….e se der em guerra?

24/04/2017
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Os povos de todo o mundo já se cansaram da infindável troca de ameaças tenebrosas entre EUA e Coreia do Norte.

 

As dúvidas de que sejam para valer crescem até mesmo entre os líderes vociferantes dos dois países.

 

Talvez por perceberem que falam em vão, eles passaram a sublinhar suas palavras com ações de maior carga de intimidação.

 

Os EUA, para mostrar que não estão brincando, enviam para os mares da costa da Coreia do Norte uma frota, liderada por um porta-aviões nuclear, com um submarino capaz de aniquilar 24 cidades ao mesmo tempo.

 

E Trump ruge, garantindo que tomará um teste balístico ou nuclear como provocação.

 

Enquanto o radical-religioso, o vice-presidente Mike Pence, aconselha Kim Dong-nu a “não testar a determinação de Trump.”

 

Mas o ditador testa.

 

Lança um míssil que, (talvez felizmente) falha.

 

A entourage de Trump nem tem tempo para brindar o fracasso alheio pois uma estrondosa parada militar sacode Pyongyang, num show de força, no qual as estrelas são novos projéteis balísticos de monstruosas dimensões. Eles teriam fôlego para atravessar todo o Oceano Pacífico e reduzir Los Angeles e até New York a cinzas (inclusive a Trump Tower), segundo juram os líderes da nação comunista.

 

Mas não enganam os experts americanos, eles sabem que ainda faltas anos para os corte-coreanos terem mísseis de longo alcance.

 

Como nem seus 59 mísseis que fizeram estragos numa base síria, vingando o falso bombardeio químico atribuído a Assad, nem o lançamento da maior bomba não-nuclear do mundo assustaram o chefão de Pyongyang, Trump pensou em novos fantasmas: a instalação na fronteira entre as duas Coreias do mais moderno sistema anti- míssil e o envio de bombas nucleares para o país irmão.

 

As duas medidas, vistas como ameaçadoras e provocativas pela China, podem não acontecer. Trump precisa de Beijing para pressionar a “Coreia do Mal”, que depende do comércio com os chineses e do seu caritativo apoio econômico.

 

No começo, a torrente de bravatas, anunciando uma possível guerra, mesmo nuclear, somando-se à insanidade de Trump e Kim Dong-nu, criaram um clima de temor generalizado.

 

Mas, como os dois arrogantes presidentes não param de se ameaçar pelo tempo a fora, as pessoas começam a acreditar, como o personagem Polônio, de Hamlet, que “há um método nessa loucura. ”

 

Que tudo não passaria de jogo de cena, terminando num deixa disso, com alguma acordo que só adiaria o problema.

 

Acho a ideia um tanto otimista, diante da declaração da Casa Branca de que não iria deixar passar batido um novo teste balístico, e da desafiadora resposta norte-coreana: “vamos acelerar, realizar mais testes de mísseis semanalmente, mensalmente e anualmente. ”

 

Ainda que essas flexões de músculos acabem num conflito, as chance de que seja nuclear, são mínimas.

 

O que naõ quer dizer que não possa acontecer.

 

O escritor e jornalista Eric Margulis visitou as duas Coreias no ano passado e analisou o que aconteceria numa guerra nuclear (UNZ Review, 15 de abril) na península.

 

 “ Os EUA poderiam literalmente explodir a Coreia do Norte do mapa, usando armas nucleares táticas baseadas no Japão, Coreia do Sul e em naves da Sétima Frota ou lançando-as de bombardeiros B-52 e B-1. Isso provocaria nuvens de radiação letal e poeira radiativa que cobririam o Japão, a Coreia do Sul e o altamente industrializado nordeste da China, incluindo a capital, Beijing…e assim 1/3 da economia mundial seria exposta à contaminação nuclear. Sem contar a dispersão de um inverno nuclear por todo o globo.”

 

A menos que um ataque preventivo liquidasse de uma só vez todas as instalações nucleares e armas de destruição em massa da Coreia do Norte, o contra-ataque seria inevitável.

 

O governo de Pyongyange dispõe de mísseis de médio alcance com armas nucleares apontadas para bases dos EUA no Japão (efetivo de 54 mil soldados americanos) e na Coreia do Sul (30 mil soldados americanos).

 

Já a eclosão de uma guerra convencional, embora com poucas chances, não pode ser descartada.

 

Diz Eric Margolis que a aviação e a marinha norte-coreanas são obsoletas e ineficientes. Sumiriam do mapa no primeiro dia de combates.

 

Com o exército norte-coreano a parada seria outra.

 

Ele conta com 1 milhão de soldados, treinados durante 30 anos para resistir a uma invasão americana, além dos 88 mil guerreiros das forças especiais, prontos a realizar ataques suicidas contra o comando político e militar da Coreia do Sul e danificar seriamente bases aéreas americanas e sul-coreanas.

 

O governo Kim Dong-nu tem centenas de canhões de longo alcance e baterias de foguetes enterrados em colinas em frente à zona desmilitarizada da fronteira, capazes de atingir Seul. É bem possível que os norte-coreanos também usem as proibidas armas químicas contra bases aéreas, depósitos de armas, portos e centros de comunicações.

 

Mesmo que forças dos EUA e da Coreia do Sul tomem Pyongyang, os norte-coreanos estão preparados para uma guerra de guerrilhas nas montanhas, que poderia durar décadas.

 

Anos atrás, calculava-se que uma invasão americana da Coreia do Norte custaria cerca de 10 bilhões de dólares, causando baixas de 250 mil soldados.

 

Para Margulis, considerando o fortalecimento militar da Coreia do Norte e a alta da inflação de lá para cá, este valor seria hoje quatro vezes maior.

 

Se decidissem invadir a Coreia do Norte, os EUA teriam de mobilizar suas reservas e reinstituir o recrutamento obrigatório.

 

Mesmo sendo sugerido pela filha número um, Trump hesitaria num lance capaz de despertar as iras das mães da América.

 

A guerra seria um péssimo negócio para os EUA.

 

A solução racional, conversações diplomáticas, sugerida pela China, The Donald já rejeitou: conversações só depois que a Coreia do Norte renunciar a seu programa nuclear.

 

Os EUA temem, e com certa razão, que o ditador norte-coreano possa um dia resolver lançar bombas nucleares contra o território americano.

 

Por isso, como disse o secretário de Estado, Rex Tillerson, um

 

acordo com Pyongyang só em novos termos, ou seja, com novas sanções.

 

Em 2009, a ONU já aplicou sanções à Coreia do Norte, as quais parecem não estar fazendo efeito.

 

Trump exigiu que resolução da ONU, propondo uma solução através do diálogo, terminasse afirmando que o Conselho de Segurança estava preparado para considerar sanções adicionais.

 

Segundo a Reuters, elas devem ser mais duras, incluindo embargo na importação de petróleo, proibição da Korean Airlines funcionar em todo o mundo, interceptação de navios coreanos e confisco de suas cargas e punição dos bancos chineses que operarem com o governo de Kim Dong-nu.

 

É preciso lembrar que o programa nuclear norte-coreano foi criado exatamente para garantir a segurança do país contra os EUA.

 

O temor do país em relação aos americanos é compreensível.

 

Na guerra da Coréia, em 1950-1953, a aviação americana não deixou de pé um único prédio de mais de um andar na capital, Pyongyang.

 

Foram mortos cerca de dois milhões de coreanos, a maioria da parte norte.

 

Possuir armas nucleares é visto pela Coreia do Norte como a forma de se garantir contra possíveis (ou prováveis) ataques americanos.

 

Para tranquilizar o governo local, seria necessário um tratado de paz entre Estados Unidos e as duas Coreias, já que a guerra de 1950-1953 não acabou, existe apenas um simples armistício.

 

Mas esse tratado não seria suficiente, segundo John Feffer, diretor do Foreign Policy in Focus.

 

Ele acha que para se sentirem seguros, os líderes norte-coreanos querem receber investimentos para reconstruir sua economia e fazer as necessárias reformas; um relacionamento normal com a economia global e o mercado financeiro.

 

Em suma, não mais serem párias, mas países integrados na comunidade internacional, com direito à proteção das leis internacionais.

 

Para Feffer, a Coreia do Norte poderia concordar em desativar aos poucos seu programa nuclear, à medida que os EUA e aliados fossem atendendo às suas exigências.

 

Se EUA e Coreia do Sul, de um lado, e Coreia do Norte, do outro, concordarem com as reivindicações recíprocas, tudo poderá acabar num happy end.

 

Ou não.

 

Talvez seja demais esperar bom senso de figuras como Donald Trump e Kim Dong-nu.

 

- Luiz Eça formou-se em Direito pela Universidade de São Paulo.

 

22 / 04 / 17

http://www.olharomundo.com.br/e-se-der-em-guerra/

 

https://www.alainet.org/pt/articulo/184992
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