As novas tendências dos golpes na América Latina
- Opinión
Corre uma versão – quase universalmente citada – de que as novas formas de golpe na América Latina começaram com o de Honduras, contra Manuel Zelaya, em 2009, graças a um mandado de prisão emitido pela Suprema Corte do país cujo motivo era um plebiscito não vinculante sobre a convocação de uma Assembleia Constituinte.
Depois, houve o golpe contra Fernando Lugo, no Paraguai, executado no Parlamento, com acusações sem provas nem indícios. A seguir veio o golpe contra Dilma Rousseff, em 2016, mais complexo, com a participação do Parlamento e do Judiciário. Este já vinha alimentando o golpe a ser aplicado em 2018, sobre a eleição, com as condenações ilegais de Lula e as vistas grossas diante de todas as evidencias de fake news praticadas pela campanha de Bolsonaro.
Tudo isto é verdade. Mas não é toda a verdade. As práticas destes novos estilos de golpe foram testadas nos Estados Unidos, antes de serem exportadas para a América Latina. O primeiro golpe acabado desta nova forma foi dado quando da eleição de Bush Filho contra Al Gore, em 2000. Devido ao anacrônico sistema eleitoral norte-americano, Bush perdeu no voto popular e ganhou no Colégio Eleitoral. E garantiu a eleição obtendo os votos dos super eleitores do estado da Flórida, numa eleição contestada. Ali ele ganhou por uma diferença de pouco mais de 500 votos. A lei estadual mandava que houvesse uma recontagem. O Partido Democrata alegava que inúmeras irregularidades foram cometidas anulando votos de bairros e regiões que seriam favoráveis a Al Gore. E numa votação, por 5 x 4, a Suprema Corte dos Estados Unidos mandou suspender a recontagem. Foi golpe? Foi.
É claro que toda a atuação da Lava-Jato contra Lula foi orquestrada a partir dos Estados Unidos. De quebra, também partiu dali a orquestração para arrebentar com as empresas brasileiras de construção civil e contra a Petrobras.
Agora os acontecimentos na Bolívia mostram uma nova tendência golpista posta em marcha. Descola-se uma motivação cara à mídia mainstream de direita, como corrupção ou fraude eleitoral. Pouco importa se é comprovada ou não. Açula-se a manada da classe media ressentida com a melhora do nível de vida da população mais pobre. Sai às ruas a sua vanguarda: a tigrada miliciana, constituída por uma frente de criminosos, militares do baixo-clero que atuam mascarados, militantes de um pentecostalismo messiânico e fanatizado, que atacam os alvos de esquerda. Bane-se um presidente e seus auxiliares.
Diante disto, lavam as mãos: as autoridades (in)competentes, do Judiciário e dos estamentos militares. Os deste último setor “convidam” o presidente a renunciar. Ao lado e no hemisfério norte, os governos do Brasil e dos Estados Unidos aplaudem o “retorno à democracia”. E do outro lado do oceano a União Europeia também lava as mãos, disposta mais a conviver com o fascismo miliciano do que com uma esquerda democrática, cuja administração na América Latina compra a inutilidade de suas políticas de austeridade. Tudo de olho nas reservas energéticas e naturais da região, como o pré sal brasileiro, o lítio boliviano e o aquífero Guarani.
A Bolívia gestou o ovo da serpente que seria eventualmente aplicado no Brasil de Bolsonaro.
17/11/20
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