Juristas internacionais pedem que STF garanta liberdade e direitos de Lula
- Declaración
Juristas e advogados europeus e latino-americano escreveram uma carta enviada à presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, argumento que as irregulardidades no processo contra o ex-presidente Lula ultrapassam as próprias garantias brasileiras.
São dez juristas que pedem que a liberdade de Lula seja respeitada "com rigor e independência", apontando "o caráter precipitado, desleal e parcial do processo que determinou a reclusão do Senhor Luiz Inácio Lula da Silva, acontecido em uma temporalidade inédita, comparativamente à tramitação de processos do mesmo tipo material e forma".
"Fazemos um apelo (...) para garantir - e sabemos que isso também é uma exigência de sua formação - o respeito a todos os princípios que regem o Estado de Direito Democrático, no marco do exame do processo relativo ao Senhor Luiz Inácio Lula da Silva", apontam. Assinam o documento os juristas Baltasar Garzon, da Espanha, Luigi Ferrajoli, da Itália, e William Bourdon, da França, Emilio García, presidente da Fundação Sul Argentina, e o presidente de honra da Liga de Direitos Humanos (LDH), Henri Leclerc.
Entre as irregularidades, os especialistas em Direito Internacional expõem as graves ocorrências dos grampos telefônicos autorizados pelo juiz da primeira instância, Sérgio Moro, a anulação do Habeas Corpus determinado pelo desembargador plantonista do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Rogério Favreto, entre outros pontos.
Também manifestaram a preocupação com as "graves afrontas aos direitos de defesa" e a pressão "midiática muito forte, alimentada pelo jogo de ambições pessoais". "(...) Tal postura visa preservar esse processo de todas as estratégias que o adaptariam a servir quaisquer tipo de ambições políticas fora dos marcos da legalidade", continuam.
Além de Cármen Lúcia, os juristas internacionais encaminharam cópia da carta ao presidente da França, Emmanuel Macron, ao presidente de governo da Espanha, Pedro Sánchez, ao primeiro-ministro de Portugal, Antonio Costa, e aos dez ministros do STF, além do atual presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luiz Fux.
Leia, abaixo, a íntegra da carta:
Supremo Tribunal Federal
A atenção da Excelentíssima Senhora Cármen Lúcia, Presidenta do STF
Paris, 9 de Agosto de 2018
Luiz Inácio Lula da Silva
Excelência,
Temos a honra de lhe escrever – juristas de culturas e de países diversos- para transmitir-lhe nossa preocupação frente ao que nos parece serem irregularidades sérias, que afetam o Inquérito Policial e o Processo Judicial, que conduziram a recente condenação do Senhor Luiz Inácio Lula da Silva, a uma pena de doze anos e um mês de prisão. Mais recentemente nossa preocupação foi acrescida dos entraves que nos parece terem sido criados para evitar a sua libertação.
Esta correspondência é enviada a Vossa Excelência, após termos formado nossa convicção com base em diversas fontes, devidamente checadas, que nos permitiram confirmar as informações aqui constantes.
Os fatos são os seguintes:
- A divulgação pela imprensa, originária do Senhor Juiz Sergio Moro, de elementos do referido Inquérito, como por exemplo a gravação de uma conversa telefônica entre a Senhora Dilma Rousseff, então Presidenta da República, e o Senhor Luiz Inácio Lula da Silva ;
- As condições criticáveis pelas quais foi anulada, após a apresentação de um “habeas corpus”, a decisão do Senhor Desembargador Rogério Favreto, do TRF 4, que decidiu pela libertação do Senhor Luiz Inácio Lula da Silva . Compreendemos que a anulação daquela ordem foi consequência de uma intervenção ilegal e fora de qualquer marco processual, partida do Senhor Juiz Sergio Moro.
- O caráter precipitado, desleal e parcial do processo, que determinou a reclusão do Senhor Luiz Inácio Lula da Silva, acontecido numa temporalidade inédita, comparativamente à tramitação de processos do mesmo tipo material e formal, no Brasil.
Gostaríamos de lhe transmitir a nossa preocupação, também após ter consultado diversas fontes, sobre aos graves prejuízos ao direito da defesa do Senhor Luiz Inácio Lula da Silva, ilustrados em particular pela interceptação telefônica dos seus advogados, fato que deixa no ar dúvidas consistentes sobre o caráter isento do referido processo.
Entendemos que estas irregularidades e anomalias, Excelência, não são alheias a uma pressão midiática muito forte, alimentada pelo jogo de ambições corporativas e pessoais.
Não somos os únicos a pensar que o Brasil tem responsabilidades importantes, em função do lugar essencial que ocupa na comunidade internacional. Parece-nos, portanto, ainda mais legitimo expressar estas preocupações no momento em que o mundo passa por um período perturbado e caótico, que pode tornar-se extremamente perigoso.
O objetivo das pessoas que assinam este documento não é de se pronunciar sobre a inocência ou a culpabilidade do Senhor Luiz Inácio Lula da Silva, mas de manifestar a nossa total consideração -como Vossa Excelência a tem- com o respeito aos direitos fundamentais consagrados na Constituição do país, respeito às suas leis e aos seus compromissos internacionais. Tudo isso nos faz compartilhar com Vossa Excelência a preocupação frente a estas irregularidades, que entendemos muito graves.
A situação mundial e a importância do Brasil reforça nossa vontade de defender, portanto, o respeito pleno ao principio da legalidade, com rigor e com independência.
Fazemos um apelo a sua alta consciência de Magistrada mais eminente do Brasil, para garantir -e sabemos que isso também é uma exigência de sua formação- o respeito a todos os princípios que regem o Estado de Direito Democrático, no marco do exame do processo relativo ao Senhor Luiz Inácio Lula da Silva. Tal postura visa preservar esse processo de todas as estratégias que o adaptariam a servir quaisquer tipo de ambições politicas fora dos marcos da legalidade.
Ficaríamos muito honrados de encontrá-la, se Vossa Excelência tivesse disposição de nos receber. Enviamos a Vossa Excelência a expressão da nossa consideração mais distinguida.
William Bourdon
Advogado licenciado em Paris e Presidente fundador da Associação de Defesa das Vítimas de Crimes Econômicos (Sherfa)
Mireille Delmas-Marty
Jurista, Professora emerita no Collège de France, membro da Academia das Ciências morais e políticas
Luigi Ferrajoli
Jurista emérito da Universidade Roma 3
Juan Garces
Doutor, Advogado licenciado em Madrid, prêmio Nobel alternativo 1999
Emílio Garcia Mendes
Jurista, Professor de psicologia da Universidade de Buenos Aires, presidente fundador Sur Argentina
Baltasar Garzón
Advogado licenciado em Madrid, Jurista espanhol, que mandou prender o ditador do Chile Augusto Pinochet em 1998
Louis Joinet
Magistrado e ex-presidente do Grupo de Trabalho sobre Detenção Arbitrária e da Comissão de Direitos Humanos da ONU
Wolfgang Kaleck
Advogado licenciado em Berlim e secretário-geral do Centro Europeu pelos direitos Constitucionais e Direitos Humanos (ECCHR)
Henri Leclerc
Advogado licenciado em Paris, Presidente honorario da Liga dos Direitos Humanos (LDH)
Jean-Pierre Mignard
Advogado licenciado em Paris
A presente carta é enviada simultaneamente em cópia aos dez membros do STF, assim como ao Presidente do Tribunal Superior Eleitoral.
10/08/2018
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