Arquipélago dos transportes
05/05/2012
- Opinión
Um dos grandes desafios de países de porte grande é o de integrar seus territórios, tornando próximo o distante, a fim de ter fluidez nos transportes.
A constância de atrasos nos voos e de congestionamentos no tráfego urbano confirmam o acúmulo de um problema infraestrutural no Brasil. Como o país quer honrar sua nova posição como sexta economia mundial se o setor de transportes sofre como nunca mereceu?
Não me refiro somente a mercadorias. Um direito básico de qualquer cidadão é o de ir e vir, transportar-se com custo baixo entre cidades e estados, visitar parentes de outras regiões, fazer turismo ou locomover-se a trabalho, conhecer lugares diferentes dentro de seu próprio país.
O transporte de passageiros e cargas é deficiente no Brasil devido à escolha infeliz e inconsequente pelas rodovias em vez do desenvolvimento fluvial e ferroviário. De final dos anos 1960 à primeira década do século XXI, os trechos rodoviários têm aumentado e tomado distância em relação aos ferroviários, enquanto o país assistiu à regressão do uso de trens. O equilíbrio de extensão das duas modalidades viu-se nos anos 1970. A partir deste período, o país encontrou outro motivo de lamentação, além da restrição das liberdades de expressão pela ditadura.
Enquanto os países da vanguarda da Revolução Industrial priorizam a malha ferroviária sobre a rodoviária devido à redução de custo e a agilidade nos transportes, o Brasil faz o contrário. O país sul-americano dispõe de aproximadamente 29 mil quilômetros de ferrovias, que se utilizam majoritariamente para o transporte de grãos e minérios, enquanto as rodovias ultrapassam 62 mil quilômetros de extensão e crescem "sem parar".
As viagens de alta temporada, como nos feriados de Carnaval e Natal, podem levar muito mais tempo que o previsto devido a congestionamentos nas rodovias, ainda que estas sejam "concedidas". Isto demonstra que a política de "concessões" não resolve o problema rodoviário, que, no Brasil, é a própria essência do problema. As "concessões" de rodovias, em vez de facilitar a locomoção, elevam os valores de pedágios, dificultam a viagem de famílias mais pobres, e encarecem o frete. As "concessionárias" preservam as rodovias em boas condições para os que podem pagar, mas atuam em desconformidade com o interesse público.
As empresas automobilísticas alcançam valores recordes de vendas no Brasil, ainda que a "crise econômica mundial" as tenha afetado noutros países. Incentiva-se a compra de carros mesmo em cidades de porte médio e com malha viária precária em detrimento do transporte coletivo. A redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) exemplifica um destes estímulos. A última política federal é a de reduzir este imposto em até 30% para empresas que comprarem uma percentagem mínima de peças nacionais para o processo de montagem dos veículos.
Não só passageiros sofrem da ineficiência e do custo elevado do transporte no Brasil. Produtores rurais e indústrias também se queixam da morosidade e do custo de levar seus produtos aos centros de consumo e portos para exportação. As mercadorias chegam caras às estantes dos supermercados, enquanto o país se divide em arquipélago pelo desenvolvimento retrógrado de seu transporte. Falta aproveitar melhor nossas potencialidades dos rios e dos trilhos.
O Ministro dos Transportes previu a finalização do trem bala entre Campinas, SP, e Rio de Janeiro, RJ, para 2022, ao contrário do que muitos esperavam para a Copa de 2014. O pior deste projeto não é que pule etapas de desenvolvimento de um sistema ferroviário nacional senão que visa integrar as regiões que já são as mais interligadas do país, ou seja, o Eixo Rio - São Paulo. É um acréscimo ao que já tem muito. O resto continuará resto, sucateado como os trens.
Lula, durante sua gestão, assumiu compromissos milagrosos. Sua sucessora, Dilma Rousseff, contraria elaborações programáticas do Partido dos Trabalhadores ao "conceder" três dos maiores aeroportos à iniciativa privada. Empresas argentinas, francesas e sul-africanas pagaram 14,2 bilhões de dólares pelos aeroportos de Juscelino Kubitschek (Brasília), Viracopos (Campinas) e Governador André Franco Montoro (Guarulhos).
Mais um recurso infraestrutural estratégico que nossos tomadores de decisão deixam nas mãos da iniciativa privada. A melhor das hipóteses ainda é algo a temer, uma vez que os brasileiros costumamos sentir primeiramente no bolso.
A grande pergunta é: como reverter a situação dos transportes no Brasil, tendo-se em conta os interesses e lóbis que se armaram em contra dos brasileiros?
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