O mundo pode ficar mais verde se metade da Terra for para a natureza

16/12/2020
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O mundo está ficando menos verde
Foto: NASA
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A floresta precede os povos. E o deserto os segue”

François-René Chateaubriand (1768-1848)

 

As florestas estão desaparecendo no mundo. Havia 6 trilhões de árvores no passado. Mas a humanidade destruiu a metade das florestas desde o crescimento exponencial da população e da economia.

 

A população mundial passou de 1 bilhão em 1800 para quase 8 bilhões de habitantes em 2020, enquanto o número de árvores no mundo caiu de 6 trilhões para 3 trilhões de unidades, segundo o estudo de Bastin et. al. (05/07/2019). Mas o pior é que os seres humanos estão destruindo 15 bilhões de árvores por ano, enquanto o aparecimento de novas unidades e o reflorestamento é de somente 5 bilhões. Ou seja, o Planeta está perdendo 10 bilhões de árvores por ano e pode eliminar todo o estoque de 3 trilhões de árvores em 300 anos.

 

Mesmo assim, o mundo estava ficando mais verde em função das áreas cultivadas. Estudo publicado na revista Science Advances aponta para observações de satélite que revelaram a expansão da vegetação em todo o mundo durante grande parte das décadas de 1980 e 1990. Mas desde então, a tendência parou. Assim, o mundo está gradualmente se tornando menos verde. O crescimento das plantas está diminuindo em todo o planeta e novas pesquisas relacionam o fenômeno à diminuição da umidade do ar – uma consequência das mudanças climáticas.

 

Artigo de Chelsea Harvey, publicado na revista Scientific American (15/08/2019) mostra que os registros climáticos sugerem que as quedas estão associadas a uma métrica conhecida como déficit de pressão de vapor – que é a diferença entre a quantidade de umidade que o ar realmente retém e a quantidade máxima de umidade que ele poderia reter. Um déficit alto às vezes é chamado de seca atmosférica. Desde o final da década de 1990, mais da metade das paisagens com vegetação do mundo experimentaram um déficit crescente, ou padrão de secagem. Os modelos climáticos indicam que o déficit de pressão de vapor provavelmente continuará aumentando à medida que o mundo aquece – um padrão que “pode ter um impacto substancialmente negativo na vegetação”.

 

Isso não quer dizer que cada canto da Terra está perdendo sua vegetação. Alguns estudos recentes revelaram que partes do Ártico estão ficando verdes à medida que a paisagem fria esquenta. E o crescimento das plantas ainda está acontecendo em algumas regiões do mundo também. Mas em uma escala global, na média planetária, a tendência do verde está apontando para baixo. O crescimento demoeconômico é responsável pelo decrescimento do verde e da biodiversidade.

 

Ou seja, enquanto crescem a população e a economia, diminuem as áreas florestais e o habitat de vida selvagem. O mundo vive a ameaça de 6ª extinção em massa das espécies e o relatório de 2019 da Plataforma Intergovernamental para Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IPBES, na sigla em inglês), mostrou que mais de 1 milhão de espécies estão realmente ameaçadas de extinção (BBC, 23/11/2020).

 

Isso não é apenas uma má notícia para a vida selvagem, mas é ruim também para a humanidade. Sem as diversas espécies de pássaros, répteis, mamíferos e as terras que habitam, o ser humano pode perder os ecossistemas que regulam nosso clima, nos fornecem uma proteção para prevenir pandemias, fornecem recursos naturais vitais e mantêm o ar e a água limpos.

 

Em entrevista à revista Grist (21/10/2020), Eric Dinerstein, cientista da vida selvagem e diretor da organização de pesquisa Resolve, diz que a solução é proteger os ecossistemas reservando 50% do Planeta para a vida selvagem. Dinerstein e colegas identificaram as áreas de terra exatas que precisam ser protegidas para evitar o colapso do clima e estimaram o armazenamento potencial de carbono para cada região. O aplicativo Global Safety Net apresenta um mapa interativo dessas áreas, feito em parceria com o Google Earth Engine.

 

Segundo a Rede de Segurança, felizmente, cerca de 50% da superfície da Terra ainda é considerada intacta, semi-intacta ou ligeiramente degradada – o que significa que a terra perdeu parte, mas não toda a sua saúde e produtividade. Portanto, há terra suficiente que não se sobrepõe às populações humanas disponíveis para preservação. Cerca de 15% das terras da Terra já estão protegidas. Outros 12% das terras são habitadas por povos indígenas, que são especialistas em biodiversidade. Se lhes dermos oficialmente a posse da terra e honrarmos seu direito de administrar esses ecossistemas – e em seu poder de decisão, eles nos permitirem designar essa terra como parte da Rede de Segurança Global. Então o total de regiões protegidas atingiria 27%. Dinerstein diz que tudo o que precisamos fazer é separar outros 23%. Basta olhar para covid-19 e como o comportamento da sociedade pode mudar rapidamente, se necessário. Precisamos apenas reconhecer que temos que tomar certas medidas para conservar nossa espécie e conservar nossa saúde pública.

 

Desta forma, plantar árvores e restaurar a vida selvagem é não só um dever ético, mas também uma tábua de salvação para a própria humanidade. Mas de nada adianta plantar árvores se o ser humano continuar na sua marcha louca e insensata para colocar mais gente no mundo e gente que vai aumentar o consumo de água, alimentos, moradia, transporte, lazer e que vai pressionar a Pegada Ecológica bem acima dos limites da Biocapacidade do Planeta.

 

Como disse Kenneth Boulding: “um crescimento infinito é incompatível com um mundo finito”. Reservar metade do Planeta para a natureza é uma forma de evitar o ecocídio e o suicídio civilizacional.

 

- José Eustáquio Diniz Alves é Colunista do EcoDebate. Doutor em demografia, link do CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/2003298427606382

 

Referências:

 

ALVES, JED. Mais árvores e menos gente, Ecodebate, 02/10/2019

https://www.ecodebate.com.br/2019/10/02/mais-arvores-e-menos-gente-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/

ALVES, JED. ‘Half-Earth’: reservar metade da Terra para a natureza, Ecodebate, 08/06/2018

https://www.ecodebate.com.br/2018/06/08/half-earth-reservar-metade-da-terra-para-a-natureza-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/

Jean-François Bastin et. al. The global tree restoration potential, Science, Vol. 365, Issue 6448, pp. 76-79, 05 Jul 2019: https://science.sciencemag.org/content/365/6448/76

Chelsea Harvey. Earth Stopped Getting Greener 20 Years Ago, Scientific American, 15/08/2019

https://www.scientificamerican.com/article/earth-stopped-getting-greener-20-years-ago/?fbclid=IwAR3h99JI_x2Ne_fk0QlKmB27gfW3W112oTDHYKEt_Vi-APP_8MVihiGKUl4

Brianna Baker. The cheapest climate solution? Return half of the planet to nature, Grist, 21/10/2020 https://grist.org/fix/the-cheapest-climate-solution-return-half-of-the-planet-to-nature-this-scientist-says/

Jim Robbins. O plano para transformar metade do mundo em reserva ambiental, BBC Future/Yale e360, 23/11/2020 https://www.bbc.com/portuguese/vert-fut-54841832

 

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 15/12/2020

https://www.ecodebate.com.br/2020/12/16/o-mundo-pode-ficar-mais-verde-se-metade-da-terra-for-para-a-natureza/

 

 

https://www.alainet.org/pt/articulo/210216?language=es
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