Declaração da Sociedade Latino-Americana de Economia Política e Pensamento Crítico frente à crise Econômica Mundial

Salvar os Povos, não os Bancos

28/10/2008
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Vivemos uma crise estrutural do sistema capitalista. Não é hora de acreditar em seu salvamento, mas sim de trabalhar pela sua transformação. Os povos latino-americanos viram-se obrigados, mais de uma vez, a socorrer os banqueiros à custa de seu sofrimento. É hora de mudar a história e não repetir o resgate dos financistas. Nossa prioridade são as necessidades populares.

A crise econômica derivada da financeira e que está em curso (andamento) nestes dias pode prolongar-se por muito tempo. Não é possível estabelecer, com seriedade, o tempo em que ela se manterá e a forma de seu desenvolvimento, mas o que se pode dizer é que ela é a mais grave e mais profunda desde 1929/30, e que se propaga a uma velocidade muito maior que aquela por possuir um caráter totalmente global.

Há que ser dito, ainda, que a crise econômico-financeira atual ocorre dentro de um contexto de múltiplas outras crises, como a dos alimentos, das matérias-primas, da energia, do ambiente e, também, de uma crise militar em que não se descarta o uso de armas de destruição em massa.

A economia norte-americana, em razão das suas três dívidas (privada, pública e com o exterior) encontra-se em risco de forte instabilidade. Sua hegemonia econômica está debilitada e questionada. Sua hegemonia geoestratégica sobrevive, ainda que tenha sofrido reveses significativos. Pelas mesmas razões, o momento atual é particularmente perigoso para toda a humanidade, já que os EUA não renunciam à hegemonia e ao domínio unipolar nos diferentes campos. Esse país tenta, inclusive, manter sua hegemonia ideológica e cultural que, sem dúvida, se vê afetada pelas contradições que surgem da mesma crise a nível interno e com seus aliados.

A partir da crise, se intensificará a contradição antagônica com o capitalismo à escala global. Abre-se um extenso período de convulsão cujos resultados estão abertos. As classes dominantes tentarão reconstruir o sistema com maiores níveis de exploração dos trabalhadores, e estes deverão fortalecer suas organizações para enfrentar essa agressão. A América Latina foi o subcontinente que maior resistência opôs ao neoliberalismo, cenário também de grandes rebeliões populares. As experiências sociais e políticas acumuladas em alguns de nossos países podem marcar um caminho na articulação dessa resposta necessária.

Os governos neoliberais e social-liberais de nossa região, mesmo os ditos “progressistas”, manterão sua crença na lógica do capital e sua intervenção buscará preservar o funcionamento do mercado capitalista e o domínio das empresas transnacionais que ocupam nossos territórios. Permitirão a quebra de uma ou outra grande empresa especulativa ou produtiva, mas intervirão imediatamente naquelas que possam pôr em risco a lógica do capital no âmbito de seu país. Isso significa que seguirão permitindo e ainda promovendo a voracidade do lucro exigido pelos mencionados capitais. A crise fiscal do Estado aprofundar-se-á, reduzindo o investimento público, o gasto social e os subsídios.

Tais políticas incrementarão ainda mais o desemprego, a precariedade do trabalho, a redução de salários e pensões, o que aumentará a pobreza, a miséria e a exclusão social.

No entanto, na América Latina, há governos que, sem necessariamente promover uma ruptura completa com o sistema do capital, tentam encontrar uma política capaz de enfrentar de maneira distinta as inevitáveis conseqüências da crise mundial em seus países.

Em qualquer dessas circunstâncias, os trabalhadores e os movimentos sociais devem conquistar e preservar sua independência frente aos Estados e lutar decididamente contra as políticas antipopulares que pretendem transferir os custos da crise do capital ao trabalho e dos países centrais aos periféricos.

Por isso, necessitamos definir uma pauta de política econômico-social dentro de uma estratégia de sobrevivência e resistência dos setores populares, em particular dos trabalhadores, para o difícil período que se aproxima, acompanhada de uma ofensiva ideológica contra o sistema capitalista que mostra, com esta crise, sua absoluta incapacidade para atender às necessidades de nossos povos.

Propomos, então, este conjunto de medidas de política econômica:

1. É urgente e indispensável a custódia dos bancos privados que, dependendo de cada país, pode ser por controle, intervenção ou nacionalização sem indenização, seguindo o princípio de não estatizar dívidas privadas nem voltar a transferir seus ativos a mãos privadas.
2. Controle e bloqueio da saída de capitais, evitando sua fuga.
3. Centralização e controle cambial, com política de câmbios múltiplos e diferenciados.
4. Moratória e imediata auditoria da dívida pública, liberando recursos para atender às necessidades sociais.
5. Controle de preços dos produtos básicos.
6. Manutenção e recuperação dos salários reais dos trabalhadores, associado a uma política de tributação progressiva que afete o capital, sobretudo a especulação.
7. Políticas de proteção e incentivo ao mercado interno e às atividades econômicas com alta geração de emprego. Para esse fim o investimento público desempenha um papel fundamental.
8. Seguro-desemprego e políticas de proteção social aos trabalhadores desempregados e informais.
9. Reestatização das empresas estratégicas. Nacionalização das grandes empresas privadas em processo de quebra. Recuperação do controle nacional dos recursos naturais.
10. Uma integração regional que atenda aos interesses de nossos povos e não aos do capital.

Tais medidas imediatas constituem uma resposta ao drama social que a crise impõe e iniciarão transformações que, para realizarem-se plenamente, exigem avançar na direção de um horizonte socialista.

Salvar os povos, não os bancos, esse é o objetivo da Sociedade Latino-americana de Economia Política y Pensamento Critico frente à crise e suas conseqüências sociais.


Buenos Aires, 23 de outubro de 2008.

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https://www.alainet.org/pt/articulo/130559
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