Procura-se um Messias

19/12/2005
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O Natal já é na próxima semana, mas o mundo parece não dar-se conta. Ou talvez não saiba como necessita do Natal, como está perdido sem o Messias que vem para resgatar e fazer novas todas as coisas. A humanidade parece mais enlouquecida do que nunca. A violência e a corrupção só fazem aumentar. Assim se configura este melancólico final de um ano duríssimo e doloroso para muitos, no país e no mundo. Na Austrália, país formado e construído por degredados e imigrantes brancos da Europa, aconteceu há poucos dias uma explosão de violência racial contra os recém-chegados da Ásia ou do Oriente Médio. A principal cidade australiana, Sydney, assistiu ao triste espetáculo de milhares de jovens brancos armados de paus, pedras, garrafas, barras de ferro, bastões de beisebol ou mesmo armas de fogo, agredindo pessoas que pudessem ser identificadas como árabes ou asiáticos. Com sua ação agressiva, danificaram carros, lojas e residências, e enfrentaram a polícia. O revide não se fez esperar. Dois dias depois, grupos de jovens de aparência árabe revidaram e atacaram lojas e pessoas brancas em várias áreas, inclusive aquelas de onde partiram os agressores. A polícia identificou os arruaceiros como neonazistas e supremacistas brancos, que defendem a expulsão de outras etnias do país. Após os episódios de agressões de parte a parte, multidões de jovens enraivecidos promoveram verdadeira baderna gritando ³Chega de libs!², numa referência aos imigrantes libaneses. Houve gritos também contra negros e asiáticos. Há um mês, cenas parecidas aconteciam nos subúrbios de Paris, mais concretamente em Clichy-sous-Bois. Jovens descendentes de imigrantes árabes e africanos incendiaram carros e promoveram desordens. Foram violentamente reprimidos pelos temíveis CRS ­ a polícia especial francesa ­ e tratados de ³racaille² (gentalha) pelo Ministro do Interior, Nicolas Sarkozy. A França, assim como outros países ricos da Europa Central, não suporta mais ver seu belo e charmoso território invadido por imigrantes pobres que vêm ali trabalhar e buscar uma vida melhor. A escalada da intolerância racial cresce na França, tendo à frente o conhecido político de extrema direita Jean Le Pen. Agora, com os episódios de Clichy-sous-Bois, os ânimos mais acirrados, e Sarkozy com boas probabilidades de ganhar as próximas eleições presidenciais, é de se esperar que o racismo na França aumente e se firme cada vez mais. E o que acontece ali é apenas uma amostra do clima que se respira em toda a Europa, que deseja voltar a viver tranqüilamente seu estilo de vida abastado e sem preocupações. O Brasil não ficou atrás em termos de acontecimentos desagradáveis e negativos este ano. Desde junho o país vive como uma novela em capítulos o triste desmoronamento de uma utopia tão trabalhosamente construída durante décadas. A corrupção tornou irrespirável o cenário político nacional e o país inteiro geme sob a crise desencadeada, que lambe os degraus do Palácio do Planalto. O povo brasileiro caminha para as eleições de 2006 com extremo desalento. Enquanto isso, no Rio de Janeiro, para vingar a morte de um líder do tráfico, bandidos resolvem incendiar um ônibus e matar várias pessoas inocentes e honestas que voltavam do trabalho para gozar de merecido descanso em suas casas. Entre os mortos, uma menina de um ano que o desespero da mãe não conseguiu salvar. No dia seguinte, o tráfico premiou a polícia com cinco cadáveres, macabros troféus supostamente dos responsáveis pelo atentado ao ônibus. Os cariocas, desarvorados, perderam o prumo e se sentem em absoluta insegurança, pois percebem que são governados pelos marginais, enquanto seus governantes parecem ausentes de todo o acontecido. E, no entanto, é Natal. E por tudo isso e muito mais, procura-se um Messias. Busca-se desesperadamente o Único que é capaz de dizer-nos que a vida ainda tem sentido e o mundo não está perdido. Espera-se ansiosamente, uma vez mais, o Deus que se faz Menino e preenche com sua presença o vácuo de ética e paz em que se transformou o planeta. Diante de tão inefável Mistério só podemos calar e celebrar a chegada daquele que a comunidade cristã, com palavras do profeta Isaías, chamou de ³Conselheiro Admirável, Deus Forte, Príncipe da Paz². - Maria Clara Bingemer teóloga, professora e decana do Centro de Teologia e Ciências Humanas da PUC-Rio é autora de "A Argila e o espírito - ensaios sobre ética, mística e poética" (Ed. Garamond), entre outros livros. (wwwusers.rdc.puc-rio.br/agape)
https://www.alainet.org/pt/articulo/113906?language=es
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