A praça é do povo...

22/10/2011
  • Español
  • English
  • Français
  • Deutsch
  • Português
  • Opinión
-A +A
Há algo de novo, e não de  podre, no reino da Dinamarca! Verdade que provocado pelo cheiro de podridão.  Como suportar o odor fétido de uma Câmara dos Deputados que absolve uma  deputada flagrada e filmada recebendo bolada de dinheiro  escuso?

 A 12 de outubro, manifestantes foram às ruas do Brasil, e  de 1.242 cidades dos EUA, emitir protestos cívicos. Aqui, 30 mil pessoas, a  maioria em Brasília, exigiram o fim do voto secreto no Congresso Nacional; o  direito de o Conselho Nacional de Justiça investigar e punir juízes corruptos;  a vigência da Ficha Limpa nas eleições de 2012; e o fim da corrupção na  administração pública.

 A novidade é que, tanto aqui como nos EUA,  as mobilizações foram convocadas por redes sociais. Uma ação espontânea, sem  partidos e líderes carismáticos, e que, no mínimo, mereceria o apoio da UNE,  da CUT e dos partidos ditos progressistas.

 Nos EUA, cresce o  movimento Ocupem Wall Street. Ali se situa o centro financeiro  estadunidense, protegido pela exuberante estátua do touro que bem simboliza a  ganância e a prepotência do capital financeiro.

 Semana passada,  mais de 1.000 manifestantes foram presos nos EUA, desmascarando a propalada  liberdade de expressão da democracia capitalista. Liberdade, sim, de  especulação feita por aqueles que Roosevelt qualificou de “monarquia  econômica”.

 A elite usamericana entrou em pânico, embora as  manifestações sejam bem mais pacíficas e ordeiras que as do Tea Party (extrema  direita) em 2009. O deputado republicano Eric Cantor chamou os manifestantes  de “gangues”. Mitt Rommey, pré-candidato republicano em 2012, acusou-os de  provocar uma “luta de classes”...

 O fato é que o poder público,  aqui, e o poder econômico, lá, estão prensados contra a parede. E agora o  movimento se expande pelos países da Europa diretamente afetados pela crise  financeira e mais interessados em salvar bancos que empregos.

 A  avareza dos magnatas ianques é tamanha que acusam Obama de “socialista” pelo  simples fato dele apoiar a regra Volcker, que proíbe bancos, beneficiados com  ajuda governamental, de praticarem especulação.

 Bush aprovou (e  Obama ainda não revogou) a redução de US$ 5 bilhões no montante de impostos  pagos pela minoria que ganha mais de US$ 250 mil por ano (cerca de R$ 420  mil). “Taxem os ricos!”, diziam os protestos do Ocupem Wall Street.  

 Desde janeiro de 2008, o setor financeiro de Nova York fechou 22  mil postos de trabalho. E mais 10 mil estão previstos. O banco Goldman Sachs  despediu 1.000 funcionários e o Bank of America, 30 mil.

 São  consideradas “muito ricas” nos EUA apenas 31 milhões de pessoas, o que  equivale a 1% da população. E todo o sistema de governo mais protege essa  minoria do que os outros 99%. No Brasil, os muito ricos são 3  milhões.

 O Brasil está sob ameaça da crise financeira. Nossas  exportações, em especial soja e minério de ferro, dependem muito da China. Por  sua vez, 41,5% das exportações chinesas são consumidas pelos EUA e a União  Europeia. Se estes dois blocos reduzirem suas importações, o sinal vermelho  acende na China. Ela cresceu 10,3% ano passado e, este ano, não deve ir além  de 8,7%, caindo para 8,2% em 2012. O que pode afetar as exportações  brasileiras e trazer de volta, junto com o dragão da inflação, o desemprego.  

 Todas essas manifestações de rua são positivas, porém  insuficientes. Não basta protestar. É preciso propor – uma nova ordem  econômica, um novo projeto político, um outro mundo possível...  

 Outro risco implícito às atuais manifestações é confundir  apartidarismo com repúdio a partidos. Estes são imprescindíveis para manter ou  transformar o atual estado de coisas. E, ano que vem, teremos eleições  municipais. Com o Ficha Limpa vigente, saberemos em quem não votar. Mas  é preciso ter clareza em quem votar, livre das promessas vãs e da demagogia  televisiva.

 É hora de iniciar o debate de valores e critérios  para a escolha de vereadores e prefeitos. Caso contrário, tudo ficará como  dantes no quartel de Abrantes.

- Frei Betto é escritor,  autor de “Calendário do Poder” (Rocco), entre outros  livros. http://www.freibetto.org/>    twitter:@freibetto.

Copyright 2011 – FREI BETTO – Não é permitida a reprodução deste artigo em qualquer  meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização do autor. Assine todos os artigos do escritor e os receberá diretamente em seu e-mail. Contato – MHPAL – Agência Literária (mhpal@terra.com.br)
 
https://www.alainet.org/pt/articulo/153487
Subscrever America Latina en Movimiento - RSS