Diógenes em Minas

12/08/2001
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Diógenes saiu com a sua lanterna pelas ruas de Belo Horizonte à procura de um parlamentar transparente. Subiu ofegante as escarpas do bairro de Lourdes e, no alto da avenida Olegário Maciel, deparou-se com um bando de deputados estaduais premiados pela loteria da maracutaia. ‹ Qual é o salário dos senhores? ­ indagou o discípulo de Antístenes. ‹ A resposta soou tão misteriosa e controvertida quanto o montante de ouro contrabadeado de Minas na época da colônia. Segundo uns, R$ 6 mil. Segundo outros, R$ 23 mil. O deputado Antônio Júlio (PMDB), presidente da casa, falou em R$ 42 mil, valor que confere com o divulgado há dois anos pelo deputado Durval ngelo (PT). Acrescidos os recursos adicionais ao cumprimento do mandato, cada parlamentar embolsa por mês cerca de R$ 60 mil. Graças à lanterna eletrônica da TV Globo, Diógenes viu a declaração de imposto de renda do vice-presidente da Assembléia Legislativa, deputado Alberto Pinto Coelho (PPB). Ano passado ele recebeu R$ 871,6 mil, o que equivale ao salário mensal de R$ 72,6 mil. Diógenes lembrou que o mais bem pago deputado europeu é o alemão, que ganha US$ 6.500 por mês ou R$ 16 mil. O que intrigou Diógenes é que, por mais que erguesse a lanterna, não lograva avistar nem os contracheques dos deputados do PT, partido que pretende se pautar pela ética na política. E as perguntas do filósofo quedaram sem resposta: 1) Por que os rendimentos mensais dos parlamentares beiravam os R$ 60 mil? 2) Por que o Siafi (Sistema Integrado de Administração Financeira) revela os gastos do Executivo e do Judiciário mineiros, mas não o do Legislativo? 3) Por que o Tribunal de Contas do Estado, formado em sua maioria por ex-deputados, não divulga as contas do poder Legislativo? Insistente, Diógenes afastou, como fizera a Alexandre, os que lhe tapavam o sol, até encontrar nas Alterosas um parlamentar que encarna o que a maioria dos eleitores espera de um homem público: Antônio Pinheiro, agrimensor. Foi deputado estadual pelo PSDB em 1993 e 1994. Insatisfeito com o governo federal, migrou para o PSB. Hoje é vereador pelo PV. ‹ Em apenas um mês, dezembro de 1994 ­ relatou Antônio Pinheiro a Diógenes -, tive depositada em minha conta, na agência Assembléia do Bemge, o equivalente a US$ 82.473,34. Valor que um deputado da rica Alemanha não ganha em um ano. Tornei público o absurdo e doei a uma instituição de caridade. Em Minas, deputados que viajam ao exterior a serviço recebem da Assembléia, além das passagens, diária de US$ 400. Certa vez alguém me ofereceu US$ 400 mil, em parcelas mensais de US$ 40 mil, a serem distribuídos de acordo com indicações minhas, para que eu votasse pela aprovação de determinados projetos. Se preferisse, poderia retirar-me da sessão de votação. A condição imposta era não votar contra. Devo dizer, a bem da verdade, que naquele grupo conheci alguns que, sem meios eficazes para denunciar atos nefastos, repassavam o dinheiro ilegal, depositado em suas contas, a entidades carentes. Mas isto é muito pouco. O que se pede é transparência já! Antônio Pinheiro sabe que o presidente da Assembléia Legislativa de Minas ganha em dobro. Diógenes ficou perplexo. ‹ Num país em que policial honesto é premiado, porque os desonestos nem sempre são punidos ­ ponderou o filósofo ­ talvez seja hora de premiar os parlamentares decentes, que não se locupletam com dinheiro público nem sonegam a confiança dos eleitores. Urge, contudo, exigir que parlamentar não tenha sigilo bancário nem faça votação secreta. O eleitor merece transparência de quem se elegeu com o seu voto. Antônio Pinheiro é pai do jornalista Chico Pinheiro. E exemplo de ética na política para todos nós.
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