Os migrantes e as reformas
11/06/2003
- Opinión
Preparando o dia do migrante, a ser celebrado neste ano no
domingo dia 22 de junho, temos pela frente a Semana do
Migrante. Ela abre espaço para a complexa realidade das
migrações, seja a nível mundial como dentro do Brasil. E' uma
das iniciativas da Pastoral dos Migrantes da CNBB. Sua
validade fica facilmente demonstrada nestes dias, pelas
celebrações populares que grupos de migrantes realizam em
pontos estratégicos de migrações em nosso país.
Pelo Brasil afora, bolivianos, paraguaios, peruanos, se
reencontram e podem expressar sua identidade através das
celebrações que realizam, animadas de seu folclore e marcadas
pela solidariedade que sustenta sua luta pela sobrevivência.
De modo semelhante, nordestinos, baianos, mineiros,
cultivam suas tradições, e procuram manter relacionamentos
familiares e sociais que lhes dão precioso suporte para
superarem as dificuldades inerentes à sua difícil situação de
deslocados do seu contexto vital e de estranhos em seu
próprio país.
Desta vez, o lema da Semana do Migrante tem conotação
bíblica: "Nossos pais nos contaram". Ele sugere,
evidentemente, a importância da memória histórica, para não
perder a identidade cultural, que transmite valores vitais
indispensáveis para os migrantes enfrentarem o novo contexto
onde buscam sua sobrevivência.
Mas, a memória bíblica traz um valioso testemunho da
dimensão positiva da migração. Os grandes personagens do
Antigo Testamento foram migrantes. Abraão saiu da Caldéia e
foi peregrinando em busca de uma terra para a sua
descendência. Jacó, qual nordestino, juntou sua família e foi
morar no Egito, onde era possível sobreviver naquele tempo de
vacas magras. Mais tarde, Moisés liderou a migração coletiva
do povo de Israel, em direção à terra prometida, onde
poderiam afirmar sua autonomia e garantir sua liberdade.
Na verdade, a migração acaba testemunhando a necessidade
permanente de superar situações que se desgastaram, e que
precisam ser ultrapassadas. A migração sinaliza a urgência de
mudanças.
Assim o comprova a história. As grandes ondas
migratórias foram presságio de grandes transformações
acontecidas no mundo. A queda do império romano foi advertida
pela invasão dos "bárbaros", que na verdade eram migrantes
cheios de vitalidade que vinham dispostos a dar novo rumo aos
acontecimentos. O "novo mundo" que brotou da revolução
industrial foi plasmado pelos migrantes europeus que vieram
povoar a América.
Agora, de novo o mundo se vê pressionado por grandes ondas
migratórias, que a muito custo são detidas pelos países que
resistem a transformações que são demandadas pelo impulso
vital da humanidade. Os Estados Unidos erguem muralhas para
deter a entrada dos latinos. A Europa se protege da invasão
dos africanos.
Mas a história mostra que a chama da vida está nas mãos dos
migrantes. Eles são profetas das transformações. Proclamam a
urgência da partilha e urgem a socialização dos avanços da
humanidade.
A Semana do Migrante chega no momento em que o Brasil está
envolvido no debate das reformas. Sua mais eloqüente
postulação é feita pela grande massa de migrantes que andam
pelo país à procura de sobrevivência.
Um deles está agora na Presidência da República. Sua condição
de migrante nordestino lhe dá a autoridade moral mais
consistente para empunhar a bandeira das reformas. Elas
precisam ser feitas não para salvaguardar privilégios
ultrapassados, mas para garantir a todos os brasileiros uma
pátria onde possam trabalhar com responsabilidade e viver com
dignidade.
https://www.alainet.org/pt/articulo/107678?language=en
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