, o lobo do homem. De onde vem tanto medo? Da sociedade que nos abriga, marcada por abissal desigualdade. Se não somos iguais em direitos, e nas mínimas condições de vida, por que se espantar com reações diferentes? Como exigir polidez de um homem que sente na pele a discriminação racial e, na pobreza, a social? Como esperar um sorriso de uma criança que, no barraco em que mora, vê o pai desempregado descarregar a bebedeira na surra que dá na mulher? A discriminação humilha e a humilhação gera ressentimento, amargura e revolta. O contrário do medo não é a coragem, é a fé. Não apenas religiosa, mas cívica, política, utópica. Acreditar que o futuro pode ser melhor e diferente. Sem medo de ser feliz. * Frei Betto é autor de "Hotel Brasil"
https://www.alainet.org/pt/articulo/107566
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