O golpe contra o avanço no combate ao racismo
Não há possibilidade de avanço no combate ao racismo no seio de uma política neoliberal como é a do governo golpista.
- Opinión
Este artigo propõe uma reflexão sobre os espaços abertos com a noção de política pública participativa e transversal implantada pelos governos de Lula e Dilma para o avanço nas políticas de combate ao racismo. Esse avanço decorreu também da trajetória do movimento negro brasileiro que, com a denúncia das práticas estruturais de racismo, desmontou o mito da democracia racial e forçou o governo brasileiro, já em 1995, a reconhecer oficialmente o racismo como problema nacional. Posteriormente, o movimento negro pressionou o Estado brasileiro a adotar medidas específicas de combate ao racismo, a partir da leitura – comprovada por diversos estudos de órgãos oficiais, como o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) – de que as políticas públicas generalistas não são suficientes para reduzir as desigualdades raciais. E o caráter participativo e transversal implantado pelas administrações lideradas pelo Partido dos Trabalhadores possibilitou a entrada de novos sujeitos coletivos, oriundos das organizações do movimento negro, na formulação e gestão das políticas públicas e de alguns equipamentos sociais.
Com isto, o período Lula e Dilma trouxe alguns avanços significativos em termos de ascensão social de negras e negros, embora as diferenças sociais marcadas pelo racismo ainda continuem altas. Os compromissos internacionais firmados pelo Brasil na Conferência de Combate ao Racismo da ONU, realizada em Durban, na África do Sul, em 2001, deu visibilidade internacional às ações do governo brasileiro, razão pela qual o país recebeu a visita de uma relatora especial da ONU no final de 2015 para fazer uma avaliação do impacto das políticas de ação afirmativa.
Não obstante estes avanços no universo da Sociedade Política, permanecem alguns gargalos, que, inclusive, foram percebidos pela própria relatora da ONU. Em boa parte, esses gargalos decorrem das mudanças no trato com o combate ao racismo terem sido realizadas no âmbito de políticas de promoção de igualdade formuladas a partir do Poder Executivo, sem necessariamente se ter avançado no campo do combate ideológico ao racismo e menos ainda na reforma do Estado.
Por isto, como ação reativa a estes avanços sociais da população negra, o racismo brasileiro “sai do armário” e passa a se expressar de forma mais explícita, inclusive reivindicando a “liberdade de expressão de ser racista”. As manifestações conservadoras em favor do golpe foram o espaço privilegiado para a expressão desses sentimentos racistas.
Assim, defendemos neste artigo que o racismo é um dos principais componentes ideológicos das forças golpistas e que, uma vez no poder, se expressarão, principalmente, por políticas de extermínio da população negra, em especial a das periferias.
Movimento negro: da denúncia à formulação de políticas públicas
O movimento negro e antirracista cumpriu papel importantíssimo quando, em 1995, durante a Marcha a Brasília de celebração dos 300 anos de Zumbi dos Palmares, forçou o governo brasileiro, pela primeira vez, a reconhecer oficialmente a existência do racismo no país. Naquele momento, o então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, recebeu uma comissão executiva da marcha e nomeou um Grupo de Trabalho Interministerial para pensar políticas públicas de combate ao racismo.
No ano de 2001 há uma ação por parte de setores do governo brasileiro, como o Ministério das Relações Exteriores e a Fundação Palmares (vinculada ao Ministério da Cultura), juntamente com o movimento negro organizado, na preparação do país para participar da III Conferência Mundial de Combate ao Racismo, convocada pela ONU e realizada em Durban.
Uma série de reuniões, pré-conferências temáticas e seminários foi realizada, e o resultado foi um documento e uma posição do Brasil na Conferência de Durban de se comprometer com a implementação de políticas de ação afirmativa para combater o racismo no país. Diante deste cenário, cresce a bandeira das cotas raciais e de outras políticas de ação afirmativa, dentro da perspectiva de que as políticas públicas generalistas, por si só, não eram suficientes para resolver as disparidades raciais.
Neste período, houve avanços institucionais significativos:
- a tipificação do racismo como crime inafiançável e imprescritível na Constituição de 1988, regulamentada pela Lei Caó (Lei 7.716/89);
– Lei 10.639/03, que altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e torna obrigatório o ensino de história da África e cultura africana e afrobrasileira no ensino básico;
– o Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288/10), de autoria do senador Paulo Paim (PT-RS), que no seu artigo 1º define com objetivo da lei “garantir à população negra a efetivação da igualdade de oportunidades, a defesa dos direitos étnicos individuais, coletivos e difusos e o combate à discriminação e às demais formas de intolerância étnica”;
– a criação de organismos específicos para tratar de políticas de combate ao racismo e promoção da igualdade racial;
– a implantação das cotas raciais e sociais nas universidades federais por meio da Lei 12.711/12 e das cotas raciais para os concursos públicos (Lei 12.990/14), que reserva 20% das vagas para aqueles que se autodeclararem negros.
Além desses dispositivos legais, várias outras medidas referentes às especificidades do racismo são tomadas nas áreas de saúde, educação, assistência social, esporte (principalmente com a campanha contra o racismo na Copa do Mundo), entre outras. Assim, o combate ao racismo transcendeu do âmbito da denúncia para o reconhecimento de sua existência e, finalmente, passou a ser incluído na dimensão institucional da formulação das políticas públicas.
Um elemento importante a ser considerado neste processo é a implantação do modelo de política pública baseado na transversalidade e no controle social, principalmente após a vitória do PT para a presidência em 2003. Este modelo tem como uma de suas características fundamentais a construção de espaços de diálogo entre o governo e os movimentos sociais para avaliação e formulação de políticas públicas, o que se convencionou chamar de “democracia participativa”.
O gráfico abaixo mostra o crescimento desta prática nos governos Lula/Dilma: há um extraordinário aumento do número de conferências participativas realizadas a partir da gestão Lula.
Este elemento singular, associado ao processo de transição da luta contra o racismo que converge na situação de um reconhecimento oficial da existência do problema, da necessidade de políticas específicas de combate ao racismo e da maior presença do tema nas agendas institucionais, resultou em um deslocamento da luta antirracista para uma dimensão institucional, na qual o debate se coloca na eficácia ou eficiência das políticas públicas de combate ao racismo. Por esta razão, ao mesmo tempo em que se percebem os avanços institucionais, crescem também as angústias e as ansiedades para a resolução do problema que parece cada vez mais complexo.
O que é importante ressaltar neste processo histórico recente foi a transição da denúncia do racismo e desmascaramento do mito da democracia racial para o reconhecimento do racismo como problema político, posteriormente para a reivindicação por políticas públicas e, finalmente, pela participação na formulação das políticas públicas. Neste sentido, a perspectiva participativa foi um ingrediente importante na consolidação da agenda do enfrentamento do racismo não só no sentido de possibilitar a presença de tal agenda na pauta política dos aparelhos de Estado, mas também na ampliação do universo de sujeitos políticos que protagonizam a agenda antirracista.
Observando os indicadores, é notória a ascensão social da população negra no Brasil neste período, embora persistam ainda vários gargalos decorrentes de estruturas de Estado ainda não reformuladas.
Segundo dados do IBGE:
a) Entre 1999 e 2009, a escolaridade das mulheres negras aumentou 39,28%, passando de 5,6 anos para 7,8 anos de estudo em média; a dos homens negros aumentou 44,68%, e foi de 4,7 para 6,8 anos de estudos;
b) O público atendido pelo Sistema Único de Saúde (SUS) é majoritariamente negro (67,7%). Entre as mulheres brancas acima de 40 anos, 45,1% havia realizado exame clínico de mamas e 40,2% haviam realizado mamografia; já para as mulheres negras na mesma faixa etária, este percentual foi de 33,1% e 28,7%, respectivamente.
c) Na Previdência Social, um dado importante é que as aposentadorias beneficiam mais os homens brancos idosos (70,7%) enquanto as mulheres negras são as menos beneficiadas (56,7%). Muito provavelmente porque o acesso aos benefícios previdenciários depende de inserção formal no mercado de trabalho. A exclusão do mercado formal de trabalho significa também a exclusão dos benefícios previdenciários.
d) Os negros apresentavam, em 2009, em média 55% da renda percebida pelos brancos; no entanto, em 1995, a razão de renda era ainda menor (45%). A renda média de mulheres negras equivalia a 18% dos rendimentos percebidos pelos homens brancos em 1995, e chega a 30,5% em 2009. Uma diminuição significativa neste abismo, porém, muito longe da ideal.
e) De acordo com a Síntese de Indicadores Sociais, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2004, 16,7% dos alunos pretos ou pardos estavam em uma faculdade; em 2014, esse percentual saltou para 45,5%. No caso dos estudantes brancos, em 2004, 47,2% frequentavam o ensino superior; dez anos depois, essa parcela passou para 71,4%.
f) As políticas de transferência de renda e de assistência social dos governos Lula e Dilma beneficiaram principalmente mulheres negras. 73% dos beneficiários do Bolsa Família são negros e 68% das famílias beneficiadas são chefiadas por mulheres negras. 80% dos beneficiários do programa “Água para Todos” (construção de cisternas) são negros. No Programa Luz para Todos, o percentual de negros entre os beneficiários é também de 80%. No Pronatec, 68% das matrículas contabilizadas em 2014 eram de jovens negros. O programa Minha Casa, Minha Vida tem entre os seus contemplados 70% de famílias negras.
O olhar das Nações Unidas para as ações afirmativas no Brasil
O Informe Especial da ONU para as minorias, elaborado pela relatora Rita Iszák em novembro de 2014, apontou que:
Brasil tem desenvolvido uma multiplicidade de instituições sólidas, programas e iniciativas normativas para abordar a temática dos direitos humanos das minorias, como, por exemplo, mecanismos de combate ao racismo, programas de ação afirmativa e outras iniciativas contra a discriminação. ONU, Report of the Special Rapporteur on minority issues on her mission to Brazil, 2014 (T.L.A.).
Mais adiante, o Informe da relatora afirma que:
As minorias no Brasil, particularmente os afrobrasileiros, que se consideram a si mesmos uma minoria política apesar de serem majoritários demograficamente, seguem tendo que fazer frente a inúmeras barreiras para desfrutar plenamente os seus direitos humanos. Sob uma longa história de escravização e opressão, os afrobrasileiros são objeto de discriminação racial e enfrentam grandes desvantagens em comparação com outros brasileiros, são vítimas de altos níveis de violência, incluídas as perpetradas pelo Estado, afrontam a impunidade dos crimes que se comentem contra deles, tem níveis mais baixos de desenvolvimento socioeconômico, suas taxas de encarceramento são extremamente elevadas e as mulheres e crianças afrobrasileiras continuam sendo vulneráveis aos abusos. ONU, Report of the Special Rapporteur on minority issues on her mission to Brazil, 2014 (T.L.A.).
Destacamos aqui dois aspectos destacados pela relatora da ONU que, segundo ela, são os entraves para o pleno desenvolvimento da igualdade racial:
a) a não extensão do conjunto de políticas de ação afirmativa para os poderes Legislativo e Judiciário; concentrando-se quase que exclusivamente no âmbito do Poder Executivo;
b) a permanência de uma política de segurança pública de caráter repressivo, com destaque à política de “guerra às drogas”, que tem servido como justificativa para os mecanismos de violência nas periferias que atingem prioritariamente os jovens negros.
O que aconteceu neste período é que esta ampliação dos sujeitos no âmbito da esfera política ocorreu quase que exclusivamente pelas vias dos espaços participativos abertos no Executivo, por meio das conferências e conselhos. Com isto, houve certo descompasso entre as dinâmicas políticas que foram se constituindo nestes espaços e os processos institucionais que se desenvolvem no Legislativo e no Judiciário. Assim, muitas políticas públicas desenvolvidas não puderam ser plenamente implantadas ou encontraram entraves impostos.
À medida que a presença conservadora no Poder Legislativo cresceu, esta ausência de sintonia chegou a um ponto alto. Como exemplo disto, temos a eleição de um parlamentar fundamentalista conservador para presidir a Comissão de Direitos Humanos e os vários projetos de lei que tramitam nas casas parlamentares (federais e estaduais) que colocam em risco os avanços construídos coletivamente nas políticas educacionais voltadas para a diversidade, como a Lei 10.639/03 (que torna obrigatório o ensino de história africana e cultura africana e afrobrasileira) e a Lei 11.645/08 (cultura indígena).
O conflito ideológico: racismo versus antirracismo
O que temos então como resultante disto é um conflito existente entre um pensamento racista que sai do armário e se mostra de forma mais nítida, e as reivindicações por equidade social do movimento negro. Neste conflito, chama a atenção a apropriação por parte do pensamento racista da narrativa do direito civil individual, da liberdade de manter os privilégios.
Por que dizemos isto? Porque o racismo é um mecanismo ideológico que sustenta uma relação hierárquica e deprivilégios. Os poucos avanços conquistados significaram um “arranhão” nos privilégios e isto despertou os sentimentos racistas mais furiosos entre os defensores do golpe. Desde chamar os beneficiários do Bolsa Família de “vagabundos” ou o costumeiro uso do termo “vitimismo” para qualificar negras e negros que denunciam os sistemas de opressão.
Porém, para além destas ações, o perfil do governo golpista é uma síntese deste pensamento racista. Não só pela totalidade na sua composição de homens brancos e pelo rebaixamento do status das secretarias de igualdade racial, direitos humanos e de mulheres e a transferência dos seus orçamentos para o gabinete da Presidência da República por decreto. Mas, principalmente, por medidas que tanto impedem o avanço nas políticas públicas como também pela sinalização de uma intensificação das ações repressivas.
O plano econômico elaborado pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, determina que os gastos orçamentários de cada pasta só podem ser corrigidos de um ano para o outro pela inflação. Isto significa um congelamento real do nível de investimentos em cada pasta, independentemente de aumentos reais de arrecadação causados por crescimento da economia ou aumento de impostos. E, mais que isto, que o governo possa alterar prioridades de um ano para outro, investindo mais em uma área que em outra.
Evidente que, quando se fala na necessidade de ampliação das políticas públicas de combate ao racismo, isso significa aumento de investimentos. E isto está vetado meramente pela obsessão do governo atual de obter o tal “equilíbrio fiscal” para atender às demandas do capital especulativo.
Enfim, as recomendações da relatora da ONU não serão cumpridas. As políticas públicas de combate ao racismo ficarão congeladas ou até drasticamente reduzidas. Os ganhos obtidos até o momento correm risco real de se perderem.
A política econômica de caráter recessivo que se sinaliza tende a piorar o cenário das relações de trabalho. As taxas de desemprego e de informalização do trabalho aumentarão e, como se verificou anteriormente, os mecanismos racistas fazem que tais processos incidam de forma diferenciada entre brancos e negros com evidente desvantagens para os segundos.
A reforma da Previdência no sentido não da sua ampliação, mas da sua restrição e também os ataques ao SUS terão impactos negativos na população negra.
O extermínio programado da população negra – a resposta neoliberal
Chamamos a atenção para a presença no primeiro escalão do governo golpista de Alexandre de Moraes, ex-secretário da Segurança Pública do estado de São Paulo e que, nesta condição, foi o gestor de uma política de segurança baseada na repressão intensiva e no encarceramento massivo, processos literalmente citados e criticados pela relatora da ONU como instrumentos de violência racial. Outra figura presente no governo golpista, Osmar Terra, no Ministério do Desenvolvimento Agrário, é um aberto defensor da política da guerra às drogas, também criticada no relatório das Nações Unidas.
A presença dessas pessoas no governo federal tem um sentido político e ideológico. À medida que a política do governo golpista se direciona para uma perspectiva ultraliberal (explicitamente exposta no documento “Ponte para o Futuro”, do PMDB), a tendência é um desmonte de toda arquitetura de políticas públicas construídas nos últimos treze anos, muito antes de estarem consolidadas.
A subordinação das secretarias de Igualdade Racial, Mulheres, Juventude e Direitos Humanos ao Ministério da Justiça comandado por Alexandre de Moraes, justamente uma pessoa que tem um histórico político de desrespeito aos direitos humanos, é um nítido sinal de como deverá se comportar este governo golpista em relação a essas temáticas.
Espertamente, o governo golpista colocou pessoas de certo renome nas áreas de Igualdade Racial e Direitos Humanos. Algumas pautas mais importantes estão sendo defendidas pelas titulares dessas pastas, porém, a subordinação a um ministério com este perfil dá o tom exato de como serão tratados estes temas: comopolíticas compensatórias e periféricas e não como centrais na agenda política do governo.
Em 2000, na nossa obra Globalização e racismo no Brasil, defendemos a ideia de que o neoliberalismo implica uma intensificação do racismo porque, com a redução das oportunidades de trabalho e bem-estar, os critérios raciais aparecem como os mais “eficazes” na seleção dos que serão ou não incluídos, principalmente em um país que tem um passado histórico marcado pela escravização de africanos.
Por isto, as políticas neoliberais oscilam entre intensificar os mecanismos de violência intensiva (voltados para o extermínio das populações tidas como “descartáveis”, os excluídos) e as políticas compensatórias, na perspectiva defendida pelo Banco Mundial no final dos anos 1990: políticas públicas não universalizantes, focadas em alguns setores específicos, preferencialmente terceirizadas para organizações não governamentais e com o principal objetivo de administrar as tensões sociais.
Assim, a subordinação destas secretarias a um ministério comandado por uma figura que defende abertamente o recrudescimento da violência e a redução das mesmas do status de ministérios para órgãos com menor visibilidade as coloca como instrumentos lenitivos para amenizar os efeitos da política neoliberal que será a tônica do governo golpista.
A luta contra o extermínio da população negra na periferia tenderá a ser a principal bandeira do movimento negro. As tecnologias de extermínio implantadas no estado de São Paulo serão nacionalizadas, o discurso truculento de garantir a segurança pública pelo recrudescimento da repressão, a intensificação da narrativa da guerra às drogas encontrará eco em uma forte bancada parlamentar defensora desses mecanismos (a “bancada da bala”) e será capilarizada nas periferias por meio dos fundamentalistas evangélicos com o discurso “moralista” (expresso no Congresso pela bancada “da Bíblia”).
Não foi à toa que a atual secretária de Igualdade Racial do governo golpista declarou que o mecanismo de enfrentamento da violência contra a juventude negra da periferia é o Programa Juventude Viva que, segundo material oficial da Seppir,
atua na articulação e direcionamento de programas e ações específicas para os jovens de 15 a 29 anos em situação de vulnerabilidade para fomentar trajetórias de inclusão e autonomia, além de criar oportunidades de atuação dos jovens em ações de transformação da cultura de violência e reconhecimento da importância social da juventude. Site da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, acessado em 12/07/2016.
Em outras palavras, o problema do extermínio da juventude negra, na visão da Seppir atual, é produto do próprio jovem que está inserido em uma “cultura da violência”.
Considerações finais: as perspectivas
O governo golpista é um retrocesso brutal nas políticas públicas de combate ao racismo que ainda sequer estavam consolidadas. Importante ressaltar que, ao contrário de outras experiências latino-americanas como as da Bolívia e do Equador, estas políticas aconteceram sem uma reforma profunda no Estado brasileiro – elas foram sendo implantadas dentro das estruturas institucionais existentes com pequenas mudanças pontuais.
Por isso, o movimento negro tem insistido na pauta da necessidade de combate ao racismo institucional, visto este como um dos principais entraves para a plena consolidação dessas políticas. Combater o racismo institucional significa reformar profundamente as instituições, o que não foi possível. E, assim, por dentro do próprio arcabouço institucional, foi-se constituindo o golpe contra as políticas de equidade sociorracial, apropriando-se das narrativas dos direitos individuais e, silenciosamente, desmontando-se todo o processo inconcluso de combate ao racismo que foi se construindo via políticas públicas participativas.
Para além disto, é necessário intensificar o debate de caráter ideológico no seio da sociedade civil. A agenda de combate ao racismo precisa sair da periferia da agenda política e ir para o seu centro, pois se trata de um elemento estruturante das relações sociais no Brasil. Não há possibilidade de avanço no combate ao racismo no seio de uma política neoliberal como é a do governo golpista. Entretanto, a ruptura com a ordem neoliberal passa também pela centralidade da agenda de combate ao racismo. Assim, o movimento antirracista tem as organizações negras como principais sujeitos políticos, mas é uma pauta de todos os movimentos de transformação social no Brasil.
Este artigo integra o livro Golpe 16 (224 págs.), organizador por Renato Rovai e editado por Glauco Faria, ambos do portal Fórum. É uma coletânea de textos produzidos por jornalistas e midiativistas – a história da consumação do atentado contra a democracia brasileira, contada no calor dos acontecimentos. A obra traz entrevista com a presidenta Dilma Rousseff e tem prefácio do ex-Presidente Lula. Para adquirir, clique aqui. (R$ 35 + R$ 7 de frete)
12/10/2016
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