Não queremos mártires
29/08/2002
- Opinión
Na véspera do Natal de 1988 no Acre, Chico Mendes foi vítima da sanha dos
inimigos da natureza e da humanidade. Foi assassinado com cinco balas.
Deixou a vida amazônica para entrar na história universal e no
inconsciente coletivo dos que amam nosso Planeta vivo e sua imensa
biodiversidade. Homem marcado para morrer, recebeu proteção mínima por
parte das autoridades oficiais. Agora nos confrontamos com outro
homem marcado para morrer: o governador Jorge Viana do mesmo Acre de
Chico Mendes. Então, era o latifúndio selvagem que ameaçava. Agora, soma-
se o crime organizado e o narcotráfico. Armou-se uma artimanha político-
judicial-criminal para viabilizar o crime, já há muito denunciado.
O primeiro passo foi buscar sua eliminação política do governador. Criou-
se o pretexto de crime eleitoral. E vejam que crime: ostentar uma
miniatura de castanheira, árvore soberba da selva acreana, símbolo de seu
governo e da florestania, vale dizer, da cidadania do homem na floresta,
extraindo benefícios dela sem depredar sua esplêndida riqueza. E não
bastou àqueles juizes cassar-lhe a candidatura. Sua vontade eliminatória
se excedeu a ponto de pretender torná-lo inelegível por três anos.
Agora o caminho está aberto para o esquema criminoso vicejar como antes,
na proximidade do poder, especialmente com o apoio do deputado cassado
Hildebrando Pascoal, Al Capone de fundo de mato, conhecido por mandar
serrar à motossera seus desafetos e que da prisão controla o crime
organizado no estado.
Se não conseguirem a eliminação política partirão, certamente, para a
eliminação física de Jorge Viana E não se imagine que a mente criminosa
sinta qualquer constrangimento diante da opinião pública, do poder
oficial ou de eventuais esquemas de segurança à pessoa do governador. A
história do crime no Acre e em outros estados revela ousadia assassina.
Os criminosos contam com a cumplicidade dos setores políticos
interessados: perpretam a desgraça e somem incólumes. E se presos, estão
seguros da fuga acobertada e fácil.
A nação brasileira não pode aceitar essa lógica de facínoras. O Estado
existe para impedir que lobos prevaleçam. Temos o direito de exigir o
direito do direito. Que se faça auditoria na justiça local para
identificar possíveis conluios com o crime e não se exclua uma
intervenção federal. Sobre o solo brasileiro, no campo e nas cidades, já
corre sangue demais. Não queremos mártires para a exaltação da
posteridade. Queremos vivas pessoas como Jorge Viana que, de peito
aberto, armado só com a lei e a fé libertadora, enfrentou o crime
organizado em seu próprio arraial, enviando mais de 20 criminosos para
prisão.
Meu irmão Jorge, prossiga na construção da política como cuidado para com
o povo acreano. A jovialidade que você irradia já criou uma aura
benfazeja em todo o estado. Confiemos na Justiça. Mas façamos nossas as
palavras do salmista: "Digna-te, ó Deus, libertar o Jorge! Apressa-te,
Senhor, em socorrê-lo! Sejam humilhados e cobertos de vergonha os que
atentam contra a sua vida. Recuem, cobertos de opróprio, os que lhe
desejam a desgraça" (Salmo 70,2-3).
Leonardo Boff es Teólogo
https://www.alainet.org/pt/articulo/106318
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