‘A cada pessoa do MST que encontro, peço perdão pelo o que eu pensava deles’

30/04/2018
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Uma cozinha coletiva foi instalada na casa de Regiane
Foto: Guilherme Santos/Sul21
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“Tudo começou com uma barraca. Estavam todos ali na rua quando veio a ordem para eles saírem. Aí veio a primeira pedindo pra ficar. Depois veio mais outra e assim por diante. Quando eu vi veio a cozinha e depois veio todo esse povo que vocês estão vendo aí”. Foi assim que Regiane do Carmo Santos, moradora nas imediações da Superintendência da Polícia Federal em Curitiba, abriu os portões da casa dela para abrigar manifestantes que vieram participar das vigílias em defesa da libertação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A decisão provocou uma reviravolta na vida de Regiane, uma reviravolta que ela define como um aprendizado. “Eu adoro ver a casa cheia. Fico triste quando tem pouca gente aqui. É muito aprendizado, a cada dia eu aprendo um pouquinho e estou me politizando, o que é mais importante”.

 

Indagada sobre o teor desse aprendizado, ela cita como exemplo a superação de preconceitos. “Você vê a luta, a causa e o sofrimento desse povo, do pessoal do MST, do PT e de tantos outros que estão aqui. Cada pessoa do MST que encontro, eu peço perdão pelo o que eu pensava deles. Eu ia pelo que a mídia falava. Eles são as pessoas que mais têm a ensinar pra gente”. Ela reconhece que tinha uma visão preconceituosa em relação aos sem terra. E descreve como se deu o processo de superação desse preconceito:

 

“Eu não nego, não sou hipócrita. Quando todo esse povo começou a chegar aqui, os vizinhos começaram a dizer que iriam invadir as casas, isso e aquilo. Se eu não tivesse me jogado pra conhecer e conversar, estaria pensando como eles. Se cada pessoa se desse a chance de conversar e conhecer, aprenderia em primeiro lugar o humanismo e o respeito que eles têm entre eles, a organização, a divisão do trabalho. Quando eles varriam a rua, não sobrava uma bituca de cigarro. É lindo, uma lição de como é um ser humano de verdade”.

 

Após a chegada das primeiras barracas, o pátio da casa de Regiane passou a abrigar também uma cozinha coletiva, que funciona todo o dia. Ela faz questão de destacar que não é a doadora desses alimentos. “Esses dias falaram que era a doadora. Não estou doando nada. Nem tenho condições financeiras pra fazer alimentação pra mil pessoas. Isso aqui é fruto da união do povo. Onze e meia, meia noite está encostando carro aqui pra trazer doações. Sem essa união, não teria como fornecer café da manhã e almoço para todo esse povo. Todo mundo que chegar vai comer. Ninguém vai sair com fome daqui. Eu estou muito feliz. Quero que o Lula saia, mas vou ficar triste depois que esse pessoal for embora. Você acredita nisso?”.

 

Dona Regiane não se incomoda com o que os vizinhos possam estar pensando da decisão dela. “Pra mim, não me acrescenta, nem diminui nada. Ninguém paga as minhas contas e ninguém vem perguntar como estou. Se quiserem falar comigo, falem, se não quiserem, não falem. Pra mim é indiferente. Eu posso gostar do vermelho. Eu sou dona da minha escolha, sou maior de idade e tenho o direito de fazer aquilo que eu quero e o que acho que é certo”.

 

Na manhã desta segunda-feira (30), mais uma vez o pátio em frente à sua casa estava tomado por manifestantes que participaram da abertura de mais um dia de vigília com o já tradicional ato de “bom dia, presidente Lula”. Centenas de pessoas participaram da manifestação e os gritos de bom dia, com o apoio de um megafone, ecoaram fortes pela vizinhança. Enquanto isso, na cozinha coletiva improvisada na casa de Regiane, as cozinheiras do MST começavam a descascar o aipim, preparar o feijão e lavar a salada para mais um dia de vigília. A dona da casa circulava entre elas como se fosse mais uma militante de uma causa que acabou de descobrir.

 

Abril 30, 2018

https://www.sul21.com.br/ultimas-noticias/politica/2018/04/413279/

 

https://www.alainet.org/pt/articulo/192573?language=en
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