Crise de energia e racionamento de água: o futuro chegou
07/06/2001
- Opinión
Devemos prestar atenção nos detalhes dos argumentos do governo
para a crise de energia, sem isentá-lo numa vírgula sequer em
termos de responsabilidade pelo que está acontecendo. Afinal,
segundo o MAB, bastaria uma rede de energia interligando melhor
nossas geradoras para não termos necessidade de racionamento.
Ainda mais, nossas turbinas geradoras são obsoletas, exigindo
muita água para gerar pouca energia. Com turbinas mais modernas
geraríamos mais energia com menos água. Mas não é sobre essa
incompetência governamental que quero falar.
O governo tirou uma segunda carta da manga: a crise é da água.
Temos capacidade geradora instalada, mas falta água para
movimentar as turbinas. Ufa! O poderoso Aquiles começa mostrar
seu calcanhar de barro. A soberba tecnologia é obrigada a
curvar-se novamente diante da mãe natureza e admitir que, sem
chuva, a civilização brasileira não funciona. A arrogância
econômica, ainda que não queira, é obrigada a olhar para a
natureza e admitir que, sem uma relação harmônica com ela, a
racionalidade econômica é a expressão da mais profunda
irracionalidade.
Somente alguns ambientalistas, em conjunto com alguns
cientistas, há tempos vêm alertando para a questão fundamental
da água. As barragens têm um tempo de vida útil limitado, depois
enchem de areia e perdem sua capacidade geradora. Nossos rios
estão sendo destruídos, os afluentes estão sendo exterminados.
Só no Oeste Baiano a monocultura da soja extinguiu 17
subafluentes do São Francisco. Enfim, há limite para a geração
de energia hidroelétrica, é preciso investir em fontes
alternativas. Falando claro, os recursos naturais do planeta
começam mostrar que têm limites, principalmente a água, e tudo
que dela depende, inclusive água potável, geração de energia
elétrica e irrigação. As crises - estou falando em termos
históricos - se sucederão de forma crônica e dramática. A ONU já
previu que até 2050 - já tem gente falando em 2025 - faltará
água potável para 40% da humanidade. Os americanos já admitiram
que a crise de energia nos EEUU é estrutural e não conjuntural.
Eles estão destruindo barragens, não porque amam os rios, e sim
porque elas já esgotaram sua capacidade geradora, mas vão
continuar investindo em energias devastadoras.
Seria o momento de se propor um modelo civilizatório mais
ascético, menos predador, justo, harmonioso com a natureza,
efetivamente sustentável, mais respeitador de Gaia ( planeta
vivo, de fino equilíbrio, cuja ruptura põem em perigo a vida que
ele contem). Mas os vampiros da humanidade parecem querer levar
essa lógica até o fim.
Os incautos que liguem as antenas: essa crise foi preparada com
a finalidade de privatizar as águas brasileiras. As
multinacionais da água começaram a se instalar nos pontos
estratégicos do país, como em Manaus. No momento em que a água
se transformar definitivamente em produto de exportação, eles já
estarão estruturados com o "filé" nas mãos. Quem controlar a
água controlará a irrigação ( hoje a água já é mais importante
como "meio de produção" que a terra ), a exportação, uso para
consumo humano e a geração de energia elétrica. Infelizmente, em
termos de horizonte histórico, todos dormem em berço esplêndido,
inclusive as esquerdas e o movimento social em geral. Menos o
olho do grande capital.
Alguém duvida que a elite brasileira - com essa alma colonizada
que tem -, vai deixar de entregar nosso patrimônio natural? De
que adianta essa abundância de recursos naturais se, em todos os
momentos que a história nos ofereceu a oportunidade, fomos
incapazes de sair na frente?
No dia do meio ambiente, diante da crise de energia e do
racionamento da água, fica claro que o futuro chegou. E ele não
é maravilhoso.
* Roberto Malvezzi, Coordenação Nacional da CPT.
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