De olho no petróleo brasileiro

22/09/2013
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Documentos vazados por Snowden não divulgam detalhes
sobre o real interesse dos EUA sobre a Petrobras. No entanto,
a iminente realização do leilão de Libra fornece uma boa pista
 
 
A exemplo das edições anteriores, o 1º leilão de petróleo e gás será marcado por protestos de organizações populares.Desta feita, porém, as recentes denúncias de espionagem estadunidense contra a Petrobras deverão tensionar ainda mais o processo, marcado para 21 de outubro. 
 
Documentos vazados pelo ex-consultor de informática e agente da CIA Edward Snowden indicam que a rede de computadores da Petrobras foi monitorada pela Agência Nacional de Segurança dos Estados Unidos (NSA). 
 
O nome da petroleira aparece em uma apresentação feita pela NSA em maio do ano passado para treinar novos agentes em técnicas para acessar e espionar redes privadas de computador de empresas, governos e instituições financeiras. O documento, classificado como “ultrassecreto”, é liberado apenas para os chamados “Five Eyes” (Cinco Olhos), os cinco países aliados na espionagem: Estados Unidos, Inglaterra, Austrália, Canadá e Nova Zelândia. 
 
Os  documentos não divulgam detalhes sobre o real interesse dos estadunidenses sobre a Petrobras. No entanto, a presença de reservas do pré-sal e a iminente realização do leilão do campo de Libra, situado na Bacia de Santos, fornecem uma boa pista. 
 
De acordo com a Agência Nacional do Petróleo (ANP), o local possui cerca de 14 bilhões de barris de petróleo. Sozinho, o campo equivale a mais de 80% de todas as reservas provadas da Petrobras, descobertas ao longo dos 60 anos de atuação da empresa. Em dólares, a riqueza de Libra pode ser calculada em cerca de U$S 1,5 trilhão. 
 
O engenheiro e conselheiro do Clube de Engenharia Paulo Metri vê interesses econômicos por detrás da espionagem estadunidense. “Ela [Petrobras] tem grandes segredos do modelo geológico do pré-sal que valem ouro. Tendo esse conhecimento do pré-sal você consegue perfurar com mais sucesso e economiza dinheiro”, explica. 
 
A produção atual do pré-sal está na casa dos 300 mil barris diários. A estimativa é de que as reservas totalizem de 100 até 300 bilhões de barris. 
 
Para o coordenador-geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), João Antônio de Moraes, o monitoramento de informações da Petrobras se constitui em um caso de espionagem comercial. “É o Estado estadunidense a serviço dos interesses econômicos das suas empresas”, critica Moraes. 
 
O caso gerou críticas da presidenta Dilma Rousseff, que também teve suas conversas monitoradas. Em nota oficial, Dilma atribuiu a espionagem a questões econômicas. “Sem dúvida, a Petrobras não representa ameaça à segurança de qualquer país. Representa, sim, um dos maiores ativos de petróleo do mundo e um patrimônio do povo brasileiro”. 
 
Resistência
 
Contrários à realização dos leilões,sindicatos e movimentos sociais se articulam para pressionar  o governo a suspender o processo. Dentre as ações previstas  estão dois acampamentos, no Rio de Janeiro e em Brasília, com o objetivo de chamar a atenção da população para a entrega de  recursos a empresas multinacionais. 
 
O secretário do Sindipetro-RJ e da Federação Nacional do Petróleo (FNP), Emanuel Cancella, argumenta que as companhias vencedoras dos leilões anteriores não construíram, até o momento, uma única refinaria ou qualquer outra estrutura em solo brasileiro. As denúncias de espionagem, para ele, se constituem em um motivo a mais – e definitivo – para o cancelamento dos leilões. 
 
A suspeita de informações privilegiadas, ressalta o sindicalista, anula a igualdade de condições entre as empresas, premissa fundamental de um processado tipo. 
 
“Será uma aberração jurídica sustentar a  realização desse leilão. Seremos mesmo uma República de Bananas se permitirmos isso”, diz, Cancella, que defende ainda a anulação de todos os leilões que tiveram participação de corporações dos cinco países que lançaram mão da espionagem. 
 
Outra irregularidade, de acordo com Paulo Metri, está no descumprimento da lei 12.351/2011, que instituiu o regime de partilha de produção para o pré-sal. De acordo com a legislação, o fato de o campo de Libra ter suas reservas já medidas – um trabalho que custou um investimento de pelo menos R$ 200 milhões da Petrobras – torna a área estratégica para o desenvolvimento nacional. Desta forma, a petroleira deveria ser contratada diretamente pela União para exploração e produção de petróleo, gás natural e outros recursos. 
 
Isso permitiria, segundo o engenheiro, garantir uma quantidade maior de recursos destinados ao Fundo Social – algo fora de cogitação no caso das empresas privadas. 
 
“Está na lei, não é favor. É o reconhecimento de que aquele petróleo ali pode ser muito mais usufruído pela sociedade brasileira se for entregue à Petrobras do que se for entregue em leilões onde vai ganhar uma Shell ou uma Exon”, esclarece.
 
 O governo deseja leiloar o campo para cumprir a meta do superávit primário em 2013. A realização do leilão renderá, ao governo, um bônus de cerca de R$ 15 bilhões. Com isso, o país receberá pouco mais do que R$1 real por barril -  no fechamento desta matéria, o preço do barril estava cotado em US$ 106,59 o barril, o equivalente a R$ 243,02. 
 
“A Dilma vai vender barril de petróleo de Libra a R$ 1 real, um petróleo de alta qualidade. Ela vai entregar isso e vamos ficar calados?”, questiona Emanuel Cancella. 
 
A pressão para o fim do leilão também foi o tema principal da Plenária dos Movimentos Sociais, realizada em 13 de setembro em São Paulo. Em nota intitulada “Não ao leilão de Libra”, as organizações classificam o leilão como “um jogo de carta marcada”. “Isso é um verdadeiro atentado contra a soberania nacional, o desenvolvimento do Brasil e o futuro de nosso país”, destaca o manifesto. 
 
Outra reação contrária veio do Senado. Em 12 de setembro, o senador Roberto Requião (PMDB-PR) apresentou, no plenário da Casa, uma proposta de Decreto Legislativo que suspende o leilão do campo de petróleo de Libra. “Nenhum país soberano, independente, leiloa petróleo já descoberto”, afirma a justificativa do projeto.
 
Apesar das críticas e dos protestos, o Ministério de Minas e Energia, até  o momento, se mantém firme em defesa do leilão. O  ministro Edison Lobão garante que o calendário será mantido. Já a Petrobras, em nota, informa que dispõe de sistemas altamente qualificados e permanentemente atualizados para a proteção de sua Rede Interna de Computadores (RIC). 
 
“A Companhia executa, de forma consistente, todos os procedimentos identificados e reconhecidos como melhores práticas de mercado na proteção de sua rede interna e de seus dados e informações”, diz o comunicado.
 
Nesta sexta-feira (20), três empresas internacionais do setor petroleiro – a estadunidense Exxon Mobil e as britânicas BP e BG – informaram que não participarão do leilão do Campo de Libra, no pré-sal da Bacia da Santos. A estadunidense Chevron anunciou, em comunicado, que também decidiu não participar da disputa.
 
 
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