ONU pode criar relatoria especial sobre privacidade
04/03/2015
- Opinión
O governo brasileiro trabalha pela adoção de uma nova resolução sobre o direito à privacidade na era digital que permita a criação de uma Relatoria Especial para o direito à privacidade. O debate acontece na reunião do Conselho de Direitos Humanos da ONU, que começou na segunda-feira, 2/3, e segue até 27 de março, em Genebra. A criação desta relatoria é uma das recomendações de uma resolução anterior, proposta no final do ano passado pelo Brasil em parceria com a Alemanha.
Aprovado na última Assembleia Geral da ONU, a Resolução indica a necessidade de proteção ao direito à privacidade no contexto da vigilância e da coleta de dados das comunicações digitais. Segundo a assessoria de imprensa do Ministério das Relações Exteriores, a resolução conclama “o Conselho de Direitos Humanos a considerar o estabelecimento de um procedimento especial da ONU com mandato para examinar o tema e propor princípios e normas para guiar a comunidade internacional”.
O Minsitério diz ainda que Brasil e Alemanha se engajaram no projeto desta resolução “após as denúncias [feitas pelo ex-consultor da NSA, Edward Snowden] de violações em massa ao direito à privacidade, que inclusive apontaram violações a comunicações da Presidenta Dilma Rousseff e da Chanceler Angela Merkel, em 2013.”
Organizações da sociedade civil de diversos países, como a Human Rights Watch e a Artigo 19, se uniram e produziram um documento para pressionar o Conselho de Direitos Humanos a criar a relatoria.
A tarefa de um relator designado para um mandato especial é investigar e relatar violações aos direitos humanos, além submeter relatórios ao Conselho de Direitos Humanos e à Assembleia Geral da ONU e elaborar recomendações para governos, para as Nações Unidas e para outras entidades interessadas no tema.
Para Maria Laura Canineu, diretora do escritório brasileiro da Human Rights Watch, a nomeação de um relator especial para o direito à privacidade é o mecanismo mais adequado para garantir a efetividade dos direitos à privacidade. Ela observa que a última manifestação da Comissão das Nações Unidas Para os Direitos Humanos [que cumpria a função que hoje desempenha o Conselho de Direitos Humanos] sobre esse tema foi em 1994, há mais de vinte anos.
“Dentre os direitos civis e políticos, o direito à privacidade é o único que não conta com o beneficio de um mecanismo especial para o seu monitoramento”, reitera. “Uma abordagem integrada e especializada é necessária nessa matéria, uma vez que a coleta e retenção de dados esbarra em questões de vigilância digital, ou privacidade quanto à orientação sexual, privacidade familiar, direitos das crianças ou de minorias.”
Laura Tresca, responsável pelo Programa de Liberdade de Expressão da Artigo 19, atenta, no entanto, que não basta que o mecanismo seja aprovado. Primeiro é preciso superar “o gargalo político para a criação de um novo mandato especial das Nações Unidas”, e depois há questões importantes como o financiamento da relatoria.
Ela também pondera que imediatamente após a criação do mandato haverá ainda um percurso burocrático no qual se engajar; “será aberto um edital para postulação de candidaturas, mas a escolha não deixa de ser marcada por um processo de articulação em Genebra, que deve começar muito antes da abertura deste edital.”
Para Maria Laura, mesmo se a medida for aprovada, Brasil e Alemanha devem continuar a desempenhar um papel fundamental, “servindo como exemplo de interação com esse relator, abrindo portas para a sua atuação e aceitando suas recomendações”.
Ela também considera importante o envolvimento de países como Inglaterra e Estados Unidos, além de China e Rússia, já que são “países com um histórico de pouco respeito e garantias às liberdade de expressão”, para que assumam responsabilidades diante destas recomendações.
“Esse envolvimento deve buscar fortalecer a ideia de se estabelecerem mecanismos nacionais independentes que garantam transparência e responsabilidade do Estado no que diz respeito a coleta de dados e vigilância das comunicações privadas.” Ela ressalta que a orientação de um Relator Especial, “que poderá pesquisar efetivamente as práticas dos estados e a legislação disponível”, é especialmente importante dado o desenvolvimento acelerado de novas tecnologias.
No que concerne ao engajamento de outros países até agora, o Ministério das Relações Exteriores informou que a proposta para a criação da relatoria será apresentada ao Conselho de Direitos Humanos pelo "grupo nuclear" integrado por Áustria, Liechtenstein, México, Noruega e Suíça, além de Brasil e Alemanha.
04/03/2015
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