Um furacão de experiência
- Opinión
Quando alguém te propõe uma viagem de trabalho em geral é uma linda experiência, mas se à
proposta se soma que o objetivo é cobrir a passagem de um furacão com o
prognóstico de alcançar intensidade 4 – de 5 – na escala Saffer-Simpson, sendo o
mais forte a atingir a região na última década, a experiência se supõe
única.
Na Argentina, meu país de origem, nunca sofremos fenômenos climáticos deste tipo, por isso
foram inevitáveis meus medos; mas não foram razões suficientes para dar uma
resposta negativa. Era um grande desafio que me permitiria viver situações
jamais imaginadas junto ao povo cubano e conhecê-lo, e assim compreendê-los mais
profundamente. Mesmo assim, nesse instante antes de dar a resposta que sem
dúvida marcaria sua vida, passam desordenadamente em teus pensamentos, em
milésimos de segundos pessoas que deixaste distante, situações, projetos; a
resposta não poderia ser outra que sim.
Após arrumar uma pequena bolsa com o indispensável, partimos a bordo de uma “guagua” – como
se chamam aqui os ônibus – com destino a Santiago de Cuba, lugar onde se previa
que Matthews atacaria. Após 15 horas de viagem passando por vários povoados,
chegamos eu e Héctor, meu companheiro fotógrafo do Resumen , à cidade onde nos
esperavam representantes do Centro de Imprensa Internacional para nos dar as
orientações que facilitariam nosso trabalho nos dias
subsequentes.
Sete anos transcorreram desde a última vez que visitei Santiago e está muito diferente,
mas da mesma forma bonita. Dava pena pensar que novamente um furacão arrasaria
com tudo, como aconteceu com “Sandy” em 2012 e que o Estado destinaria novamente
grandes quantias de investimentos para a reconstrução, fundos que a um país que
sofre um bloqueio criminoso, não é fácil recuperar.
Na manhã de segunda-feira se via poucas pessoas nas ruas e muitos preparativos. Tapumes em
vidros e janelas, reforço de portas, sacos de areia nos tetos, tudo era novidade
para mim. Muitas vezes se lê sobre a organização cubana ante catástrofes deste
tipo, mas vê-la é impactante. Às vezes nos surge a dúvida de como é possível que
em outros países, inclusive desenvolvidos, um fenômeno desse tipo deixe um saldo
de centenas ou milhares de mortos, enquanto em Cuba, um pequeno e pobre país
bloqueado pela maior potência do mundo, isso não aconteça.
No transcurso dos dias que Matthews passou pela ilha, qualquer pessoa podia se informar a
qualquer hora pelo rádio e televisão sobre as orientações da Defesa Civil e as
novidades nas diferentes localidades. Não havia cubano com quem eu falasse que
não me lembrasse que “em Cuba o importante é garantir a vida”, uma das premissas
socialistas fundamentais da Revolução Cubana. E não eram somente palavras.....
Todos os estabelecimentos estatais foram preparados para receber evacuados, brigadas
voluntárias de jovens e adultos para ajudar no que fosse necessário, materiais
colocados com antecedência em localidades próximas para poder atuar rápido
quando o desastre da passagem de Matthews fosse inevitável, médicos para
assistir as pessoas que precisem. E o principal: a evacuação de centenas de
milhares de pessoas que com enorme disciplina se dirigiam aos albergues
determinados, até dentro das montanhas. Tudo estava disposto e organizado a fim
de evitar perdas humanas e reduzir ao máximo os danos
materiais.
Ver com os próprios olhos a fúria da natureza golpeada pela mão do homem moderno,a
industrialização desmedida e a priorização de um custo menor sem olhar o dano
incalculável que se faz ao meio ambiente assusta e nos faz recordar a quantidade
de vezes que um líder visionário como Fidel chamou o mundo a tomar
consciência.
Para alguém que viveu toda sua vida imersa no sistema capitalista, onde o Estado nem sempre
responde como se espera ou que ainda que responda no discurso político, na
prática, muitos anos depois províncias inteiras continuam esperando a promessa
de solução após uma inundação, sentir a confiança de um povo ao saber que não
estariam desamparados quando o furacão passasse, ver um povo mobilizado
solidariamente para ajudar onde seja preciso, inclusive recebendo em suas
próprias casas vizinhos que o necessitavam, emociona.
Constatar que o Presidente cubano Raúl Castro - como antes o fazia Fidel – desde o primeiro
momento esteve à frente do que este perigo significava, dirigindo pessoalmente
de Santiago e Guantánamo toda a previsão e logo após a passagem arrasadora do
furacão se dirigindo aos locais mais afetados para dar alento e confiança na
reconstrução, orgulha.
Saber que, apesar do povo cubano estar sofrendo uma inclemência deste tipo, o bloqueio
imposto pelos Estados Unidos continua sua criminosa vigência, indigna.
Por que não houve mortos em Cuba com a passagem do furacão? A resposta a essa interrogação
não é outra: porque existe uma Revolução que tem líderes como Fidel e Raúl que
jamais abandonarão seu povo.
Milhares de casas e estabelecimentos ficaram totalmente destruídos ou sem teto em Baracoa,
Maisí e Imias. Estradas total ou parcialmente interditadas por pedras enormes.
Centenas de postes de luz destruídos, bosques e plantações de café derrubados.
Em meio ao cenário desolador que deixou a passagem de Matthew nos povoados do
extremo oriente de Guantánamo, uma família levantou em Maisí duas bandeiras
cubanas, sinal de que estavam vivos e a estrela solitária uma vez mais tinha
ganhado a batalha.
Imediatamente após começou a etapa de recuperação na qual está imerso todo o povo e liderado
pelo seu governo.
12 de outubro de 2016
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