Multinacionais: sementes da infâmia

19/01/2006
  • Español
  • English
  • Français
  • Deutsch
  • Português
  • Opinión
-A +A
Em 2005, dez empresas controlavam a metade do mercado mundial de sementes. Apesar de inundados de notícias sobre fusões de empresas mostrando que há cada vez menos empresas controlando maiores percentuais de mercado em todas as áreas, sementes não são a mesma coisa que televisores, automóveis ou cosméticos. São a chave de toda a cadeia alimentar no mundo e o coração da vida camponesa e da agricultura. A quarta parte da população mundial, os camponeses e camponesas do undo, guardam suas próprias sementes para cultivar a comida de muitos mais. Há apenas três décadas, existiam mais de 7 mil empresas de sementes, e nenhuma das quais chegava a ter 0,5 por cento do mercado mundial. Em 2003, as 10 maiores controlavam um terço do mercado mundial. Hoje chegaram a 49 por cento do valor global das vendas desse insumo, segundo o informe Concentração da Indústria Global de Sementes - 2005, do Grupo ETC. A Dupont/Pioneer, que por muitos anos ocupou o primeiro lugar, está agora abaixo da Monsanto, com a compra que essa efetuou, em 2005, da multinacional mexicana Seminis. Agora a Monsanto é a maior empresa de venda de sementes comerciais, além de já ter o monopólio virtual na venda de sementes transgênicas (88 por cento em nível global). Na última década, a Monsanto engoliu, entre outras empresas, a Advanta Canola Seeds, a Calgene, a Agracetus, a Holden, a Monsoy, a Agroceres, a Asgrow (soja e milho), a Dekalb Genetics e a divisão internacional de sementes da Cargill. Suas vendas de sementes, no último ano, alcançaram mais de 2,8 bilhões de dólares. A Monsanto e a Dupont têm sede nos Estados Unidos. Na seqüência estão a Syngenta (Suíça), o Grupo Limagrain (França), a KWS AG (Alemanha), a Land O'Lakes (Estados Unidos), a Sakata (Japão), a Bayer Crop Science (Alemanha), aTaikii ( Japão), a DLF Trifolium (Dinamarca) e a Delta & Pine Land (Estados Unidos). Em relação à área global cultivada, as sementes transgênicas da Monsanto cobriram 91 por cento da soja, 97 por cento do milho, 63,5 por cento do algodão e 59 por cento da canola. Em nível global (somando cultivos convencionais e transgênicos), a Monsanto domina 41 por cento do milho e 25 por cento da soja. A aquisição da Seminis permitiu à Monsanto alcançar a distribuição de 3.500 variedades de sementes a produtores de frutas e hortaliças em 150 países. Em setores onde a Monsanto era invisível, agora controla 34 por cento das pimentas, 31 por cento dos feijões, 38 por cento dos pepinos, 29 por cento dos pimentões, 23 por cento dos tomates e 25 por cento das cebolas, além de outras hortaliças. É conhecida a "influência" que a Monsanto tem exercido para obter leis em muitos países, que lhe permitem introduzir transgêncios contra a vontade da grande maioria da população. Tanto é assim que se generalizou o termo "leis Monsanto" para denominar as leis de biossegurança. Mais preocupante é, então, sua dominação no mercado geral de sementes, já não apenas transgênicas. A Monsanto não é a única empresa que faz lobby nesse sentido, e as demais também não são santas. Causa vertigem constatar não só a dominação de mercado por um punhado de empresas em um aspecto tão vital, mas também como se foram modificando as leis de sementes em muitos países do mundo para garantir os lucros, vantagens e impunidade desses crescentes oligopólios. Com pequenas diferenças nacionais, na última década temos assistido a legalização das patentes e de outras formas restritivas de privatização das sementes, o desmantelamento da investigação pública e da produção e distribuição pública de variedades e, concomitantemente, a privatização da "certificação", ou seja, quem define quais sementes estarão no mercado. Isso afastando diretamente a função que, há uma década, era de âmbito público, permitindo que a certificação seja entregue a terceiros, que inclusive poderiam ser as próprias empresas que as produzem ou empresas criadas por elas. A organização Grain, recentemente publicou o informe América Latina: a sagrada privatização, onde analisam as leis de sementes de vários países do continente. Na perspectiva continental, fica ainda mais claro que houve um translado sucessivo de conceitos: iniciaram regulando as sementes híbridas e comerciais como "uma opção" dos agricultores e agora vão até tornar ilegal o uso de qualquer semente que não seja "certificada" e, portanto, pertencente às empresas. Apesar disso ainda não estar plasmado nas leis da maioria dos países, fica claro que esse é o objetivo. A dominação corporativa através do mercado e das leis, complementa-se com a contaminação transgênica de variedades tradicionais e convencionais que, além dos potenciais efeitos danosos sobre as sementes, implica no risco de as vítimas serem processadas judicialmente pelo "uso indevido de patente". E como arma final para a bioescravatura, as empresas pressionam agora para legalizar o uso das sementes homicidas Terminator. Longe de ser apenas um problema camponês, o que está em jogo é quem irá definir o que todos comemos. É tarefa de todos apoiar as organizações que, como a Via Campesina, tecem a campanha "Sementes: patrimônio dos povos a serviço da humanidade", assim como aos camponeses e camponesas que defendem o legado de riqueza e diversidade que as sementes livres de empresas, patentes e transgênicos carregam em si. - Silvia Ribeiro,pesquisadora do Grupo ETC www.etcgroup.org
https://www.alainet.org/pt/articulo/114153?language=en
Subscrever America Latina en Movimiento - RSS