Transgênicos são tema de encontro indígena e campesino
13/10/2003
- Opinión
A cultura dos Organismos Geneticamente Modificados está sendo
amplamente discutida no I Encontro Internacional de Resistência dos
Povos Indígenas e Campesinos, em Caracas. A abordagem que os
movimentos sociais fazem dos transgênicos vai além dos males que estes
alimentos podem causar à saúde e ao meio ambiente. O enfoque
privilegiado é o impacto sócio- político e econômico que culturas
modificadas podem trazer aos países.
A discussão sobre o cultivo de transgênicos vem sempre acompanhada da
reflexão sobre soberania alimentar, a principal bandeira da Via
Campesina. A introdução de culturas geneticamente modificadas é
geralmente defendida pelo argumento de que esta seria uma forma de
aumentar a produção e assim acabar com a fome no mundo, através da
chamada ?Revolução Verde?. No entanto, a professora Lorna Haynes, ex-
coordenadora da Rapal-Venezuela, explica que ?o problema da fome não é
um problema de quantidade, mas de redistribuição da produção e de
vontade política?. Afirma, ainda, que este modelo não responde às
aspirações dos pequenos agricultores, somente das grandes
multinacionais que investem nesta tecnologia, como a Monsanto, por
exemplo.
Monsanto é destaque em paineis.
A Monsanto tem uma longa história de práticas irregulares em suas
investigações, de coerção para ocultar evidências, de enganar ao
público com sua publicidade e tem sido acusada de muitos danos
ecológicos e à saúde. Um caso bastante conhecido é o do herbicida
Agente Laranja, utilizado durante a guerra do Vietnan. Devido à alta
concentração de dióxidos em seu produto, a Monsanto respondeu por
grande parte dos pedidos de indenização dos sobreviventes. Outra
acusação já conhecida sobre a empresa refere-se à manipulação e
omissão de dados sobre a segurança do hormônio r-BGH (Prosilac),
produto de sua engenharia genética utilizado para estimular a produção
de leite em vacas.
Esta mesma companhia é responsável por 90% das sementes transgênicas e
do herbicida glifosfato, o Round up, em todo o mundo, 86% dos cultivos
de alimentos modificados e 60% da soja transgênica, resistente ao
herbicida Round up. ?A investigação agrobiológica financiada pelas
multinacionais tentam desenvolver plantas resistentes a altas doses de
herbicidas. O paradoxo é que as mesmas multinacionais vendem o tal
herbicida e a semente ?melhorada geneticamente?, disse Francisco
Carreña, da CANEZ (Coordenação Agrária Nacional Ezequiel Zamora).
A especialista venezuelana também apontou a propriedade intelectual
como mecanismo de controle da produção dos alimentos por parte das
empresas de biotecnologia. Através do uso de técnicas de restrições,
elas são capazes de manipular geneticamente a estrutura de um
organismo para que somente possa ser reproduzido caso seja ativado. ?O
agricultor fica dependente da aquisicao do pacote semente- herbicida.
Além disso as sementes sao programadas para florescerem somente por
uma safra, o que obriga o agricultor ter que comprá-las acada safra?,
afirma Maria do Carmo, agrônoma e militante do Movimento dos Pequenos
Agricultores.
O perigo da contaminação.
?A cultura de transgênicos é preocupante pois impede a coexistência de
culturas não modificadas, o que causa sérios danos à biodiversidade.
Resulta na rápida extinção de variedades criolas e indígenas
ancestralmente selecionadas e adaptadas às condições agroecológicas
das regiões produtivas?, afirmou Maria Helena Martinez, membro da CLOC
(Coordenadora Latino Americana de Organizacoes Campesinas) . A
contaminação genética acontece muito rapidamente através dos ventos e
agentes polinizadores e é irreversível. Uma vez contaminada, a região
praticamente não pode ser recuperada. Daí, os movimentos considerarem
imprescindível a disputa por uma agricultura isenta de transgênicos.
Martinez disse também que a contaminação é uma técnica utilizada pelas
empresas de biotecnologia e citou o caso do canadense Percy Schmeiser
que teve sua plantação orgânica, cultivada há mais de 50 anos,
contaminada por uma plantação transgênica vizinha da Monsanto. ?O
canadense ficou arruinado e foi processado pela empresa, que, além de
cobrar royalties, o acusou de uso indevido de suas sementes
modificadas? explicou.
A situação do campo na Argentina.
Francisco Carreño recorreu às palavras do engenheiro Adolfo Boy
apresentadas na Mesa Redonda ?Oposição e alternativas aos cultivos e
alimentos transgênicos? realizada em Montevidéo, em julho deste ano,
para explicar a situação do campo, hoje, na Argentina. ?A Argentina
nunca foi um país industrial, sempre viveu às custas do campo, com o
qual deu de comer ao seu povo e ao mundo. Tudo foi arrasado pela soja
transgênica, orientada pela agroindústria monopólica que a transforma
em álcool, leite ou chocolate?, citou literalmente ao engenheiro.
Carreño afirmou, ainda, que este país ao entrar em um processo
produtivo acelerado, aumentando cada vez mais a superfície semeada,
não melhorando o rendimento por hectare, aprofundou a crise. O
resultado desta agricultura de escala foi a exclusão da gente do
campo. ?Quem vive em um campo que não tem árvores, nem galinhas, nem
burros? O campo argentino está vazio?, concluiu.
https://www.alainet.org/pt/articulo/108577?language=es
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