A igualdade deve ser a principal bandeira da esquerda

26/03/2019
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O primeiro tijolo para reconstruir uma perspectiva de esquerda só pode ser a igualdade, mas não um conceito econômico diminuto, e sim uma tempestade regeneradora que abala e reanima toda a sociedade.

 

A igualdade não deve ser uma punição ou uma espécie de assédio para quem tem muito, como um imposto patrimonial, para dar para quem tem menos; isso também pode ser preciso, mas não é esse o tema. Se a igualdade não se tornar um construto da sociedade, uma dimensão que atravessa toda a sociedade, um costume, um modo de pensar, uma cultura, produzirá reações e rejeições, não só naqueles que pensam que são atingidos no seu patrimônio, mas também naqueles que terão medo de ser atingidos no futuro, ou mesmo naqueles que se sentem diminuídos por serem iguais, ou por aqueles que pensam que a meritocracia deve ser o instrumento que organiza a sociedade, porque as diferenças sociais dependem de quanto alguém se gastou e se sacrificou.

 

Esse é o engano que nos é oferecido pelo pensamento hegemônico, por um pensamento que não nos quer livres, mas sim submissos ou, melhor ainda, autossubmissos. É essa hegemonia cultural que deve ser combatida, tornando hegemônica a cultura da igualdade.

 

Igualdade não é massificação, a redução das diversidades à unidade, mas, ao contrário, o solo fértil onde a individualidade pode explorar plenamente as suas possibilidades e pode se exaltar nas e das diferenças. Igualdade e individualidade devem viver em simbiose e, nesse quadro, aniquilar o individualismo.

 

Igualdade e liberdade têm um caminho comum, devem se dar as mãos; só podemos ser livres se, aos olhos dos outros, pudermos ler a nós mesmos sem corar.

 

A igualdade funda o respeito mútuo, a ausência de inveja social e a indiferença por acumulação; essas são as condições para que cada um respeite os outros.

 

A igualdade só pode exaltar os méritos com a condição de que estes não devam se transformar em moeda. Não é só o “soldo” que garante o reconhecimento do mérito; instrumentos e meios sociais podem ser ainda mais gratificantes. Começa-se a falar de salário mínimo, parece-me uma coisa boa, mas quando falaremos de salários máximos? Ambos devem encontrar um lugar dentro de uma perspectiva de igualdade.

 

Igualdade entre a geração atual e as gerações futuras. As grandes manifestações dos últimos dias em nível mundial nos dizem isso.

 

Igualdade não é miséria generalizada, mas sim riqueza de vida para todos; não é um achatamento, mas sim uma razoável articulação social.

 

A afirmação da igualdade requer riqueza de pensamento, uma grande variedade de ações e de práticas; por isso, são necessárias mentes refinadas e perspicácia de visão em perspectiva. Trata-se de um trabalho coletivo, de um compromisso geral, de uma fantasia desenfreada. Ela não se afirma totalmente de repente, mas é construída; também é construída a partir dos episódios que a sociedade nos mostra, assumindo a disposição das novas gerações para cuidar do resgate do mundo.

 

A desigualdade é um monstro que está destruindo a nossa e as outras sociedades, está corrompendo espíritos honestos e dá espaço a veleidades autoritárias, enquanto normaliza a violência individual.

 

Pode-se e deve-se abater esse monstro, os homens e as mulheres têm a inteligência para fazer isso, têm a força de pensamento para combatê-lo, estão dispostos e predispostos para essa batalha, mas muitas vezes tateiam na escuridão de uma perspectiva que parece sem saída. Entre as portas a serem abertas, através das quais se possa fazer passar o pensamento e a ação, uma das mais importantes é a da igualdade.

 

Eu não acredito que o canteiro de obras da esquerda reformista pode edificar se não assumir a igualdade como lente para ler a transformação necessária da sociedade. Da mesma forma, os membros dispersos, que talvez não possam ser reunidos, da esquerda radical poderão ter a capacidade de incidir somente se contribuírem, gastando-se com seriedade, com a construção de uma hegemonia cultural da igualdade.

 

- Francesco Indovina é professor italiano.

Il Manifesto, 21 mar 2019

 

Tradução: Moisés Sbardelotto.

 

https://www.alainet.org/pt/articulo/198939

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