Uma pausa na globalização: A retomada do protecionismo
- Opinión
A evolução da política protecionista e antiglobalização da administração Trump não é uma surpresa como frequentemente colocado nos veículos de comunicação, pois a pregação nacionalista e anticomércio internacional foi a tônica da campanha do candidato, e naturalmente deveria ter sido interpretado como algo factível de acontecer.
Ocorre que a lógica da política normalmente repousa na farsa de candidatos, em que promessas eleitorais não se traduzem em ações de governo, de vencedores em pleito majoritário. Em alguns casos o chamado estelionato eleitoral é bem recebido.
De alguma forma, uma espécie de mentira consentida é algo tolerável e aceitável no comportamento de postulantes à Presidência. O que não era esperado era a atitude irracional e errática de um governante, uma vez consolidado o poder no exercício da presidência da maior economia do planeta, ou seja, que a administração de Donald Trump colocasse em pauta e executasse políticas incoerentes e com alto potencial destrutivo na economia global a médio e longo prazo.
Entre os diversos atos e ações implementadas ao longo dos últimos 17 meses, o que tem maior poder de devastação e maior impacto na economia global, sem dúvida, está relacionado à deflagração de tarifas e barreiras aos produtos chineses, em maior número e volume. No total. o governo norte-americano prevê aplicar tarifas em um montante que pode alcançar o valor de US$ 500 bilhões em importações, incidentes, em sua maioria, sobre bens fabricados na China, que vão de painéis solares à geração de energia, a componentes eletrônicos, equipamentos de informática, aço, alumínio, semicondutores, autopeças, inclusive produtos de consumo massificado, tais como luvas de beisebol, roupas, televisores, geladeiras etc.
Até mesmo a Comunidade Europeia foi atingida pela imposição de tarifas sobre a importação de automóveis, além da crescente tensão comercial com o departamento de comércio, em razão das constantes mutações de humor nas relações comerciais.
O nível de questionamento por parte de Trump estendeu-se ao ponto de constrangedora posição do presidente norte-americano, na última reunião da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), na qual, novamente, o representante norte-americano fez exigências adicionais ao países membros, para aumento de gastos e um comprometimento adicional de governos, com compra de armamento e material de defesa, o que sugere que a administração Trump demanda uma espécie de compensação adicional dos países membros, seja na forma de assunção de fatias maiores do orçamento do sistema de proteção do Atlântico Norte, ou simplesmente a compra de material bélico e sistemas de vigilância e proteção de fornecedores norte-americanos, a exemplo das compras realizadas pela Arábia Saudita (US$ 120 bilhões) e Catar (US$ 36 bilhões).
O que há por trás da belicosidade e do comportamento errático de Trump
Os especialistas em comércio internacional, ouvidos pela Bloomberg, Financial Times e The Economist, salientam, em suas opiniões, que, longe de meros artifícios de retórica e populismo, há na política norte-americana, um alto grau de oportunismo, uma espécie de jogo em que as regras são mudadas de forma abrupta a cada lance, de forma a garantir algum mecanismo de apropriação de vantagens.
A tensão crescente imposta pela administração Trump seria uma mensagem ao público interno (eleitores), eleições para a câmara dos deputados e um terço do senado, que implica no reforço da mensagem de defesa intransigente dos interesses norte-americanos, contra as investidas desonestas da China, reforçada pela ingenuidade de antigos governos norte-americanos que foram enrolados pela esperteza do governo de Pequim, ao mesmo tempo em que o povo americano é vítima da preguiça e da incapacidade dos europeus. Na nova ordem mundial, cabe aos Estados Unidos da América um distanciamento de países que, em tese, conspiraram contra a prosperidade do povo americano.
O segundo ponto destacado está associado com a ruptura da globalização, que seria a responsável pela perda de renda e empregos dos norte-americanos pela construção de relações comerciais em que países fizeram uso de meios desonestos e artifícios fraudulentos para a conquista de mercados e ganhos com as vendas aos EUA.
A ordem internacional criada pelas negociações de comercio conduzidas pela OMC (Organização Mundial de Comércio), criada em 1995, teria, segundo a ótica de Trump, sido imposta aos EUA, por artimanhas de países maliciosos, sendo a principal responsável pela situação de fragilidade da economia americana.
As consequências imediatas da postura norte-americana é a criação de um perigoso mecanismo de diminuição do fluxo de comércio internacional, que já vem sofrendo decréscimo ao longo dos últimos 16 meses, e, por consequência, condições para a perda de produtividade total dos fatores de produção, com impactos sobre a taxa de crescimento da economia global e efeitos sobre a alocação de investimento, tudo por conta da expectativa de que o desenrolar de tal “guerra comercial” possa acabar produzindo efeitos adicionais de desvalorização na taxa de câmbio de países emergentes e na própria China, o que poderia vir a desencadear uma eventual fuga de capitais nesses países, e, por consequente, um realinhamento na estrutura a termo das taxas de juros praticadas, seja pelo aumento nas taxas longas dos títulos do tesouro americano, seja pela equalização das taxas em mercados globalizados.
O primeiro efeito esperado de tal cenário seria uma queda na taxa de crescimento da China, e, pelo elevado fluxo de comércio de tal país, haveria a contaminação de diversos países emergentes em especial os fornecedores de comodities.
Ocorre que, dada a característica mutante da administração Trump, alguns especialistas acreditam que, no fundo, o governo norte-americano esteja agindo como um participante de um grande programa de “reality show”, e que esteja utilizando máscaras e blefes para um eventual desfecho favorável por conta da desistência ou exclusão de alguns membros do jogo.
Em semanas teremos condições de diagnosticar melhor o quadro e refletir sobre os impactos e efeitos sobre o Brasil.
- Renê Garcia Jr., Jornal do Brasil
17/07/2018
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