Lições sobre a Fast Track (Trilha Rápida) e a Área de Livre Comércio das Américas (ALCA)

30/06/2002
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NAFTA Chapter 11 Investor-to-State Cases: Bankrupting Democracy

INTRODUÇÃO



Na primavera de 2001, o Presidente George W. Bush pediu ao Congresso Norte- Americano para que lhe delegasse, por um mandato de 6 anos, autoridade constitucional, reservada ao próprio Congresso, sobre o comércio internacional, através de um processo chamado ?Fast Track? (trilha rápida). Bush pede esta autoridade (que seu governo está tentando renomear de Fast Track para ?Trade Promotion Authority?- Autoridade para Promoção do Comércio), para expandir o NAFTA - Tratado de Livre Comércio Norte Americano. A proposta expansão do NAFTA, formalmente chamada ?Área de Livre Comércio das Américas (ALCA), ampliaria as regras do NAFTA para as 31 Nações Latino Americanas e Caribenhas, por volta de 2005.


A meta divulgada da proposta da ALCA é facilitar o comércio e intensificar a integração econômica, expandindo as medidas do NAFTA para eliminar as barreiras tarifárias e não-tarifárias para o comércio e investimentos por todo o hemisfério. Por isto, uma cuidadosa consideração do Relatório do NAFTA torna-se o centro para discussões sobre a ?Fast Track? e a ALCA.


Sendo assim, este ano, a ?Public Citizen? esta lançando uma série de reportagens sobre a performance efetiva do NAFTA, nos sete primeiros anos de sua existência. Esta reportagem analisa o capítulo sobre as bases para os investimentos, que reúne os novos privilégios e direitos expandidos para investidores estrangeiros que operem nas três nações do NAFTA: Estados Unidos, Canadá e México. Freqüentemente se diz que o NAFTA existe mais para acordos de investimentos do que para acordos comerciais. Agora os privilégios e proteções do investidor do NAFTA representam o âmago da proposta da ALCA.


As proteções ao investidor do NAFTA não têm precedentes em acordos multilaterais de comércio. Desde a decretação do acordo, os investidores associados dos três países do NAFTA têm usado esses novos direitos para desafiar políticas nacionais, estaduais e municipais de proteção ambiental e de saúde pública, contestar decisões jurídicas locais, e até leis federais e normas postais nacionais como sendo violações do NAFTA. Enquanto a maioria dos casos ainda estão pendentes, algumas empresas já conseguiram vencer esses desafios. (ver quadro que lista esses casos no final do Sumário Executivo.)


Marcadamente, o NAFTA também fornece aos investidores estrangeiros meios para reforçar, privadamente, seus novos direitos. Chamado de ?resolução de disputa de investidores contra o estado? (investor-to-state?), este extraordinário mecanismo fortalece os investidores privados e as empresas para processar os governos signatários em tribunais especiais para obter compensação paga à vista para as políticas ou ações governamentais que os investidores acreditem violar seus novos direitos, na NAFTA. Se uma empresa ganha o caso, pode ser recompensada com quantias ilimitadas de dólares do contribuinte retiradas do tesouro da nação ofensora, mesmo que tenha recorrido ao judiciário e leis domésticas para obter este prêmio.

Os partidários do NAFTA sustentam o argumento de que a extensão da proteção aos investidores e o mecanismo privado reforçado eram necessários para proteger os investidores contra o confisco do estado sobre a propriedade privada. (i.e., nacionalização). O México, que nacionalizou suas refinarias estrangeiras, em 1938, era o primeiro alvo destas preocupações.


Porém, a maioria dos processos abertos de ?investor-to-state? têm tido pouco a ver com o confisco de propriedades que os partidários do NAFTA temiam. Ao invés disso, estes processos desafiaram as leis ambientais, regulamentações e decisões dos governos em níveis federal, estaduais e municipais.


  • A Companhia Metalclad, baseada na Califórnia, contestou com sucesso o indeferimento pelo governo de uma cidade mexicana de uma permissão de construção de instalações para lixo tóxico.

  • Interdições de toxinas suspeitas de trazer riscos à saúde e ao meio ambiente foram contestadas e o resultado de um dos casos já se reverteu contra uma interdição, pelo governo Canadense, de um aditivo para gasolina, o MMT;


  • A implementação, no Canadá, de dois acordos ambientais internacionais já foram contestados com sucesso e, em breve, o Canadá vai ser obrigado a pagar os danos para os investidores americanos, em ambos os casos.


  • Companhias estrangeiras obtiveram que dois processos já perdidos nos tribunais domésticos americanos sejam ?re-ouvidos? pelo sistema ?investor-to-state? do NAFTA. Um questionando o conceito de imunidade soberana, em uma disputa contratual com a Prefeitura de Boston e o outro questionando as regras de procedimento civil, o sistema jurídico e uma indenização por danos em um contrato com o estado do Mississippi.


  • A empresa americana, United Parcel Service (UPS), abriu um processo contra a concessão governamental de Serviços de correio e encomenda postal pelo Serviço Postal Canadense; e


  • Uma companhia canadense de fabricação de aço questionou uma lei federal ?Buy America? para projetos de construção de vias expressas federais, nos Estados Unidos.


Este ataque extraordinário às atividades normais dos governos - tais como operações do sistema de justiça civil através dos tribunais, negação da permissão de construção ou estabelecimento de regulamentações da saúde pública e outros interesses públicos - atraíram as crescentes criticas às regras para investimento do 11º Capítulo do NAFTA . Para alguns republicanos e democratas, membros do Congresso que votaram pró NAFTA, estes casos tem demonstrado os resultados inesperados e indesejáveis do acordo. Foi prometido aos Republicanos que o NAFTA não atingiria a soberania e controle nacionais. Aos Democratas foi prometido que o NAFTA não minaria as leis domésticas nas questões de saúde e meio ambiente. A ambos foi prometido que o NAFTA não daria melhor tratamento aos investidores estrangeiros do que para negócios locais nem abriria o Tesouro Americano para novas demandas de investidores estrangeiros. Mas os casos do 11º Capítulo do NAFTA zombaram dessas promessas.

Dos 15 casos revistos neste artigo, os danos reclamados pelas companhias chegam a US$ 13 bilhões. Inicialmente, não muitos destes casos foram abertos baseados nessas provisões. Porém, uma vez que os primeiros investidores obtiveram ressarcimento de danos ou a reversão de políticas dos governos que eles atacaram, uma enxurrada de processos foram registrados.


A expansão dos novos direitos dos investidores do NAFTA para mais 31 países do Hemisfério Ocidental, via ALCA, tem o poder de gerar um número explosivo de novos casos. Embora esses casos possam drenar os cofres das nações mais ricas do hemisfério, o impacto potencial que esses casos causariam nos países mais pobres e fracos seria ainda mais alarmante.


O fato de que a solicitação do Presidente Bush, relativa à ?Fast Track?, está baseado no seu desejo de expandir as regras do NAFTA para todo o hemisfério ocidental através da ALCA, torna as questões do 11º Capítulo do NAFTA um ponto crucial do debate sobre a ?Fast Track?.


A expansão dos direitos concedidos às empresas privadas, sob o NAFTA, foi apenas um dos fatores que foram passaram desapercebidos pelo Congresso e pela media, devido ao fato de que, nos Estados Unidos, o NAFTA foi aprovada em um procedimento incomum de ?Fast Track?, que expirou em 1994 e foi utilizado somente 5 vezes, desde seu desenvolvimento, pelo Presidente Nixon, em 1974. Quando voga a ?Fast Track?, o papel do Congresso no desenvolvimento do conteúdo de acordos comerciais internacionais é extremamente limitado. Uma vez que o Congresso garante ao Presidente a ?Fast Track?, o Poder Executivo pode negociar o acordo e assiná-lo, fixando seu conteúdo, antes do voto do Congresso. Porque o papel do Congresso foi limitado a um (?post hoc?) ?sim ou não?, sem permissão para fazer emendas. Muitos congressistas que votaram a favor do NAFTA não têm idéia de que essas cláusulas de direitos dos investidores eram o elemento central do seu conteúdo.


A utilização da ?Fast Track,? no caso do NAFTA, demonstra como este tipo de processo pode obscurecer uma análise significativa dos limites efetivos dos termos em um acordo proposto. Implicações potenciais de questões legais, de saúde pública e ambientais podem ser negligenciadas. Por causa do amplo conjunto de questões das leis domésticas implicados nas atuais negociações de comércio internacional, muitos consideram a ?Fast Track? como um instrumento de política comercial ultrapassado. Como uma nova luta pela ?Fast Track? foi travada no Congresso, no outono de 2001, as implicações dos casos do NAFTA revistos neste artigo na questão das políticas públicas e de soberania são forte argumento contra o uso da ?Fast Track? para o desenvolvimento da ALCA e como um instrumento de determinação de decisões democráticas e de políticas públicas em geral.


Este artigo revê os casos mais relevantes de investimento do NAFTA com relação ao interesse público e à possibilidade de uma aceleração maciça de processos desse tipo, se os mesmos direitos dos investidores forem incorporados na ALCA. Como esses casos são decididos a portas fechadas, nos tribunais do NAFTA, fica difícil obter-se informações sobre os processos. De fato, não há nenhuma exigência de que o público ou o Congresso devam ser notificados de que um caso do 11º Capítulo do NAFTA foi registrado contra os Estados Unidos (ou contra qualquer outro estado). Isto leva a supor que, somados aos casos que nós conseguimos desvendar, outros casos podem ter sido registrados e mesmo resolvidos secretamente através de pagamentos já negociados ou ainda pendentes. Pesquisadores estão reduzidos a confiar nos relatórios finais dos casos, possivelmente incompletos, algumas vezes liberados pelo tribunal ao final de um processo e em apenas poucos documentos elaboradas às claras, a maioria dos quais escritos pela própria companhia autora das ações.




?Os casos que analisamos há muito tempo demonstraram que a mera diminuição no valor da propriedade, por mais que seja sério, é insuficiente para se considerar como um confisco .?



A análise dos casos do NAFTA, como um todo, nos obrigam a certas conclusões:



MAIORES DIREITOS FORAM CONCEDIDOS AOS INVESTIDORES ESTRANGEIROS DO QUE ÀS EMPRESAS OU AOS CIDADÃOS AMERICANOS


As regras de investimentos do NAFTA proporcionam novos direitos e privilégios para investidores estrangeiros, que vão significativamente além dos direitos concedidos aos cidadãos ou às empresas americanos pelas leis internas; essas regras, além disso, concedem aos investidores estrangeiros uma jurisdição exclusiva para solicitarem pagamentos com recursos dos contribuintes das perdas comerciais alegadas por eles. Em acordos comerciais e de investimentos prévios, insistia-se, tipicamente, em assegurar ?tratamento nacional? aos investidores estrangeiros - que os investimentos ou bens estrangeiros obtivessem o mesmo tratamento dos negócios e produtos nacionais. Mas o NAFTA estabelece novos direitos exclusivos de reclamação de compensações para investidores estrangeiros às custas dos contribuintes, justamente pelo fato de serem submetidos às mesmas políticas que as companhias nacionais devem seguir.


AOS INVESTIDORES ESTRANGEIROS É PERMITIDO ESCAPAR DE OBRIGAÇÕES LEGAIS


Os tribunais do NAFTA para ?investor-to-state? (?investidor contra o estado?) disponibilizam um caminho para os litigantes requererem compensações do governo por danos ordenados pelos tribunais dos Estados Unidos. Em um processo do NAFTA, um enorme conglomerado canadense de funerárias, chamado Loewen Group, está usando as proteções do ?investor-to-state? do NAFTA para, com efeito, reverter uma decisão judicial , no Mississippi , em favor da uma pequena funerária local que processou o conglomerado por quebra de contrato. Depois que o conglomerado se recusou a acordos, o júri descobriu que a Loewen estava engajada em uma variedade de ações fraudulentas e aplicou U$ 500 milhões em danos punitivos ou compensatórios. Loewen reclama que foi forçada a fechar uma acordo por U$ 150 milhões porque a Suprema Corte do Mississippi não cederia às leis normais de procedimentos civil, em favor da companhia. Estas regras exigem que se deposite uma caução ao entrar com um recurso em outra instância para que seus ativos não possam ser liquidados caso sua a apelação não seja atendida e ele ainda tenha que pagar pelos danos implicados. A Loewen está processando os cofres americanos ,através do NAFTA, para receber uma indenização de US$ 750 milhões, por esta ?expropriação?, quantia esta quase cinco vezes maior do que a caução depositada. O argumento da defesa dos Estados Unidos é de que uma decisão judicial num processo de um contrato civil não é uma ?ação governamental?, contra quem um investidor estrangeiro tenha direito de se utilizar das proteções concedidas pelo NAFTA. Extraordinariamente, o júri do NAFTA, no caso da Loewen, decidiu que não só a sentença judicial do Mississipi, em um processo contratual, é um legítimo alvo para um processo sob as regras do NAFTA, como também até agora não estabeleceu limites para os tipos de decisões judiciais domésticas que poderiam ser contestadas segundo o NAFTA. Se a Loewen for bem sucedida no processo do NAFTA, a empresa vai poder mandar cobrar a conta de seu comportamento ilegal aos contribuintes americanos. Outro privilégio não permitido às empresas americanas. Além do mais, este caso mostra como o NAFTA incentiva os investidores estrangeiros a resistir a negociações e acordos razoáveis, confiando na perspectiva de que qualquer decisão ou punição que lhes seja desfavorável poderá ser derrubada, usando o NAFTA.

disputas publicas, tribunais privados


Em vez de estabelecer novos mecanismos para resolver essas disputas de investidores-versus-Estado, o NAFTA utiliza dois sistemas de resolução de disputas já existentes - um que opera sob os auspícios do Banco Mundial, o outro sob os auspícios das Nações Unidas. Originalmente, esses dois corpos de arbitragem foram estabelecidos e destinados a julgar disputas privadas entre contratantes comerciais em casos precisos, lidando apenas com casos de direito privado e afetando apenas as partes privadas envolvidas. Assim, no passado, o fato de que esses processos eram estritamente confidenciais e que não houvesse acesso aos dados para o público ou para a imprensa não era problema para os interesses públicos. Porém, agora esses corpos julgadores fechados estão lidando com questões significativas de política pública.


Segundo o NAFTA, todo um leque de regulamentações de interesse público - por exemplo, uma lei da Califórnia proibindo aditivos para gasolina que contaminavam os poços d?água naquele estado - e outras funções governamentais normais têm sido contestadas como violações do NAFTA. Os cidadãos de um estado têm que depender de agências federais (ministérios) para defender suas leis que foram criadas através de processos legislativos públicos e abertos, ao longo dos anos. Mesmo o procurados geral doa Califórnia não tem poder de intervir nesses casos relativos ao NAFTA. Os cidadãos residentes naquele estado não se podem fazer representar judicialmente nesses casos, e nem têm acesso à documentação e informações, não podendo ser nem mesmo observadores nesses tribunal do NAFTA. Entretanto, pode ser que um dia desses o dinheiro do impostos pagos por eles tenha que ser entregue a alguma empresa multinacional que exigiu um bilhão de dólares de indenização. A discussão sobre a adequação ou não desses tribunais privados para julgar disputas que afetam os interesses públicos tornou-se ainda mais urgente pelo fato de que o número de processos deste tipo dando entrada nesses tribunais, está aumentando aceleradamente sob as regras do NAFTA e de outros vários tratados bilaterais sobre investimentos. O corpo arbitrador do Banco Mundial julgou apenas 79 casos em 35 anos de sua história. Entretanto, metade desses casos se iniciaram apenas nos últimos 5 anos. A aceleração desse tipo de queixas junto a esses órgãos, combinada com sua natureza secreta e antidemocrática, e os vastos poderes desses tribunais para atribuir indenizações ilimitadas, a ser pagas com dinheiro público, às empresas ganhadoras tornam evidente a ameaça para o interesse público.


Custo potencial em dólares a ser pago pelo povo


Afinal, são os contribuintes, pagadores de impostos, do país processado que terão que pagar a indenização à empresa que ganhar a causa em um processo NAFTA. Nos primeiros 7 anos de NAFTA, com apenas um pequeno número de casos desses iniciados, um total de 13 bilhões de dólares já foram reclamados por empresas privadas em suas demandas iniciais, que seriam pagos pelos cidadãos americanos (1 bilhão e 800 milhões) , mexicanos (294 milhões) e canadenses (11 bilhões)

No caso já citado contra a Califórnia, a empresa está exigindo 1 bilhão, que corresponde a 1,2 % do orçamento daquele estado americano como indenização pelo prejuízo que eles alegam ter tido por causa das leis de proteção ambiental que proíbe um aditivo na gasolina. Bastaria um certo número de casos desse montante para impactar significativamente os tesouros públicos de governos nacionais e levar esses governos a pressionar estados e municípios em busca de mais recursos.



OS ESTADOS E MUNICÍPIOS NÃO ESTÃO FORA DO ALCANCE DO NAFTA


Não só leis federais, mas também uma série de medidas dos estados e municípios têm sido igualmente contestadas com base no capítulo 11 do NAFTA.

No caso sobre lixo tóxico, envolvendo a empresa U.S. Metalclad, a decisão de um município mexicano de exigir um alvará de construção para a empresa poder fazer um depósito de lixo tóxico foi contestada com sucesso pela empresa como sendo ilegal frente ao NAFTA. O mesmo aconteceu com uma decisão do governo do mesmo estado mexicano de criar uma reserva ecológica, no mesmo caso, e o governo mexicano foi obrigado a pagar US$15,6 milhões de dólares de indenização. Num outro caso NAFTA, a decisão da Colúmbia Britânica de proibir a exportação de água de seus lagos e rio para impedir que fossem drenadas e levadas para a Califórnia em supertanques foi contestada por uma empresa californiana chamada Sun Belt. A empresa Mondev do Canada atacou as ações da Autoridade para o re-desenvolvimento de Boston, a prefeitura de Boston e a Suprema Corte do estado de Massachusetts num tribunal NAFTA num conflito imobiliário, alegando que o NAFTA está acima das leis comuns americanas de imunidade da soberania. Se é verdade que os tribunais que julgam os casos NAFTA não podem revogar leis, e tecnicamente os governos federais é que são passíveis de pena por qualquer prejuízo, os governos federais contam com vários caminhos nas legislações nacionais que lhes permitem exercer pressão sobre estados e municípios. Por exemplo, podem reter como ?refém? a transferência de fundos devidos para projetos estaduais e municipais até que as leis locais que causaram problemas com as empresas e o NAFTA sejam revogadas ou que a autoridade local aceite pagar parte da indenização à empresa. Estados e municípios devem estudar essa questão e para compreender as implicações do NAFTA e do ALCA para a sua soberania e a governabilidade.

GOVERNOS SUJEITOS A INFINDÁVEIS RECURSOS NOS TRIBUNAIS


Em outro caso do NAFTA, um tribunal considerou razoável a interdição temporária de exportação do PCB , pelo Canadá, por razões ambientais (por um breve período no qual os EUA suspenderam suas interdições de importação do PCB). Porém, o mesmo tribunal também determinou que as ações do Canadá eram ilegais, de acordo com as regras do NAFTA, porque a maneira como o Canadá tentou implementar seus objetivos ambientais não era a menos restritiva possível ao mercado. O tribunal, aparentemente sem nenhuma especialização em políticas ambientais, propôs varias alternativas que o Canadá poderia ter adotado para alcançar desfechos similares. No caso da Califórnia, a empresa canadense, Methanex, está argumentando que o estado da Califórnia não poderia retirar da gasolina o aditivo MTBE (um provável cancerígeno, que é altamente solúvel em água, causando maior risco aos poços de água potável do que outros aditivos), mas que deveria lidar com o problema de contaminação do MTBE na água potável limpando os tanques que não estivessem bem vedados - um esforço de custo extraordinário que nem sequer iria remover todas as causas da contaminação da água por MTBE. Em um grande número de casos, as empresas argumentam que o próprio processo pelo qual uma lei foi implantada constitui uma violação dos seus novos direitos de investidores do NAFTA. No caso da Califórnia, a retirada do MTBE foi conseguida depois de um processo público de vários anos, durante o qual o estado realizou uma série de ações deliberativas, primeiro encomendando vários estudos, seguidos de enquetes e debates com a comunidade. Nos próximos meses o tribunal do NAFTA será autorizado a nos informar se essas práticas comuns da democracia devem ser consideradas violações dos direitos dos novos investidores do NAFTA.



PROCESSOS DO NAFTA DESENCORAJAM AS POLÍTICAS DE INTERESSE PÚBLICO

Em um outro caso ambiental, A U.S. Ethyl abriu um processo contra uma medida de caráter ambiental e de saúde pública do governo canadense que restringia o uso de um aditivo para gasolina, já enquanto a interdição ainda estava sendo debatida no Parlamento. As próprias regras do NAFTA requerem que as empresas esperem por seis meses depois das ocorrências que ocasionam a reivindicação, para então levantar a questão e tentar resolvê-la através de negociações antes de abrir um processo no NAFTA. O fato de um tribunal do NAFTA aceitar um caso como este, tentativa ostensiva para intimidar um corpo legislativo em seu processo de decisão, emite um sinal de alarme. Afinal, o Governo do Canadá decidiu o caso, revogando a restrição ao aditivo MMT na gasolina e pagando à companhia implicada US$ 13 milhões, antes mesmo que o tribunal do NAFTA desse seu veredicto final. Se semelhantes direitos do investidor forem incorporados, como está planejado, nas regras da ALCA, as grandes multinacionais terão um potencial extraordinário para intimidar governos dos países mais fracos e pobres do hemisfério. A mera ameaça de uma indenização por danos e as custas de um processo de defesa poderiam fazer com que as nações mais pobres concedessem tudo antes mesmo da disputa judicial, o que já é a tendência do que está ocorrendo com as nações pobres ameaçadas por questões levantadas na Organização Mundial do Comércio (OMC) na base de ?estado-contra-estado?.


ATAQUES AO PRINCÍPIO DA IMUNIDADE SOBERANA


Além das implicações do poder do tribunal do NAFTA em interferir e desacatar decisões governamentais, o princípio de imunidade da soberania, em si, foi agredido em um caso do NAFTA. A doutrina de ?imunidade soberana? é um conceito legal secular, que determina que um governo não pode ser processado, a não ser que o caso seja expressamente permitido por lei. Muitos estados americanos abrem mão de sua imunidade soberana, já por estatuto, ou caso a caso. Um caso do NAFTA envolve a Mondey, uma empresa canadense, que meteu-se em uma prolongada disputa contratual com a prefeitura de Boston, sobre a opção de compra uma gleba de terra. Os argumentos da Mondey foram rejeitados pelo Suprema Corte do estado de Massachussets, nos termos da imunidade soberana. A Mondey ?apelou? da decisão da corte doméstica americana em um tribunal do NAFTA. O ponto crucial na argumentação da Mondey era de que os novos direitos para investidores estrangeiros, garantidos pelo NAFTA, estão acima das proteções da imunidade soberana. Se o tribunal do NAFTA decide a favor da Mondey, não só estará ?revertendo? uma decisão da Suprema Corte, mas, de novo, empresas estrangeiras terão garantidos direitos e privilégios que não são permitidos para as empresas americanas operando no solo americano. Além do mais, um princípio fundamental de jurisprudência do Direito Comum terá sido pisoteado por um tribunal do NAFTA, formado por 3 pessoas, com amplas repercussões para a governabilidade americana em todos os níveis.


EMPRESAS ESTRANGEIRAS TRATAM DE ?FISGAR? INDENIZAÇÕES DOS GOVERNOS USANDO O NAFTA.


Outra tendência preocupante no Capítulo 11 dos casos do NAFTA é a tendência das empresas a solicitar compensações de instâncias do governo, mesmo quando seu real investimento no país processado não é evidente. Somente dois, dos 15 casos do NAFTA, tem a ver com circunstâncias que poderiam ser vagamente caracterizadas como confisco de propriedade. De fato, em vários desses casos do NAFTA não está claro qual ?propriedade? o investidor tinha no país que está sendo processado. No caso PCB, não está nada claro qual o investimento que a companhia norte-americana tinha no Canadá; ela simplesmente tentou importar lixo de PCB do Canadá para tratamento e descarte no seu estabelecimento em Ohio (USA). Favorecendo a empresa, o tribunal do NAFTA decidiu, entre outras coisas, que ?uma fatia de mercado? era um investimento legítimo segundo o NAFTA - significando que o simples fato de a companhia sempre ter podido importar lixo de PCB do Canadá para tratamento nos USA estabelece o direito de continuar, protegida pelo NAFTA. Esta é uma decisão judicial alarmante que poderia abrir precedente para novos processos gerados em função de acaparar uma maior fatia do mercado. No caso do comércio de água da empresa Sun Belt, a companhia norte-americana tinha pretensões a uma ?joint venture? com uma companhia canadense, o que lhe permitiria exportar ague canadense em navios tanques para a Califórnia, mas a Sun Belt nunca reivindicou qualquer propriedade no Canadá. Seria necessário um grande esforço de imaginação para considerar estes casos como confisco de propriedade. Ao invés disto, a maioria dos casos trazidos pelo NAFTA mais se assemelham a reivindicações por ?regulatory takings? (?tomas regulatórias?)1, não permitidos pelas leis norte-americanas.


AS PROTEÇÕES AMBIENTAIS DO NAFTA NÃO TÊM SENTIDO


O preâmbulo do NAFTA declara que os países se encarregarão de suas obrigações de uma maneira ?consistente com a conservação e proteção ambientais?. Mais adiante, o artigo 1114 do capítulo sobre investimentos professa a proteção do ambiente e previne uma competição ilimitada quanto aos padrões ambientais. Os tribunais do NAFTA não tem perdido tempo com estas cláusulas do tratado, a ponto de torna-las sem sentido. No caso do lixo tóxico, não houve nenhuma evidência de que o tribunal tenha ponderado as cláusulas de proteção ambiental, de maneira nenhuma, antes de tomar sua decisão final. A decisão judicial deixa muito claro que nenhum peso foi dado às considerações da comunidade quanto aos aspectos ambientais, razão pela qual as autoridades locais tentaram bloquear o entulho. Além disso o tribunal estabeleceu um número desconcertante de precedentes. Isto não só equiparou a negação de uma permissão de construção municipal e a criação de uma reserva ecológica com ?expropriação?, baseado no NAFTA, como alargou a definição de ?expropriação? para incluir interferências ?incidentais? com valor da propriedade, abrindo assim as portas para que qualquer tipo de zoneamento legítimo feito por um governo estadual ou local, possa ser contestado através do NAFTA. No caso PCB, um tratado ambiental que regulamenta o comércio de lixos perigosos, chamado Basel Convention, foi inicialmente considerado, pelo tribunal do NAFTA, mas acabou sendo totalmente deixado de lado.


OBRIGAÇÕES DE TODO O NAFTA E DA OMC IMPORTADAS PARA DENTRO DO CAP. 11.


Servindo-se do requerimento do Artigo 1105, de que os investidores devem ser tratados ?de acordo com a lei internacional?, as empresas tem procurado trazer para dentro dos litígios baseados no Cap. 11 todas as obrigações do NAFTA como um todo, tal como as regras de comércio internacional do Acordo Geral de Tarifas e Comércio e da OMC. No caso do lixo tóxico, o tribunal inapropriadamente, incluiu os compromissos de transparência, do Capítulo 18 do NAFTA, com respeito a publicações e administração de leis domésticas, no caso do Capítulo 11. No caso PCB, o tribunal do NAFTA decidiu que as proteções do capítulo 11 são aplicáveis mesmo que a companhia não tenha investido concretamente no Canadá, mas apenas procurado com afinco importar PCBs para ser descartados dentro dos EUA. Esta decisão judicial abre a possibilidade de que o capítulo do NAFTA para serviços administrativos (Capítulo 12), na sua totalidade, possa, agora, ser envolvido desnecessariamente nas sanções. Na verdade, em um novo caso, envolvendo um fornecedor de serviços postais, alega-se tratamento discriminatório, sob as regras dos Capítulos 11 e 12 do NAFTA. Além do mais, a questão central do caso da UPS baseia-se no ca. 15 do NAFTA que diz respeito a empresas estatais. Finalmente, no caso da MTBE, contra a Califórnia, a empresa tentou importa, como elementos chaves para sua argumentação, leis e jurisprudência da OMC. Se essa tendência continua, as possibilidades para queixas alegando o capítulo 11 do NAFTA crescerão desmesuradamente, submetendo os signatários do NAFTA e os contribuintes dos países membros a litígios sem fim e de alto custo.


ATÉ FALTA DE EDUCAÇÃO POR PARTE DE FUNCIONÁRIOS DOS GOVERNOS PODE SER UMA VIOLAÇÃO DO NAFTA.



Um dos motivos para iniciar uma ação de investidor vs. Estado é o Artigo NAFTA 1105 que garante um padrão mínimo de tratamento para investidores estrangeiros. O artigo afirma que ?Cada parte deve lidar com investimentos de outro parceiro de acordo com as leis internacionais, inclusive tratamento justo e igualitário e total proteção e segurança.? Anteriormente, em disputas de investimentos bilaterais, linguagem similar tem sido interpretada estritamente, aplicando-se a claras violações de leis internacionais, por exemplo, detenção sem julgamento. No entanto, painéis do NAFTA têm interpretado essa linguagem de forma a criar uma enorme panacéia que tudo engloba para empresas que acreditem ter sido tratadas injustamente. No caso canadense, o painel julgou contra a empresa nas alegações de que o governo canadense teria violado vários termos do NAFTA. Mesmo assim, o painel achou uma violação da garantia de um padrão mínimo de tratamento. O painel não achou uma violação de leis internacionais ou domésticas, mas achou que o comportamento mal-educado e super-detalhista dos representantes governamentais, ao dissecaram a papelada da companhia, era uma violação por si só. O julgamento neste caso alarga o Artigo 1105 para ser aplicado em qualquer instância em que uma empresa alegue ter sido tratada injustamente. Um recente esclarecimento feito em 31 de Julho de 2001 pelos governos NAFTA lida com esse tema tentando limitar a aplicação do artigo 1105 a tratamentos requeridos por lei internacional ?costumeira?. Mas essa interpretação não define o que se entende por ?costumeiro? propiciando uma enorme oportunidade para a continuação da interpretação expansiva pelos tribunais.

DA DEFENSIVA À OFENSIVA



Várias empresas não estão nem tentando alegar expropriação quando iniciam casos do Capitulo 11 do NAFTA. Ao invés disso, elas parecem estar usando outras provisões do capitulo de investimentos do NAFTA para melhorar sua posição estratégica no mercado. Um exemplo gritante dessa manobra estratégica é o caso da UPS contra o Serviço Postal Canadense. A UPS alega que, porque a Canada Post oferece serviços postais públicos, ela não poderia também oferecer serviços integrados de frete e correio. A UPS alega que a vasta infra-estrutura da Canada Post é um subsidio de seus serviços de fretes e correio, ilegal segundo o NAFTA, dando ao Canada Post uma vantagem injusta no mercado. Numa era em que serviços de entrega públicos e comerciais muitas vezes se misturam, poucos serviços públicos, inclusive saúde e educação, seriam imunes a esse tipo de desafio corporativo. O caso da UPS demonstra uma das mais preocupantes tendências nos casos NAFTA tomados como um todo, que é a de que varias empresas estão saindo da posição de defesa (se protegendo contra toma de propriedades) e partindo para a ofensiva numa tentativa de escavar condições de mercado mais favoráveis ou maior participação no mercado.


* * * * *



Em 31 de Julho de 2001, a Free Trade Comission, composta dos três ministros do comércio dos países do NAFTA, emitiram um ?esclarecimento? relacionado ao Capitulo 11 do NAFTA. O NAFTA permite que a Free Trade Comission emita interpretações das regras do NAFTA se forem aceitas por consenso.


O esclarecimento do Capitulo 11 lidou com dois temas. Primeiro, como resposta às crescentes criticas ao processo de portas fechadas, os ministros do comercio tentaram tratar do assunto da abertura em tempo de documentos de tribunais NAFTA. No entanto, a linguagem com a qual os ministros concordaram em seu esclarecimento ainda permite aos tribunais que decidam as diretrizes com respeito à liberação de outros documentos que não a sentença final, e tribunais poderiam barrar a liberação de qualquer documento ate que o caso seja resolvido. Alem disso, empresas têm requerido e conseguido ordens de confidencialidade por tribunais. Esta prática não foi proibida pelo esclarecimento. Afinal, o esclarecimento dos ministros do comércio pode ter um efeito limitado.


Segundo, o esclarecimento tentou resolver a confusão em torno do ?padrão mínimo? de tratamento previsto no Artigo 1105 através da limitação dos direitos e proteções NAFTA àqueles previstos por lei internacional ?costumeira?. Infelizmente, a linguagem com a qual os ministros concordaram entra em conflitos com a linguagem clara do NAFTA e não define o que é incluído sob a rubrica de leis internacionais ?costumeiras?. Como resultado, embora sejamos instruídos de que uma interpretação tradicional e planejada, não sabemos qual corpo de leis está incluído, restando em seu lugar o que acaba sendo um padrão aberto que pode ser usado para contestar esforços de proteção do meio ambiente e do interesse publico.


Enquanto isso, ao emitir esse limitado esclarecimento, os ministros do comércio da três nações NAFTA negaram-se a lidar com os problemas fundamentais do Capitulo 11 que foram levantados por legisladores e analistas políticos nas três nações. As provisões de tomas regulatórias2 (?regulatory takings?) do Artigo 1110 pegaram fogo, mas os ministros se negaram a oferecer uma interpretação dessas provisões ou a limitar de qualquer forma sua utilização, a despeito das interpretações cada vez mais expansivas do artigo por tribunais do Capitulo 11 do NAFTA, que continuam a tratar políticas domésticas ambientais e de saúde não discriminatórias como tomas regulatórias.


Essas provisões radicais de tomas regulatórias deveriam ser retiradas do NAFTA e mantidas fora da ALCA. Infelizmente, a administração Bush rejeitou essa exigência do Congresso. O Congresso deve assegurar que qualquer delegação ?fast-track? de sua autoridade constitucional de comércio ao Executivo garanta que os problemas do Capitulo 11 sejam remediados, e de modo nenhum ampliados.


(...)


Na medida em que mais desses casos NAFTA são arquivados e decididos, as proteções do Cap. 11 do NAFTA ao investidor e esse mecanismo privado de sua aplicação e julgamento estão atraindo cada vez mais vigilância para com o modelo NAFTA de tratados de comércio internacional e para procedimentos, tais como o Fast Track, que conduziram ao desenvolvimento de tais tratados. Estes casos estão nos ensinando uma nítida lição: sob as regras do NAFTA, os governos têm que estar prontos e capazes de indenizar todos os investidores estrangeiros afetados, mesmo que apenas marginalmente, pelas suas mais fundamentais funções regulatórias.



INVESTIDORES E SEUS NOVOS DIREITOS E PRIVILÉGIOS NAFTA


Sob novas regras NAFTA, um ?investidor? que tem poder de usar o sistema de sanções do Capitulo 11 do NAFTA, é alguém que faça um investimento sob o NAFTA. Uma longa lista de atividades comerciais constitui um ?investimento? sob a definição do NAFTA, inclusive:


  • Uma empresa (definida como uma entidade legal privada ou pública, inclusive qualquer empresa, depósito em custódia, parceria, propriedade privada, empreendimento conjunto ou qualquer outra associação),

  • fundos de segurança de uma empresa,

  • garantias de débito de uma empresa,

  • um empréstimo a uma empresa,

  • interesses em uma empresa que habilitem o dono a renda ou lucros,

  • bens imóveis ou outra propriedade usada para fins comerciais, e

  • juros certos derivados do comprometimento de capital



Sob o sistema NAFTA de resolução de disputas entre investidores e estados, apenas os parceiros do NAFTA podem ser autuados. Isso significa que os governos federais do México, Canadá e Estados Unidos devem defender esses casos levantados por investidores privados. No entanto, uma série de políticas e leis municipais e estaduais são expostas a questionamentos pelos investidores, sob as garantias de novo investidor do Capítulo 11 do NAFTA. Uma ?medida? governamental que pode ser questionada sob as regras do NAFTA como infringindo direitos do investidor inclui ?qualquer lei, regulamento, procedimento, requerimento ou prática?. Governos municipais e estaduais, cujas orientações políticas sejam questionadas como violações do NAFTA têm que entregar aos governos federais a defesa de seus interesses.



O Capítulo 11 do NAFTA contém um número de novos direitos e proteções para investidores. Há 5 direitos ou privilégios primários que investidores reivindicaram ter sido violados nos 15 processos de investidores contra o estado revistos neste relatório:


  • O artigo 1110 do NAFTA garante aos investidores compensação advinda dos cofres públicos (i. e. contribuintes) dos governos do NAFTA para qualquer direito de expropriação dos mesmos (i.e. nacionalização) ou qualquer outra ação que ?seja equivalente? à uma expropriação ou uma expropriação ?indireta?. Esta cláusula de ?equivalência? tem sido usada para abertura de processos reivindicando que as políticas regulatórias dos governos, incluindo aquelas que tratam os investidores domésticos e estrangeiros da mesma forma, sejam equivalentes a ou expropriações ?tomas? porque elas restringem as ações dos investidores. Esta cláusula é a base de reivindicações de ?tomas regulatórias? que ocorreram sob o Capítulo 11.


  • O artigo 1102 do NAFTA inclui uma provisão de ?tratamento nacional? que requer dos governos tratar os investidores estrangeiros dos países signatários do NAFTA não menos favoravelmente do que os investidores domésticos com respeito a todas as fases e aspectos do investimento, desde o estabelecimento inicial de um investimento até a liquidação do mesmo.


  • O artigo 1103 do NAFTA prevê ?tratamento de nação mais favorecida?, uma cláusula que exige dos governos dar aos investidores estrangeiros signatários tratamento não menos favorável do que o melhor tratamento dado a investidores de qualquer outra nação signatária ou mesmo não signatária, ainda que este tratamento seja melhor do que o dado a investidores domésticos.


  • O artigo 1105 do NAFTA contém uma cláusula de ?tratamento padrão mínimo?, que diz que investidores devem receber tratamento ?de acordo com a lei internacional?, incluindo ?tratamento justo e eqüitativo e proteção e segurança completos?. Esta vaga abrangência tem sido usada em vários processos de investidores contra o estado para expandir dramaticamente as proteções das empresas investidoras do NAFTA.


  • O artigo 1106 do NAFTA proíbe o uso de ?exigências de performance?, tais como regras de conteúdo doméstico e outras medidas gerais no sentido de limitar os investidores pela exigência de certa conduta ambiental ou moldando os termos de um investimento estrangeiro para assegurar benefícios econômicos também locais.


Se uma empresa acredita que um governo violou estes direitos e proteções do NAFTA, ela pode iniciar um processo de resolução obrigatória de disputa e requerer uma indenização fora do sistema jurídico do país. Estes casos do NAFTA, de investidores contra o estado, são litigados por grupos de árbitros especiais de comércio internacional que são fechados para participação, observação ou intervenção popular. O cumprimento da decisão emitida por esses grupos de árbitros, que não permite apelações, é obrigatório. Dois corpos de árbitros, que estão descritos na próxima seção, estão listados no Capítulo 11 como jurisdições para sanção privada dos termos do NAFTA: A Comissão das Nações Unidas sobre as Leis de Comércio Exterior ? (UNCITRAL) E O Centro Internacional dos Bancos Mundiais para Resolução de Disputas de Investimentos (ICSID). Estas duas jurisdições não permitem acesso público ao processo e à sua documentação como é garantido em cortes nacionais. Antes, um tribunal composto por três árbitros profissionais se reúne a portas fechadas para ouvir os questionamentos das partes. Ao invés de agirem como conciliadores, os membros deste tribunal tornam-se ao mesmo tempo juízes e jurados e podem ordenar que uma nação membro do NAFTA deve pagar uma quantia ilimitada de dólares dos contribuintes como indenização para a empresa cujos direitos do NAFTA, segundo a conclusão dos três árbitros, foram prejudicados.



FALSAS PROMESSAS QUANTO À ECOLOGIA


Enquanto o NAFTA fornece uma lista de obrigações nas ações regulatórias dos governos, novos direitos e privilégios para investidores estrangeiros e forte reforço privado destas regras, os termos escassos do NAFTA com respeito a ambiente ou outras considerações de interesse público são simplesmente exortatórios. Notadamente, o preâmbulo não-obrigatório do NAFTA estabelece que as facções decidem fortalecer o desenvolvimento e reforço das leis e regulamentações ambientais, bem como promover desenvolvimento sustentado. Somando-se a isto, o Artigo 1114 do capítulo de investimento do NAFTA contém teor da língua para proteger o ambiente. O artigo 1114.1 estabelece que nada, no Capítulo 11 pode impedir um Partido de manter medidas para assegurar que um investimento seja menosprezado de uma maneira ambientalmente suscetível. O Artigo 1114.2 estabelece que as partes não ?devem? encorajar investimentos, relaxando, desistindo ou depreciando a saúde doméstica, segurança ou medidas ambientais com o objetivo de encorajar investimentos. É lógico, ao contrário das regras dos direitos do investidor do NAFTA, esta cláusula é tolerante e não obrigatória. O termo ?devem? é usado para estabelecer os direitos do investidor, enquanto os termos ambientais ?devam? ser encontrados. Esta linguagem ambiental é também sem valor porque foi quase inteiramente desconsiderada pelos tribunais do NAFTA nas disputas de investidor contra o estado, principalmente quando avaliando proteção ambientam contra direitos dos investidores sob o NAFTA.


Embora um tribunal do NAFTA, em uma disputa de investidor contra o estado, não possa ordenar diretamente um país a anular a lei ou a política em questão, as nações sofrem tremenda pressão para fazer exatamente isso como meio de protegerem-se da obrigação de pagar indenizações futuras ao investidor por causa de suas políticas. De fato, no primeiro processo de ?investidor versus estado? do NAFTA que foi julgado, envolvendo a Ethyl Corportation, dos EUA, o Canadá foi levado a rescindir suas medidas de proteção ambiental e de saúde pública que regulavam um aditivo para gasolina desenvolvido pela Ethyl, mesmo antes do término da resolução do tribunal do NAFTA, numa tentativa de impedir uma enorme indenização por danos. Além disso, quando uma medida estadual ou municipal é questionada com sucesso sob o NAFTA, o governo federal é que fica com o encargo da indenização ? criando enorme incentivo ao poder federal para pressionar governos locais a rescindirem tais políticas ou a pagar indenizações por perdas e danos.


As ?expropriações? que foram reivindicadas usando o capítulo de investimentos do NAFTA nada têm a ver com o sentido de confisco de propriedade que o governo adota e que é geralmente entendido sob esse termo. As cortes norte-americanas sustentaram uma definição estrita de expropriação, também chamada ?arrecadações?, baseada no requerimento constitucional de que os donos de propriedades sejam compensados quando sua propriedade for colocada para uso público (i.e. para a construção de uma rodovia). Empresas e grupos conservadores contra a proteção ambiental, tais como o movimento pelos direitos de propriedade chamado ?wise-use?, trabalharam por mais de duas décadas para alargar a noção de expropriação e abranger o que eles chamam de ?tomas regulatórias?, para criar pressão visando reverter as políticas governamentais de zoneamento, de proteção ambiental e outras políticas. Por exemplo, grupos pró direito de propriedade lançaram ataques legais contra o Endangered Species Act usando as teorias de ?toma regulatória?. No entanto, a maioria desses casos tiveram pouco sucesso nas cortes norte-americanas. Além do mais, tentativas de legislar um sobre um direito legal baseado nas ?arrecadações regulatórias? falharam repetidamente no Congresso dos Estados Unidos. Em 1993, a Suprema Corte Americana regulamentou que ?nossos casos estabeleceram que apenas a diminuição do valor da propriedade, apesar de sério, é insuficiente para caracterizar uma ?toma?.


Agora, as empresas vêm usando o acordo de investimento do NAFTA para tentar obter compensação pela grande quantidade de políticas de interesse público que a Corte dos Estados Unidos determinou que não são ?tomas regulatórias?. A maioria dos processos do NAFTA, de investidores contra o estado, não envolve nacionalização ou confisco de propriedade. Além disso, o alvo dos ataques dos investidores estrangeiros são as ações governamentais reguladoras de proteção ambiental, de saúde pública e de zoneamento e outras, que somente impactam perifericamente o valor de um investimento,. O teor do capítulo de investimento, prevendo compensação por ações governamentais ?equivalentes? a expropriação, cria direitos sem precedentes para investidores estrangeiros atacarem, todos os dias, os poderes dos governos municipais e estaduais, de uma maneira que vai muito além do que é permitido pelas leis domésticas existentes em qualquer dos três países do NAFTA.


Esses direitos ampliados dos investidores e constrangimentos às funções normais de governo não existem nos acordos WTO ou em qualquer outro grande acordo multilateral. Eles estão incluídos somente no NAFTA e também aparecem em um número crescente de tratados de investimentos bilaterais. Porém, existem planos em andamento de incorporar essas provisões extremas na proposta de expansão do NAFTA para 31 nações, pela chamada de Área Livre de Comércio das Américas (ALCA).


O texto sobre investimento do Capítulo 11 do NAFTA foi claramente o ponto de partida para as negociações da ALCA. Amplos direitos e privilégios ao investidor são um dos principais objetivos das empresas multinacionais que são os principais promotores da ALCA. Esses interesses não conseguiram aprovar legislação sobre ?tomas regulatórias? no Congresso dos EUA. Não conseguiram ampliar o modelo de privilégios do investidor do NAFTA para uma proposta global de acordo ou investimento multilateral. Sua última estratégia é de preservar e entender esse modelo NAFTA de novos privilégios e direitos extremos do investidor através da ALCA.


Uma versão do texto de investimentos da ALCA , que ?vazou?, revela o potencial para incluir direitos do investidor na ALCA ainda mais amplos do que no NAFTA. Enquanto a ALCA tem sido retratada como uma nova negociação com outros países no Hemisfério Oriental, não existe nenhuma dúvida que o radical capítulo sobre investimentos do NAFTA está no seu âmago. Na verdade, um esboço inicial do texto da ALCA inclui, num capítulo de investimentos, exatamente a mesma linguagem do NAFTA.


Informações sobre os casos de ?investidores contra o estado? do NAFTA são difíceis de encontrar. Porque não há, para os tribunais NAFTA, nenhuma obrigação de informar sobre o andamento dos casos, nem o público nem o Congresso podem estar certos do número total de casos. O presente relatório analisa apenas os casos conhecidos como ainda pendentes.


RESOLUÇÃO DE DISPUTA DE UMA EMPRESA DO NAFTA: REFORÇO PRIVADO DE UM TRATADO PÚBLICO.

O Capítulo 11 do NAFTA lista dois corpos de arbitragem internacionais nos quais as disputas de investidores contra o estado podem ser ouvidas. Estes dois corpos operam com regras e procedimentos similares que excluem o público enquanto ouvem os investidores com ouvidos simpáticos. O Centro Internacional para Estabelecimento de Disputas de Investimentos (ICSID), opera sob os auspícios do Banco Mundial. Ele começou a operar em 1966 como uma arma de implementação para um tratado internacional chamado A Convenção no Estabelecimento de Disputas de Investimentos. A Convenção passou para o ICSID o papel de administrar o completamente novo sistema de arbitragem estabelecido na Convenção para lidar com as disputas entre países e investidores privados estrangeiros. O novo sistema destinava-se sobretudo a lidar com casos envolvendo disputas contratuais específicas entre governos e empresas contratantes , não questões sérias de políticas públicas.


O alcance institucional do ICSID aumentou com a adoção das ?Regras de Facilidades Adicionais?, em 1978. Estas regras permitiam procedimentos mesmo quando nem o país do investidor ou o país que estava sendo questionado não pertenciam à Convenção da ICSID. Em 1994, ICSID incorporou um novo papel, quando foi escolhido pelos negociadores da NAFTA como um dos dois corpos de arbitragem que poderia atender as disputas de investidores sob o Capítulo 11 do NAFTA. Desde que nem o México nem Canadá são membros do ICSID, qualquer caso do NAFTA envolvendo partes dos Estados Unidos e um daqueles dois países teriam de ser trazidos ao ICSID sob as ?Regras de Facilidades Adicionais?. Enquanto isso, qualquer caso de disputa de ?investidor versus estado?, envolvendo ambos, Canadá ou México, teria de ser trazidos sob as regras da UNCITRAL.


Apesar do crescimento rápido em acordos de investimentos bilaterais, nos últimos anos, o número de casos trazidos ao ICSID foi limitado até bem recentemente. Nos últimos anos, porém, nos termos da Secretaria Geral do ICSID, ?as comportas então, parecem abrir-se?. Mais da metade processos da ICSID foram iniciados desde o começo de 1997: 49 processos foram registrados desde então ? nove a mais do que toda a história pregressa da ICSID.


Além disso, enquanto muitos dos casos iniciais do ICSID envolviam disputas contratuais privadas, tem havido uma recente explosão de casos baseados em acordos de investimentos. O primeiro caso sob um Tratado de Investimento Bilateral foi trazido em 1987, e dos 36 casos trazidos sob os tratados de investimentos, 30 o foram desde o começo de 1997.

O processo de arbitragem dos casos no ICSID é fechado e não se tem obrigação de prestar contas a ninguém. Os tribunais de arbitragem para os casos ICSID são apontados na base do caso-a-caso, e não há exigências para que os árbitros tenham anteriormente prestado serviços em funções semelhantes.

Ainda mais espantosamente, geralmente as partes envolvidas no caso é que indicam os membros do tribunal, um sistema que pode ser apropriado para disputas contratuais privadas, mas não para questões de políticas públicas. Mais freqüentemente, inclusive sob o NAFTA, o investidor e o país envolvido apontam um árbitro, e os dois árbitros iniciais, então, escolhem um terceiro que serve como árbitro presidente. Se as partes não entram em acordo sobre o terceiro árbitro, a Secretaria General do ICSID pode escolher este terceiro membro de um painel de árbitros do ICSID, apontados pelos países membros.


ICSID fornece apenas uma informação mínima ao público sobre os casos. ICSID publica apenas informações básicas na sua página da Web, como quem são as partes envolvidas, a data da reclamação e os árbitros e não publica documentos no curso do processo. Além disso, não há possibilidade de participação de observadores, fora das partes interessadas, e não há processo de apelação padrão tais como os encontrados nas cortes domésticas. A quase total falta de transparência e de participação popular no ICSID, combinados com o vasto poder dos tribunais para garantir uma infinita quantia de dólares dos contribuintes para as empresas que o NAFTA defende, coloca questionamentos, por exemplo: será essa uma jurisdição de arbitragem apropriada para tão significativas questões de interesse público?


O processo da UNCITRAL é ainda mais fechado e isento de responsabilidade do que o da ICSID. UNCITRAL é a Comissão das Nações Unidas sobre Lei de Comércio Internacional. Ele adotou um conjunto de Regras de Arbitragem, em 1976, que partes de qualquer país podem usar. Uma vez que nem México nem Canadá são membros da Convenção do ICSID, qualquer caso de investidor do NAFTA no qual ambas as partes são destes dois países devem ser julgados pelas regras do UNCITRAL. Nenhuma outra disputa do Capítulo 11 pode ser julgada pela UNCITRAL.


As regras da UNCITRAL para os próprios procedimentos de arbitragem são bem parecidas com aquelas da ICSID, inclusive as regras para a seleção dos árbitros. No entanto, diferentemente da ICSID, a UNCITRAL fornece somente um conjunto de regras e não tem página na Internet para os casos do NAFTA: eles nem sequer têm um staff profissional para fornecer uma assessoria administrativa para os procedimentos da arbitragem, isto é, não há uma secretaria e um arquivo desse tribunal. Não se reúnem nem compilam as decisões finais e por isso elas não podem ser postas à disposição do público. De fato, UNCITRAL não colhe e por isso não torna públicas nem mesmo informações básicas sobre casos concluídos ou pendentes. O histórico dos casos conduzidos sob suas regras não é conhecido. Além do mais, uma vez que UNCITRAL não tem um comitê para supervisionar os casos, não há medidas que permitam a revisão das decisões desses tribunais. As regras da UNCITRAL não prevêem a revisão de uma decisão nem mesmo quando aparecem novos fatos significativos.

Por isso, o processo sob a UNCITRAL proporciona ainda menos transparência e participação popular do que sob as regras da ICSID. Sob as regras da UNCITRAL, um caso pode desenvolver-se por anos a fio sem que o povo fique a par sequer de que ele existe.

Como demonstram os casos descritos com detalhes neste relatório, este sigilo dos processos tem beneficiado os investidores estrangeiros em detrimento do interesse público.


PRINCIPAIS CASOS DO CAPÍTULO 11


ETHYL versus CANADA



A Ethyl é uma companhia química baseada na Virgínia com uma longa e controvertida história. Em 1922, Ethyl começou a produzir chumbo de tetraetil, o aditivo usado para fazer gasolina com chumbo, que aumenta a performance do motor de veículos. Logo após iniciada a produção, muitos trabalhadores de sua fábrica de New Jersey começaram a ter alucinações e convulsões agudas. Mais tarde, cinco destes trabalhadores morreram. Só 50 anos mais tarde é que o governo federal dos Estados Unidos agiu no sentido de eliminar o chumbo da gasolina. Naquela altura, numerosos estudos demonstraram que o escape e derramamento do chumbo da gasolina estavam contaminando o solo e a água de superfície e penetrando na corrente alimentar. O chumbo do escape dos automóveis estava atingindo até os cérebros das crianças americanas, causando danos no desenvolvimento neurológico.


Nos anos 50, a Ethyl Corporation desenvolveu um novo aditivo para gasolina chamado ?methylcyclopentadienyl manganese tricarbonyl? (MMT) , também para melhorar a performance do motor. MMT contém manganês ? uma conhecida neurotoxina humana. Uma fórmula concentrada de MMT é produzida nos Estados Unidos, depois importada pelo Canadá pela subsidiária canadense da Ethyl, onde é diluída em uma fábrica em Ontário e vendida para as refinarias de gasolina canadenses.


INTERESSE PÚBLICO


Em 1977, MMT foi banido do uso em gasolina sem chumbo pela Califórnia, que possui suas próprias leis de limpeza do ar, e pela Agência Americana de Proteção Ambiental (EPA) devido a preocupações ambientais e de saúde pública. Embora pouco se soubesse sobre os perigos específicos apresentados ao público pelas partículas de manganês advindas dos canos de escapamento dos carros que usam combustível com MMT, os perigos da inalação de manganês eram conhecidos desde o século XIX. Manganês transportado pelo ar foi descoberto como causador de perdas neurológicas incapacitantes e sintomas similares à doença de Parkinson, nos trabalhadores de minas de manganês. Uma série de estudos ocupacionais de operários de uma fábrica baterias, trabalhadores de siderúrgicas e outros trabalhadores, conduzidos nos anos 90, foi caracterizada em um jornal de saúde pública como ?inegável evidencia de neurotoxicidade associada com baixo nível de exposição ocupacional? ao manganês no ar.

Com este pano de fundo, o Parlamento Canadense impôs uma interdição sobre a importação e o transporte interestadual do MMT, em abril de 1997. Como o MMT era produzido somente nos EUA, a interdição de transporte efetivamente removeu o MMT da gasolina canadense. O Canadá adotou esta medida por muitas razões. Primeiro, enquanto o Canadá estava trabalhando para diminuir os níveis de emissão dos veículos, fabricantes de automotivos estavam recomendando o não uso do MMT porque o produto prejudicava o funcionamento apropriado dos catalisadores (catalytic converters) e de outros equipamentos que ajudam a controlar as emissões dos motores. Os funcionários públicos canadenses estavam conscientes de que o MMT poderia enfraquecer os esforços do Canadá para controlar a poluição do ar e poderia contribuir para formação de gases de estufa que contribuem para o aquecimento global. Além disso, o Canadá estava consciente dos potenciais efeitos na saúde da exposição de operários e motoristas às partículas de manganês no ar, via MMT. Embora os perigos potenciais para a saúde humana não fossem totalmente conhecidas, o Canadá agiu preventivamente, como tinham agido o estado da Califórnia e a EPA dos EUA, até que maiores informações estivessem disponíveis


ATAQUE DO NAFTA


Em 10 de setembro de 1996, enquanto a interdição prospectiva estava sendo debatida no Parlamento Canadense, a Ethyl Corporation notificou o governo do Canadá de que, se houvesse restrições ao MMT, iria abrir um processo para indenização sob o capítulo de investimentos do NAFTA. O Parlamento resistiu a essas ameaças e aprovou a interdição dali a um ano, em abril de 1997. Naquele mesmo mês, a Ethyl abriu um processo sob o Capítulo 11 do NAFTA (investor-to-state) contra o governo canadense, na UNCITRAL, pedindo uma indenização de US$ 251 milhões por danos. A Ethyl argumentou que o NAFTA garantia seus novos direitos e privilégios face ao governo canadense e que a interdição canadense do MMT resultava numa expropriação de seus ativos proibida pelo NAFTA, segundo seu Artigo 1110. Além disso, a Ethyl argumentou que a interdição era uma violação das regras do Artigo 1102, que requerem tratamento nacional para investidores estrangeiros, porque elas proíbem importações mas não a produção local do MMT. Finalmente, a empresa argumentou que a interdição era uma ?exigência performática? proibida pelo Artigo 1106 do NAFTA, porque requereria à Ethyl construir uma fábrica em todas as províncias canadenses para adequar-se à interdição de transporte e fazer investimentos de MMT no Canadá.


RESULTADOS


Foi constituído um tribunal do NAFTA na UNCITRAL para ouvir o caso da Ethyl. Inicialmente, o Canadá contestou o processo do NAFTA, reclamando que a interdição de MMT não era uma ?medida? coberta pelo Capítulo 11 do NAFTA, e que a Ethyl não tinha esperado os seis meses exigidos, depois da interdição ter sido aprovada e implementada, antes de abrir uma contestação jurídica. Em 24 de junho de 1998, porém, o tribunal do NAFTA rejeitou a contestação canadense, abrindo o caminho para que o caso continuasse. Logo após este andamento inicial, o governo do Canadá decidiu fazer um acordo com a Ethyl. Em 20 de julho de 1998, Canadá reverteu a interdição do MMT, pagou US$13 milhões em emolumentos legais e por danos para a Ethyl Corporation, e emitiu uma declaração de que ?informação científica corrente? não demonstra a toxicidade do MMT nem que MMT prejudica o funcionamento dos sistemas de diagnósticos dos automóveis, para o uso da Ethyl em publicidade.


IMPLICAÇÕES


Pague ao Poluidor


A alegação da Ethyl Corporation de que as restrições ao MMT ?expropriaram? os investimentos da companhia e a decisão do tribunal do NAFTA de aceitar a reclamação e permitir que ela prosseguisse sobre os méritos da questão constitui um novo limite significativo e potencialmente perigoso ao exercício das funções básicas do governo. Os governos devem poder regular um produto por razões de proteção ambiental e de saúde pública sem ter que pagar à companhia que importa a substância. Efetivamente o caso estabelece uma nova proteção para os investidores estrangeiros sob o NAFTA, para além do que é reconhecido pelas leis dos EUA.


Intimidação


Ameaçando iniciar um processo do NAFTA já antes que a lei fosse aprovada e burlando os encaminhamentos domesticas para contestar uma lei ou regulamento, a Ethyl pendurou uma ameaça de danos monetários futuros sobre a cabeça dos legisladores. Enquanto o Parlamento Canadense cedeu à pressão, o número de ameaças de ?contestações comerciais? por parte das empresas está aumentando. O registro de ameaças similares no WTO mostra que elas podem ter um efeito deprimente para as futuras políticas de interesse público que estão sendo estudadas pelo governo e freqüentemente resultam em atos de defesa antecipados por parte dos governos, cedendo e mudando uma política para evitar um questionamento comercial ? como fez o Canadá, neste caso.


Enfraquecendo a Habilidade do Governo se precaver


Neste caso, o NAFTA foi usada para reduzir uma forte proteção doméstica de interesse público. Ciente do paralelo entre os dois componentes organometálicos ? chumbo de tetrathyl e MMT ? e não querendo uma repetição da devastadora história do chumbo na gasolina, o Parlamento Canadense agiu de acordo com o Principio Precautório. O Princípio Precautório é geralmente entendido com o significado de que nos processos onde haja risco de saúde pública ou ambiental, mas em que os dados correntes são insuficientes para quantificar ou avaliar exatamente o risco, o governo tem o direito e a responsabilidade de pender para o lado da segurança. O princípio é baseado no fato de que a ciência nem sempre fornece oportunamente as informações necessárias para autoridades desviarem as ameaças à saúde pública e ao ambiente. Como o exemplo do gás com chumbo ilustra, às vezes são necessários anos e numerosos de estudos de longo prazo para compreender profundamente os perigos de um novo produto. As regras do NAFTA e do WTO viram o ?Princípio Precautório? de ponta cabeça e exigem provas de que o produto causa danos antes de que uma ação regulatória possa ser instituída. Ambos, Canadá e EUA estão atualmente realizando estudos aprofundados, de longo prazo, necessários para melhor entender os perigos do MMT. Neste meio tempo, consumidores das duas nações estão sendo expostos a esta mistura potencialmente perigosa.


Processo exitoso


O Processo da Ethyl no NAFTA conseguiu sucesso contra o Canadá, fazendo-o reverter a interdição do MMT. Este sucesso encorajou outras empresas a usar as regras de investimento do NAFTA para questionar políticas governamentais. Até hoje, foram apresentados mais casos contra o Canadá do que contra qualquer outro país do NAFTA.


METALCLAD versus MUNICÍPIO DE GUADALCAZAR, MÉXICO


Em 1990, o Governo Federal Mexicano autorizou uma companhia mexicana chamada Coterin a operar uma estação de transferência de lixo perigoso no estado de San Luis Potosi. A Coterin queria expandir sua área para se tornar um aterro de lixo perigoso mas foi-lhe negada uma permissão municipal de construção, em 1991 e 1992, pela municipalidade local de Guadalcazar. E 1993, Metalclad, uma empresa baseada na Califórnia, comprou a Coterin e a estação de transferência de lixo. Por 30 anos a atividade principal da Metalclad envolvia instalação de isolantes e remoção de asbestos para seus clientes, industriais, comerciais e agências públicas, na Costa Oeste dos EUA. No México, a Metalclad logo retomou os esforços da Coterin para expandir a estação de transferência em um aterro permanente e fábrica de processamento de lixo tóxico. A Mecalclad conseguiu as permissões estaduais e federais mas não a permissão municipal de construção, como havia acontecido com a Coterin.



INTERESSE PÚBLICO


Sob a gerência da Coterin, a área estava contaminada com 55,000 tambores, ou 20.000 toneladas de lixo tóxico e potencialmente explosivo. A geologia da região envolve uma hidrologia complexa com buracos de escoamento ativos e correntes subterrâneas. Estudos indicam que o solo da área é muito instável o que poderia permitir que o lixo tóxico se infiltrasse no subsolo e espalhasse contaminação através das fontes profundas de água e também das correntes superficiais intermitentes que se formam somente na estação das chuvas. Em 1991, a comunidade local se mobilizou para interromper o despejo de lixo ali. Eles bloquearam caminhões, chamaram autoridades federais, e conseguiram fechar as instalações. Muitos anos depois deste esforço vencedor, a comunidade local ainda estava preocupada com os danos ambientais causados pelo depósito e se opuseram fortemente à sua reabertura.

Em 1994, a municipalidade local de Guadalcazar ordenou que Metalclad cessasse a construção na nova área para lixo tóxico, devido à ausência de permissão municipal de construção. A Metalclad solicitou a permissão mas continuou a construção enquanto o processo de permissão estava em andamento. Em 1995, a companhia encomendou uma avaliação ambiental com inspeção de autoridades ambientais federais. A avaliação considerou a área adequada para o projeto, mas o relatório foi rapidamente contestado pelo Greenpeace do México e por um grupo ambiental local. A construção do projeto se completou em março de 1995, ainda sem a permissão municipal apropriada, mas a companhia está impedida de abrir as portas e operar na área devido à oposição local e às manifestações públicas. Em dezembro de 1996, Metalclad notificou o México de que pretendia processá-lo sob o Capítulo 11 do NAFTA. Em 23 de setembro de 1997, o Governador de San Luis Potosi declarou a área como parte de uma zona ecológica especial para preservação de diversidade biológica única e muitas espécies raras de cactos.


ATAQUE DO NAFTA


Em 2 de janeiro de 1997, Metalclad processou o governo do México , sob as regras de investimento do NAFTA, pedindo US$90 milhões. A Metalclad alegou que as ações do governo municipal resultaram em expropriação sem compensação, proibida pelo Artigo 1110 do NAFTA. Além disso, a companhia reclamou que o governo do México não lhes deu justo e equiparável tratamento de acordo com a lei internacional, conforme exigido no Artigo 1105 do NAFTA.


CONSEQÜÊNCIA


Em 30 de agosto de 2000, um tribunal especial do NAFTA, operando sob as regras do Centro Internacional de Bancos Mundiais pelo Estabelecimento de Disputas de Investimento (ICSID) Regras de Facilidades Adicionais, indenizaram a Metalclad com US$16.685.000. O tribunal sustentou que a negação da permissão de construção, como a criação de reserva ecológica constituíram expropriações ?indiretas? que violavam o Capitulo 11 do NAFTA. Alem disso, o tribunal sustentou que o México violara as regras de padrões mínimos do NAFTA porque a companhia foi conduzida a acreditar que as permissões estaduais e federais que lhes tinham sido concedidas permitiam a construção e operação de seu aterro. O tribunal decidiu que tendo tolerando as ações da municipalidade e das autoridades estaduais e federais que não foram capazes de esclarecer a situação para a Metalclad, o México falhou no seu dever de fornecer ?uma estrutura transparente, clara e previsível para os investidores estrangeiros?. (como um observador salientou, o tribunal do NAFTA, na verdade, criou um dever para o governo federal do México de pegar a companhia pela mão e conduzi-la através da complexidade das leis estaduais e municipais mexicanas. Além disso, o governo federal mexicano foi obrigado a assegurar que as autoridades dos vários níveis de governo federal, estadual e municipal, nunca dessem opiniões contraditório - uma tarefa extraordinária para qualquer governo).


Chegando a uma conclusão com respeito transparência, o tribunal importou as obrigações de transparências do Preâmbulo do NAFTA (Art.102) e do Capítulo 18 para o Capítulo 11. Notadamente, o tribunal também presumiu uma competência expansiva e estabeleceu que, sob a lei doméstica mexicana, a insistência da municipalidade e a negação da permissão de construção eram impróprias. Usando o raciocínio circular, o tribunal não só argumentou que aconteceu uma violação da lei doméstica, mas também equiparou esta suposta violação da lei doméstica com uma violação de lei internacional sob o Artigo 1105 do NAFTA, alargando significativamente o já abrangentíssimo Artigo 1105. O tribunal também determinou que os mesmo fatos que criaram a violação do Artigo 1105 também constituíram uma expropriação sob o Artigo 1110, equiparando assim um processo de violação com uma expropriação.


Em um lance sem precedentes, em outubro de 2000, o governo do México questionou a decisão do tribunal do NAFTA em uma Corte Canadense, alegando erro de arbitragem. Esta petição foi iniciada na Colúmbia Britânica porque sob as regras da ICSID, um lugar de arbitragem deve ser encolhido pelo tribunal, e nesta instância Vancouver foi escolhido pelo tribunal. Uma vez que o local de arbitragem foi escolhido, as leis locais sobre arbitragem entram no jogo. Em uma decisão judicial restritiva que não questionou a legitimidade da utilização de um processo de arbitragem comercial para esses processos do NAFTA, o Juiz David Tysoe da Suprema Corte da British Colúmbia emitiu uma decisão separada. Em 2 de maio de 2001, o Juiz Tysoe sustentou que o tribunal do NAFTA errou quando importou a transparência das regras do Capítulo 18 para o Capítulo 11 do NAFTA.

Como conseqüência, Juiz Tysoe derrubou a maioria dos argumentos do tribunal NAFTA com respeito ao Artigo 1105, relacionados com as ações da municipalidade e com as obrigações do México de criar um ambiente claro e previsível para investidores. Mas o juiz determinou assim somente porque tribunal baseou seus argumentos em uma seção errada do NAFTA. Conseqüentemente, ele derrubou a opinião do tribunal de que houvera violação do Artigo 1110. Porém, o juiz concordou com o tribunal do NAFTA quanto aos méritos de que as ações do governo constituíam expropriação. Como conseqüência, o Juiz reduziu a indenização devida a Metalclad adiando o cálculo da indenização para quando o Governador expedisse o decreto fazendo a área uma zona ecológica. O México inicialmente anunciou que poderia apelar da decisão em uma corte maior, mas em 13 de junho de 2002, a Metalclad anunciou que o México concordou em pagar o montante ordenado pelo Juiz Tysoe, de US$ 15,6 milhões.


IMPLICAÇÕES


Controle local enfraquecido


Revendo a decisão do Tribunal do NAFTA, o Juiz Tysoe notou que a definição do tribunal para expropriação era ?suficientemente abrangente para incluir um legítimo re-zoneamento pela municipalidade ou outra autoridade de zoneamento,? mas concluiu que ?a definição de expropriação é uma questão de lei com a qual esta corte não tem o direito de interferir.? Requerimentos de permissão e controle do uso de terras ambientais no nível local são comuns nos 3 países do NAFTA. Os governos locais não devem ter seus julgamentos questionados ou enfraquecidos pelos tribunais do NAFTA.


Decidindo questões de lei local


O tribunal do NAFTA se sentiu competente para decidir questões complicadas da lei doméstica mexicana, i.e., se uma permissão municipal devia ser exigida. Não apenas o tribunal acha que as ações do governo municipal resultam em expropriação, mas foi além ao dizer que a municipalidade ?agiu fora de sua autoridade? negando a permissão de construção baseada em questões ambientais, invadindo a substância da lei doméstica Mexicana, ao declarar que a ?autoridade exclusiva para estabelecer e permitir aterros sanitários de lixo perigoso é do governo federal Mexicano?. Pior, quando em face de uma escolha entre a interpretação da Metalclad sobre Leis domésticas Mexicanas e a interpretação do governo mexicano de suas próprias leis, o tribunal do NAFTA optou pela interpretação da empresa. O lugar apropriado para uma disputa tão significativa sobre o conteúdo de uma lei doméstica é uma corte doméstica.


Descuido do NAFTA pelas Questões Ambientais


Enquanto o tribunal do NAFTA assumiu o que dizia o preâmbulo do NAFTA para apoiar seus raciocínios tendenciosos no caso, é evidente que o tribunal ignorou completamente outras partes do preâmbulo que apoiavam o desenvolvimento sustentado e a proteção ambiental. O tribunal também ignorou o Artigo 1114 do Capítulo 11, que pretende proteger as nações do NAFTA de uma disputa arrasadora em matéria de padrões ambientais. Ao contrário, o tribunal da Metalclad estabeleceu que apesar de achar que o Decreto Ecológico exigia mais fundamentos para se chegar a um veredicto de expropriação, o tribunal decidiu que ?não é necessário considerar a motivação ou intenção para a adoção do Decreto Ecológico?.


Alargando a Definição de Confisco


O tribunal do NAFTA no caso da Metalclad definiu expropriação não apenas como ?confisco deliberado e reconhecido? de propriedade, mas também como ?interferência invertida ou incidental? no uso da propriedade. Esta definição de confisco é claramente mais abrangente do que a permitida pelas Cortes americanas e poderia ter um efeito avassalador na capacidade das nações do NAFTA de levar a cabo funções regulatórias tradicionais dos governos.


?A maioria das seleções de lugares para uma aterro sanitário, nos padrões ambientais do governo Mexicano, foram violadas por este projeto. Por que haveria uma Companhia norte-americana de selecionar um local que já tem problemas e de selecionar um parceiro que tenha demonstrado graves irresponsabilidades? ? Fernando Bejarano, Mexico Network on Free Trade, (RMLAC)?Toxic Shock in a Mexican Village,? Multinational Monitor, Oct. 1995.


Sigilo


Finalmente, está evidente que o tribunal do NAFTA não viu problema em questionar o México sobre suas obrigações de proporcionar um ambiente comercial transparente para empresas, apesar de ele mesmo, o tribunal, operar a portas fechadas. Os cidadão de San Luís de Potosi não puderam nem mesmo ser parte no caso. Mesmo os governos estaduais e municipais, cujas ações estavam sendo questionadas, não tiveram nenhuma participação no caso e tiveram que confiar no governo federal mexicano, que havia sido incentivador do projeto da Metalclad, para defender seus interesses. O governo federal é livre de consultar ou não as autoridades estaduais e municipais sobre o caso.



LOEWEN versus JÚRI DO MISSISSIPPI

O Grupo Loewen é um conglomerado de agências funerárias baseado no Canadá que adquiriu agressivamente mais de 1.100 agências funerárias por todo o Canadá e Estados Unidos. O caso Loewen no NAFTA surgiu no contexto de aumento da consolidação do mercado funerário dos EUA, uma vez que muitos conglomerados tinham adquirido ou derrubado do mercado as empresas independentes menores. Este fenômeno atraiu a atenção pública por causa de subseqüentes abusos contra os consumidores e muitas investigação das práticas anti-competitivas de negócios funerários. Uma investigação da Time Magazine de 1996, sobre indústria de funerárias acusaram que ?Loewen e outras companhias que lidam com a morte estariam concorrendo para comprar o maior número possível de agências funerárias independentes ? não por um desejo de repartir a economia resultante da escala e cortar o custo dos funerais ? mas sim para empurrar os preços mais para cima.?

INTERESSE PÚBLICO


Em 1994, o Grupo Loewen foi processado na corte estadual do Mississipi por um executivo da Biloxi chamado Jeremiah O?Keefe. O?Keefe alegou que a Loewen, como parte da estratégia para dominar o mercado funerário local, cometeu vários atos ilícitos, anti-competitivos e predatórios a fim de empurrar para fora do mercado a empresa funerária local de O?Keefe e companhias seguradoras, violando leis estaduais. Esta não era nem a primeira nem a última vez que a Loewen iria parar na corte dos Estados Unidos. Em 1996, Loewen acertou um caso de quebra de contrato similar por US$ 30 milhões. O Massachusetts Attorney General ficou tão preocupado a posição da Loewen, já perto do monopólio, na área de Cape Cod, que ordenou à companhia a renúncia de um certo número de agências funerárias.


Depois de um tribunal rever a reivindicação de O?Keefe, um júri do Mississipi concordou com ele. Furioso com o comportamento da Loewen, o júri determinou uma indenização de US$260 milhões. Segundo com um jurado, ?O Grupo Loewen... claramente violou todos os contratos que teve como O?Keefe... Se existia um caso indefensável, acredito que era este.? Porque o júri decidiu uma quantia na fase de julgamento do processo e não na fase condenação, Loewen teve a escolha de aceitar o veredicto do júri ou voltar ao mesmo júri para a fase final do processo. Loewen escolheu voltar à corte, mas desta vez o júri aumentou a indenização para US$ 500 milhões. Ironicamente, os advogados de O?Keefe tentaram determinar o caso antes mesmo do julgamento começar; US$5 milhões era o número que eles tinham em mente, mas eles estavam autorizados a aceitar até menos do que isto.


Loewen decidiu apelar do veredicto do júri em uma corte mais alta. Antes de proceder com o apelo, a companhia procurou ser isentada de uma regra estabelecida de procedimento da corte civil. O regulamento estadual, que é idêntico ao regulamento nacional de procedimento civil, exige que os defensores de perdas que queiram prosseguir um apelo sem começar a pagar indenizações ao autor da ação devem comprar um título público (que corresponde a depositar uma caução) equivalente a 125% da indenização devida. Para comprar um título, o defensor irá dar uma entrada em dinheiro de 10% do título, e o restante pagará empenhando bens. O propósito desta regra é impedir os réus de usar o alongamento do processo de apelação para esconder ativos da empresa ou isentar-se de outro modo qualquer. O Requerimento da Loewen para ser dispensado do cumprimento dessa exigência legal foi rejeitado, e a Loewen apelou da decisão à Suprema Corte do Mississipi. Em 1996 a Corte Suprema do Mississipi rejeitou a apelação da Loewen. Antes que depositar a enorme caução ou tentar outros caminhos legais, a Loewen decidiu negociar o caso com O?Keefe e em 29 de janeiro de 1996, a companhia entrou num acordo de aproximadamente US$150 milhões, 30% do veredicto do júri e mais do que 30 vezes o valor que a companhia poderia ter aceito quando o caso começou.


ATAQUE DO NAFTA


Esse acordo, porém, não foi o final da história. Em 30 de outubro de 1998 a Loewen abriu um processo contra os EUA na ICSID, sob o capitulo de investimento do NAFTA. Embora a Loewen só tenha pago uma fração da indenização estabelecida pelo júri, a companhia está demandando US$725 milhões em compensação dos cofres públicos, argumentando que o veredicto do júri, as indenizações e o requerimento do título do Mississipi (que é idêntico ao requerimento federal), todos violaram seus novos direitos de investidor, garantidos pelo NAFTA. Em especial, a companhia reclamou que o juiz autorizou o advogado queixoso a apelar para ?preconceito anti-canadense, racial e de classe? de um júri do Mississipi como violação às regras de tratamento nacional do Artigo 1102 do NAFTA. (Em resposta a essas alegações, o governo dos EUA argumentou os comentários por um advogado privado em uma disputa de contrato privado não constituiu uma ?medida? governamental coberta pelas regras do NAFTA, nada que a Loewen nunca tenha contestado esses comentários no processo.) A companhia também reclamou que o requerimento da compra do título forçou efetivamente a Loewen a fazer acordo e assim impediu que a Loewen exercesse seu direito de apelação contra a violação do Artigo 1105 requerendo tratamento justo e equiparado. Finalmente, Loewen argumentou que ?o veredicto excessivo, a negação do apelo, e o acordo coercivo eram equivalentes a uma expropriação não compensada, em violação do Artigo 1110 do NAFTA.?


RESULTADO


A Loewen representa o primeiro caso em que uma determinação de um júri popular tenha sido questionada sob o NAFTA. Em março de 1999, ICSID formou um tribunal do NAFTA para ouvir a consistência do caso de Anthony Mason (Austrália), L. Yves Fortier (Canandá), e o ex- congressista e Juiz da Corte Federal dos EUA Abner J. Mikva. Em 9 de janeiro de 2001, o tribunal emitiu uma decisão interina rejeitando uma variedade de argumentos dos EUA, inclusive o argumento de que uma decisão judicial em litígios de contratos privados não constitui uma medida governamental sujeita ao NAFTA. Ao invés disso, o tribunal aceitou a jurisdição do NAFTA, surpreendendo vários observadores. Além disso, o tribunal não estabeleceu os limites de quais tipos de ações ou decisões da corte ele considera cobertas pelas regras do NAFTA. Este regulamento, por meio disso, abre para a possibilidade de que todas as decisões das Cortes nacionais, mesmo as da Suprema Corte Americana, estejam agora abertas para revisão pelos incontáveis tribunais do NAFTA. Uma decisão final nos méritos deste caso está ainda pendente.


IMPLICAÇÕES


Uso do NAFTA para garantir a imunidade. Direitos especiais de apelação.


O caso da Loewen poderia assinalar fortemente para negociantes estrangeiros que eles podem evadir a justiça questionando os trabalhos das cortes estaduais, municipais e federais nos tribunais do NAFTA. Empresas estrangeiras que perderam seus casos de delitos nos EUA podem usar o NAFTA para tentar escapar da obrigação jogando o custo de suas indenizações para os contribuintes americanos. Em contraste, os cidadãos e homens de negócios americanos devem cumprir os regulamentos das cortes americanas.


Atacando o sistema legal americano pela costas.


O sistema jurídico dos EUA garante um papel forte para os jurados. Um tribunal de júri é amplamente visto como uma importante salvaguarda para corrigir o desequilíbrio entre os simples cidadãos e os interesses dos mais poderosos ou opulentos. Somado a isto, atacando o princípio de um tribunal de júri, o caso Loewen ataca o sistema de justiça civil americano, que permite aos jurados mandar fortes avisos aos réus que abusam de seu poder e de sua riqueza para prejudicar consumidores, poluir o ambiente e livrar-se da lei através da através de acordos prévios. Em suma, o Grupo Loewen esta argumentando que o sistema de justiça civil dos EUA é ilegal de acordo com o NAFTA.


?Forum Shopping?


É irônico que a Loewen acabasse pagando US$150 milhões quando ela poderia ter feito acordo por menos do que US$5 milhões, no início do processo civil e se salvado assim de anos de litígio. A Loewen está procurando usar a força do NAFTA para forçar os contribuintes a pagar por seus fracassos legais e estratégicos nas salas dos tribunais. O fato da Loewen ter mais uma possibilidade de apelação no sistema de resolução de disputa do NAFTA deve ter aliviado a empresa da pressão que ele deveria normalmente sentir apara definir o caso rápida e facilmente no sistema da corte dos EUA. Se a Loewen obtiver sucesso no caso do NAFTA, mais empresas estrangeiras podem olhar o NAFTA como o lugar ideal para se obter ?passe livre pra fora da cadeia?.


POPE & TALBOT versus CANADA


Pope & Talbot é uma companhia madeireira baseada o estado de Oregon que opera três serrarias na British Colúmbia, no Canadá. A companhia exporta madeira da British Colúmbia pra os Estados Unidos. Uma parte destes carregamentos entra livre de taxas até o limite estabelecido pelo governo do Canadá sob uma cota global determinada pelo acordo comercial entre EUA e Canadá chamado US ?Canada Agreement on Trade in Softwood Lumber.


INTERESSE PÚBLICO


O Softwood Lumber Agreement era um acordo comercial gerido pelas empresas que acabou em março de 2001 quando não foi renovado entre as partes, embora os EUA tenham tentado uma prorrogação. O acordo estabelecia uma cota máxima de importação de madeira que poderia entrar nos EUA livre de taxas, vinda das 4 províncias canadenses exportadoras de madeira. O acordo foi assinado em 1996 para evitar uma guerra comercial sobre as reclamações das industrias americanas de que o Canada estava injustamente subsidiando companhias de corte de madeira. O ponto crucial das disputas eram os impactos que as diferentes políticas de desmatamento aplicadas pelo Canadá e pelos EUA causavam sobre as indústrias de madeira em seus respectivos países. A Comissão Internacional de Comércio dos Estados Unidos sustentava que o governo canadense subsidia a produção de madeira estabelecendo os preços que as companhias madeireiras pagam por direitos de colheita (conhecido como ?taxa de derrubada de árvores?) nas terras públicas em níveis artificialmente baixos. Quase a totalidade das florestas Canadenses (93%) pertencem ao governo. Em contraste, mais da metade (58%) das terras para desmatamento, nos EUA, são propriedades privadas. Ambientalistas também argumentaram que as políticas de desmatamento do Canadá promovem a colheita intensiva nas florestas canadenses e a liquidação da madeira por uma mera fração do seu valor real.


ATAQUE DO NAFTA


Em 25 de março de 1999, Pope & Talbot abriu um processo do NAFTA baseado no Capítulo 11, no tribunal da UNCITRAL alegando que a maneira como o Canadá implementou os acordos de produção de madeira violaram os direitos da companhia sob o NAFTA. A companhia reclamou, especialmente, que o sistema de cotas estabelecido pelo U.S ? Canada softwood Lumber Agreement violaram o tratamento nacional e o padrão mínimo de garantias de tratamento fornecidos pelos Artigos 1102 e 1105 do NAFTA e impuseram à companhia o cumprimento de exigências que eram proibidos pelo Artigo 1106 do NAFTA. A companhia argumentou que seus investimentos foram ?expropriados? em violação ao Artigo 1110 do NAFTA no montante de US$570 milhões, uma quantia mais tarde reduzida a US$380 milhões. O argumento complicado se concentrava na alegação de que , embora a Pope & Talbot tenha recebido tratamento similar ao de outras companhias na British Colúmbia, ela foi tratada menos favoravelmente do que as companhias de corte de madeira que operam em outras partes do Canadá que não estão sujeitas às cotas do Softwood Lumber Agreement.



RESULTADOS


Em 26 de junho de 2000, um tribunal especial operando sob as regras do UNCITRAl estabeleceu um parecer parcial. O tribunal sustentou que eram necessários mais audiências no requerimento da Pope & Talbot pretendendo tratamento nacional e os padrões mínimos de tratamento, mas rejeitou outras reclamações, inclusive as de expropriação. Em 10 de abril de 2001, o tribunal emitiu seu parecer final. Embora o tribunal sustentasse o Canadá agiu razoavelmente em resposta à maioria das alegações levantadas pela empresa, com vistas à implementação do país do Softwood Lumber Agreement, no final o tribunal se pronunciou contra o Canada. No parecer aceita a alegação da empresa contra o comportamento das autoridades canadenses quando o governo canadense estava tentando verificar a adequação da Pope & Talbot aos requisitos do Acordo. Durante o período em questão, o Canadá sabia que estava sendo processado no NAFTA pela empresa e o tribunal concluiu que as relações entre a empresa e o governo canadense ?apresentavam-se mais como um combate do que como uma regulamentação cooperativa?. O tribunal achou que o Canadá agiu sem razão quando pediu a companhia que fornecesse informação para verificar a alocação de cota da companhia no Canadá em vez de aceitar a informação da central da empresa em Portland. O tribunal sustentou que estas e outras ações eram violações da garantia de tratamento eqüitativo e justo do NAFTA. Notícias de jornal indicam que a companhia está agora tentando receber US$80 milhões dos contribuintes canadenses.


IMPLICAÇÕES


Pacote ?Justo e Eqüitativo?


O que está em questão é qual o tipo de conduta governamental que se caracteriza como e violação das garantias do investidor. O parecer, neste caso, sugere que a falta de polidez seria uma violação do NAFTA. Em submissão, numa audiência na corte doméstica canadense, no caso Metalclad, o Canadá apresentou um forte argumento de que disputas de investimentos bilaterais estabeleceram o precedente de que para que seja reconhecida a falta de padrão mínimo de conduta, é preciso que a conduta em questão seja flagrante e demonstre um ?voluntária negligência ?uma negligência intencional quanto aos deveres ou uma insuficiência da ação governamental que qualquer pessoal razoável e imparcial reconheceria como insuficiente.? Para assegurar seu ponto de vista, o Canadá citou os numerosos casos do ICSID, onde a propriedade americana foi saqueada e destruída em outras nações por forças do governo em combate contra guerrilhas, argumentando que só em tais circunstâncias extremas é que um governo poderia ser responsabilizado. O tribunal da Pope & Talbot rejeitou esta formulação e focou-se na alegação de comportamento rude e excessivamente zeloso dos autoridades canadenses em suas tentativas de verificar as cotas da Pope & Talbot. O tribunal não encontrou violação da lei internacional nem da lei doméstica na conduta do governo. Entretanto, ao declarar que as ações das autoridades governamentais, neste caso, violam os ?mínimos padrões de tratamento? garantidos pelo NAFTA para investidores estrangeiros, o tribunal expandiu o conceito de ?tratamento justo e eqüitativo? para incluir quase todo comportamento que uma empresa possa considerar injusto, alargando o pacote do Artigo 1105 mais ainda do que nos tribunais anteriores.




SUN BELT versus BRITISH COLÚMBIA


Sun Belt Water, Inc. é uma companhia importadora e exportadora de água a granel baseada em Santa Bárbara, na Califórnia. No final dos anos 80, a Califórnia estava no meio de um seca, e a Prefeitura de Santa Bárbara e cidades vizinhas expressaram interesse em adquirir água a granel, descarregada por um navio tanque. EM 1990, Sun Belt reclamou que havia entrado em uma ?joint venture? com uma firma canadense, a Snowcap Water Limited, que possuía uma licença limitada para exportar água a granel do Canadá. As companhias planejaram dar o passo sem precedentes de exportar água de rios e lagos da British Colúmbia para a Califórnia em navios tanques para carregamento de óleo, e pediram uma expansão da licença de exportar água.


INTERESSE PÚBLICO


Numa época em que a maioria da população mundial vive em áreas em que água doce é um recurso escasso, o Canadá detém 20% das reservas mundiais de água doce. Ao longo dos anos, vários investidores puseram um ?olho comprido? nas vastas reservas de água do Canadá como um empreendimento potencialmente lucrativo. No início dos anos 90, o governo da Colúmbia Britânica emitiu seis licenças de exportação para um volume limitado de água e a Snowcap recebeu uma delas. Houve dúzias de pedidos semelhantes em seguida e essas e cresceu uma forte oposição popular contra a exportação de água. Muitos canadenses temiam que, se isso continuasse, a água viria a ser considerada como uma mercadoria sob o tratado do NAFTA, e assim os direitos do investidor e as regras relativas ao mercado de serviços incluiriam a água canadense. Se as necessidades de água para o próprio Canadá se ampliassem, o governo ficaria, nesse caso, impedido de limitar a quantidade de água que poderia ser exportada. Em 1991, o governo da Colúmbia Britânica, forçado pela pressão popular, foi obrigado a declarar uma ?moratória? temporária quanto à concessão, continuidade ou ampliação das licenças para exportação de água. Essa medida temporária foi alongada e depois tornada permanente em 1995. Em 1993, a Sun Belt e a Snowcap processaram o governo de C. Britânica num tribunal doméstico canadense. Em julho de 1996 chegou-se a um acordo com a Snowcap que recebeu uma indenização de US$ 245.000, que já tinha uma licença que não poderia mais usar, mas nenhum acordo foi feito com a Sun Belt.


ATAQUE NAFTA


Em 12 de outubro de 1999, a Sun Belt entrou com uma reclamação junto a um dos tribunais NAFTA, pedindo indenização de US$ 10.5 bilhões, pela perda de ganhos que esperava no futuro, dada a perda permanente de uma oportunidade de negócios por causa da moratória sobre a água. Alega que se o governo Canadense indenizou a Snowcap pela perda da licença que já tinha, recusando-se a indenizar a Sun Belt estava violando o NAFTA que manda dar tratamento igual aos investidores estrangeiros e nacionais (Art. 1102), além de infringir a regra que diz que há um mínimo de ?bom tratamento? que os países são obrigados a conceder aos investidores estrangeiros (Art. 1105). A ação da Sun Belt é provocativa: alega que o governo canadense pôs empecilhos a que ela entrasse com um processe em um tribunal canadense, e que ?a burocracia do Ministério Público e de todo o governo da Colúmbia Britânica abriga criminosos? e que sua ação resultou na expropriação de seus ?investimentos? que é proibida pelo NAFTA. Enfim, como a Sun Belt não pode alegar que a moratória sobre a água viola o NAFTA , pois foi assinada em 1991, portanto antes do NAFTA, tenta dizer que ela violou um tratado de livre comércio entre EUA e Canada, de 1989 e que depois foi incluído no NAFTA. A empresa ainda ampliou sua reclamação para incluir a moratória definitiva assinada em 1995.


RESULTADO


Ainda não há informação disponível.


IMPLICAÇÕES


Redução do controle sobre recursos nacionais.


O caso Sun Belt reforça a preocupação dos canadenses de que as regras do NAFTA sejam aplicadas à água - tornada mera mercadoria, como um bem, um serviço ou um investimento - o que teria amplas repercussões na questão ambiental para os governos de todos os níveis na América do Norte. Se a Sun Belt ganhar esse processo, isso prejudicará fortemente a capacidade dos governos canadenses de limitar a ação dos investidores estrangeiros que quiserem explorar comercialmente suas geleiras, lagos e rios.



?Empresas como a Sun Belt vêem a água como o petróleo do próximo século?.


? Sarah Miller, Canadian Environmental Law Association, ?National Organizations Urge Chretien to Ban Bulk Water Exports before It?s Too Late,? Council of Canadians, Press Release, Feb. 9, 1999.



Quem Paga: o Governo Federal ou o governo estadual?


Sendo o primeiro processo investidor versus estado, sob o Nafta, contra uma medida de um governo sub-nacional do Canadá, este caso estabelecerá um precedente segundo o qual serão julgados os futuros casos contra o Canadá. Embora somente os governos federais possam ser implicados em processos frente ao NAFTA, há questões críticas que continuam sem resposta a respeito de qual dos níveis de governo vai pagar as custas do processo e a indenização que pode ser concedida pelo tribunal NAFTA. Os governos federais têm muitas formas de tornar ?reféns? os governos estaduais e locais de modo a fazê-los pagar a conta num processo NAFTA. Mas, no final das contas, seja qual for o nível de governo que faça o pagamento, será sempre dos bolsos dos contribuintes canadenses que sairá o dinheiro.



CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES


Dos 15 casos que revisamos, quatro já concluídos resultaram em vitória das empresas multinacionais e 10 casos ainda estão pendentes. Apenas um caso, levantado pela Azinian, resultou em derrota para a empresa. Este caso específico foi acompanhado também por alegações de comportamento fraudulento e a maioria dos observadores considera este caso como ?arquivado? e não propriamente uma vitória para o governo acusado. Com exceção do caso da Metalclad e da Adams, os outros casos que examinamos têm pouca ou nenhuma semelhança com confisco público de propriedade privada, contra o qual os partidários do NAFTA alegavam estar defendendo os investidores quando o acordo foi assinado em 1992. A maioria dos casos representa apenas uma série de alegações de ?toma regulatória? (regulatory takings). Se esses casos fossem levados aos tribunais domésticos norte-americanos, as empresas teriam que enfrentar significativas barreiras legais. Além disso, certos casos, como o da UPS, parecem orientados estrategicamente para obter uma fatia maior de mercado, um fenômeno que Howard Mann, do Instituto Internacional para o Desenvolvimento Sustentável descreveu como a transformação do Capítulo 11 ?de escudo em espada?.


É importante notar que, desde 1998, o Canadá tem feito pressão para que haja uma reforma ou um esclarecimento desse controverso capítulo do NAFTA sobre investimentos. Em 1999, um memorando confidencial do governo do Canadá propôs uma série de possíveis opções de reforma do texto, incluindo uma ?nota interpretativa? e/ou um acordo entre os parceiros do NAFTA para transferir às empresas o ônus da prova de que as medidas governamentais eram ?verdadeiramente expropriadoras?.


Alarmado pela crescente lista casos contra o Canadá, o Ministro do Comércio canadense, Pierre Pettigrew anunciou dia 12 de março de 2001 que ele não concordaria com o texto da ALCA se não levar em consideração as preocupações do Canadá com esses casos de processos ?investidor versus Estado?. Porem, um mês depois, o Primeiro Ministro canadense, Jean Chrétien tornou as coisas menos claras ao sair de uma reunião com os presidentes Bush, dos EUA e Fox, do México, durante a Cúpula das Américas, declarando: ?Acho que a cláusula funcionou razoavelmente bem, no NAFTA, entre o Canadá, o EUA e o México.? Tentando consertar as coisas, mais tarde Pettigrew declarou ao parlamento Canadense: ?Nós cremos que é imperativo que os investimentos sejam protegidos nos tratados de comércio, nós não vamos mexer no capítulo. Nós não estamos renegociando. Nós estamos querendo esclarecer alguns elementos para o futuro?. Tanta conversa fiada sobre essa questão leva alguns observadores do NAFTA a crer que o Canadá está dando para trás nos seus esforços para reformar o capítulo 11. Em 11 de junho de 2001, o Centro canadense para Políticas Alternativas publicou um relatório argumentando que a pressão dos EUA está por trás dos comentários de J. Chrétien que revertem a posição longamente mantida pelo Canadá e dão ?sinal verde? para mais processos ?investidor versus estado?.


Embora muitos observadores esperassem que, depois de ter que pagar 16 milhões de dólares à Metalclad, o México mudasse de posição quanto ao Capítulo 11, o presidente Fox parece ter cortado fora essas esperanças em abril, logo antes de embarcar para a Cúpula das Américas em Quebec. Numa entrevista ao The Globe and Mail , quando lhe perguntaram se estava a favor do movimento do Canadá para reformar o Capítulo 11, respondeu: ?Neste momento não estamos a favor de se reabrirem as cláusulas do tratado de livre comércio, porque se abrirmos uma, teremos que abrir muitas?.


Do lado estadunidense, o embaixador R. Zoellick, Representante Comercial, indicou que não aceitaria uma redução dos direitos regulatórios concedidos aos investidores pelo Cap. 11. Num encontro com ambientalistas, em abril de 2001, disse as recentes decisões dos tribunais NAFTA não o levavam a crer que as regras de processos de ?investidor versus estado? precisassem de ser alteradas, e que se devia esperar para ver futuros resultados. Enquanto isso, grupos industriais norte-americanos pressionam o governo dos EUA para apoiar a ampliação de novos direitos para os investidores na ALCA.


Em julho de 2001, a Comissão de Livre Comércio, composta dos ministros de comércio das três nações membros do NAFTA, emitiu um ?esclarecimento? relativo ao cap. 11. O NAFTA concede a essa comissão o direito de determinar a interpretação oficial das cláusulas do tratado se for matéria consensual na comissão.


O ?esclarecimento? sobre o capítulo 11 refere-se a duas questões:

  • primeiro, em resposta às crescentes críticas ao caráter sigiloso dos processos, os ministros tentaram atender à demanda de publicação oportuna dos documentos dos processos NAFTA, mas seu texto ainda permite que o próprio tribunal decida quais os documentos que devem ou não ser publicados e quando. Mesmo depois desse ?esclarecimento? a entidade ?Public Citizen? não conseguiu obter a ?declaração de queixa? da UPS contra o governo dos EUA, pois esse mesmo governo classificou-a como de interesse da ?segurança nacional?. Para obter esse documento de interesse público, Public Citizen teve que entrar com uma ação na Justiça, invocando o Ato de Liberdade de Informação.

  • segundo, o ?esclarecimento? tentou interpretar o que significa ?padrão mínimo de tratamento? do artigo 1104, limitando seus termos aos direitos e proteções da lei internacional ?costumeira?. O resultado é que, embora isso nos diga que a intenção é de dar-lhe uma interpretação tradicional, não se sabe que conjunto de leis está incluído, permitindo que, afinal, um critério extremamente vago e aberto possa ser usado para desafiar os esforços para proteger o meio ambiente e os interesses públicos.


Assim, emitindo esse ?esclarecimento? limitado, os ministros do NAFTA se recusaram a lidar com as questões cruciais do Cap. 11 do NAFTA que já foram levantadas por legisladores e analistas políticos das três nações. A expressão ?equivalente a (tantamount to) expropriação? usada no artigo 1110 do NAFTA é a que mais atrai críticas, mas o ministros se recusaram a precisar uma interpretação dessa expressão ou a limitar de qualquer forma o uso dessa cláusula, apesar da crescente tendência das empresas a interpretá-la de maneira cada vez mais vaga de maneira a incluir qualquer política doméstica no campo da saúde pública ou da defesa do meio ambiente como ?toma ou confisco regulatório? equivalente a expropriação. ?Preocupa-me o fato de que uma teoria da ?toma regulatória? esteja sendo ressuscitada pelo capítulo 11 do NAFTA mesmo depois de já ter sido rejeitada pela jurisprudência da Quinta Emenda?, escreveu em uma carta ao presidente Bush, de 30 de julho de 2001, o deputado E.B. Johnson (D-TX), que é um Democrata pro-NAFTA.


Do mesmo modo, os três ministros recusaram várias propostas, feitas por membros do Congresso dos EUA, de revisão dos processos ou das regras do capítulo 11 a fim de acrescentar uma proteção ao interesse público em vez de permitir que tudo seja tratado apenas como questão de negócios privados.


Membros do Congresso dos EUA também havia solicitado a inclusão de uma exceção geral ao capítulo 11, no sentido de proteger as leis domésticas relativas a saúde e meio ambiente que tratem igualmente os investidores domésticos e estrangeiros e buscaram um esclarecimento de que o NAFTA não permitisse maiores direitos de propriedade aos investidores estrangeiros do que aqueles que as leis concedem aos cidadãos americanos comuns. Os ministros do NAFTA também não deram atenção a essas questões.


A ALCA E A ?TRILHA RÁPIDA (FAST TRACK)?


As negociações sobre a ALCA têm sido feitas a portas fechadas desde 1995. Essas portas apenas se entreabriram um pouco antes da cúpula das Américas de abril de 2001, quando vazou o conteúdo do capítulo da ALCA sobre investimentos. Refletindo o continuado conflito entre delegações nacionais ao grupo de negociações da ALCA, o rascunho do texto é cheio de parênteses e inclui várias versões propostas para muitos dos artigos. Infelizmente, a cópia obtida está rasurada, mostrando que tinham sigo apagadas as anotações à margem, que sempre acompanham qualquer texto de trabalho, não permitindo perceber-se quais das versões alternativas propostas tem mais chance de chegar à versão final, ou que países apoiam cada versão.


Entretanto, a análise do capítulo sobre investimentos no rascunho da ALCA mostra que se incorporam ou ampliam muitas das medidas do NAFTA e ainda acrescentam elementos do infame Acordo Multilateral sobre Investimentos (Multilateral Agreement on Investment - MAI). O MAI foi secretamente negociado por vários anos na Organização para a Cooperação Econômica e o Desenvolvimento (OECD) , cujos trinta membros incluem EUA, Japão, Austrália e a maioria dos países da Europa Ocidental. Os países membros do OECD suspenderam as negociações quando uma cópia do MAI vazou para a sociedade civil e foi publicada na Internet em 1998. A condenação rápida e generalizada do acordo por parte de funcionários e cidadãos de todo o mundo afundou essa proposta de acordo.


Assim como o NAFTA e o MAI, o capítulo de investimentos da ALCA inclui definições excessivamente amplas de ?investidor? e ?investimento? e estabeleceria uma série de novos direitos e privilégios dos investidores, incluindo o direito de compensação por perdas, expropriações e tomas regulatórias, estabeleceria também restrições a políticas nacionais que visem conter ataques especulativos às moedas nacionais, tais como a regulamentação de transferências, e ainda proíbe exigências de desempenho (performance) dos investidores.


Tal como o NAFTA e o MAI, os conflitos relativos a esses direitos serão tratados em, tribunais privados semelhantes aos do NAFTA. Mas em muitos casos o texto da ALCA vai além do NAFTA e incorpora elementos do falido MAI. Por exemplo, as diferentes versões do capítulo sobre investimento vão da simples repetição do texto do NAFTA, que inclui a cobertura para 8 tipos específicos de recursos (assets), até versões que ampliam essa definição muito além do próprio MAI., como uma que propõe: ?qualquer tipo de recurso ou direito de qualquer natureza, possuído ou controlado, direta ou indiretamente, por um investidor?, teriam proteção da ALCA. Outra proposta diz que cada governo teria que ?promover, em seu território, o investimento dos investidores de outra das Partes Contratantes (países)? o que significa exigir que os governos nacionais apoiem os interesses econômicos estrangeiros contra os interesses econômicos nacionais.


O afã de ampliar esses direitos das empresas multinacionais em âmbito hemisférico é que impulsionou a pressão para se conceder Autoridade para Trilha Rápida a Bush. Isto porque os partidários do Fast Track reconhecem que esses direitos e privilégios dos investidores estrangeiros enfrentarão forte crítica do próprio Congresso americano e dos cidadãos conscientes. Por isso, tirar o Congresso e o público do caminho, por meio da Fast Track, tornou-se necessário para fazer aprovar tais direitos na ALCA. O Congresso americano ficaria fora do andamento das negociações, restando-lhe apenas, no final, aprovar ou não texto final do acordo.


A ?FAST TRACK?


  • Delega, do Congresso para o Executivo, a autoridade para decidir sobre os termos de tratados internacionais de comércio durante as negociações.


  • Permite que o executivo assine pactos e acordos parciais (que entrarão no acordo geral), fechando questões sem nem consultar o Congresso.


  • Dá poderes ao Executivo para modificar leis federais, adaptando-as às exigências dos acordos.


  • Pre-determina as bases dos procedimentos para apreciar a forma final dos acordos antes mesmo de iniciarem-se as negociações. O Congresso terá que votar em bloco seja lá o que for que o Executivo lhe traga, sem direito a emendas e com apenas 20 horas para debate. Esse procedimento tipo ?ou tudo ou nada? permite que o Executivo faça aprovar medidas questionáveis, dentro do acordo geral, sem que o Congresso ouse derrubar todo o conjunto do tratado que pode incluir muitas medidas consideradas positivas.


A administração Bush alega que isso é necessário para o sucesso das negociações e aprovação dos acordos de comércio. Entretanto, desde sua criação sob o governo Nixon, em 1974, a Fast Track só foi usada 5 vezes. Clinton usou-a para fazer passar no Congresso o NAFTA e os acordos da Rodada do Uruguai que criaram a OMC. Porém, no mesmo período, a administração Clinton negociou mais de 300 tratados sem usar a Fast Track.


O único modo de garantir os interesses do público é manter no Congresso o poder de examinar detalhadamente os elementos de cada acordo.


RECOMENDAÇÕES


Se o NAFTA continuar a decidir em favor da empresas, contra os interesses públicos, a crítica ao NAFTA vai crescer e a questão vai pegar foco. Os governos do NAFTA não poderão mais, praticamente, regulamentar quase nada em seus países sem provocar processos de empresas estrangeiras mesmo levemente atingidas, a serem pagos com dinheiro dos contribuintes.


As regras sobre os direitos dos investidores no NAFTA têm de ser reescritas, e tal como são, não devem ser incluídas em futuros acordos. (...)


Além disso, há muito mais em causa do que apenas algumas reparos a fazer no NAFTA, porque o governo Bush já deixou claro que pretende estender esses direitos do investidor para todo o hemisfério ocidental através da ALCA.


(...)

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Para mais informações sobre esses assuntos:


Public Citizens Global Trade Watch: www.tradewatch.org

Friends of the Earth: www.foe.org

NAFTA Text: www.sice.oas.org/TRADEE.ASP#NAFTA

NAFTA Documents: www.naftaclaims.com

ICSID (provides list of pending cases): www.worldbank.org/icsid/

UNCITRAL (provides no information about pending cases): www.uncitral.org/




1 O artigo 1110 do NAFTA garante aos investidores indenização pelos dos cofres públicos (i. e. contribuintes) dos governos signatários do NAFTA para qualquer caso de expropriação (i.e. nacionalização) ou qualquer outra ação que seja equivalente à uma expropriação ou uma expropriação ?indireta?. Esta cláusula de equivalência tem sido usada para abertura de processos reivindicando que as políticas regulatórias dos governos, incluindo aquelas que tratam os investidores domésticos e estrangeiros da mesma forma, sejam equivalentes a expropriações ou tomas, aqui chamadas regulatory takings ou tomas regulatórias, porque elas restringem as ações dos investidores.

2 O artigo 1110 do NAFTA garante aos investidores indenização pelos dos cofres públicos (i. e. contribuintes) dos governos do NAFTA para qualquer direito de expropriação dos mesmos (i.e. nacionalização) ou qualquer outra ação que seja equivalente à uma expropriação ou uma expropriação indireta . Esta cláusula de ?equivalência? tem sido usada para abertura de processos reivindicando que as políticas regulatórias dos governos, incluindo aquelas que tratam os investidores domésticos e estrangeiros da mesma forma, sejam equivalentes a expropriações ou ?tomas?, chamadas ?regulatory takings?? ou ?tomas regulatórias?, porque elas restringem as ações dos investidores.

https://www.alainet.org/pt/articulo/106160
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