A crise conduz a uma nova esperança?
05/07/2005
- Opinión
Uma boa parte da população brasileira já percebeu que estamos desde o começo deste ano em plena campanha eleitoral e também sabe que faz parte da oposição fazer tudo o que possa contribuir para chegar ao poder.O primeiro lance foi a eleição do novo presidente da Câmara: o candidato do governo não inspirava muita confiança em virtude de sua militância nos movimentos sociais e sobretudo por seu apoio ao MST. Sua eleição apareceu para determinados grupos como uma sinalização de uma Câmara mais sintonizada com a grande aspiração de uma profunda transformação social do país. A divisão do partido do governo e dos outros partidos da base aliada tornou sua derrota possível e ficou claro que agora se tratava de blindar de tal modo o governo que uma reeleição se fizesse cada vez mais problemática.
Tudo indica que os que sempre foram donos deste país, embora o governo atual esteja fazendo uma política econômica em seu proveito, certamente continuam admitindo a possibilidade do governo atual mudar de rumo. Isto porque as críticas à política econômica e o desencanto dos movimentos sociais se fazem cada vez mais fortes. As duas coisas são profundamente vinculadas entre si: o desencanto dos movimentos sociais e dos militantes dos partidos comprometidos com uma mudança do país se radica na política econômica orientada aos mercados financeiros em detrimento da produção e do trabalho o que mantém dois terços da força de trabalho na informalidade, portanto, sem direitos. Esta política inibe a redução da desigualdade e um crescimento mais expressivo: dos grandes países em desenvolvimento, China, Índia, Rússia e Brasil, o Brasil é o que cresce menos. Veja o que se espera para este ano.
O segundo lance, que entrou maravilhosamente nesta estratégia, foi a denúncia de corrupção, o que vem desde algumas semanas ocupando os espaços da mídia. Infelizmente, o governo caiu na armadilha tentando evitar a CPI e teve depois de voltar atrás com grande perda de credibilidade. É pena que neste debate muitas vezes não fique claro que o atual sistema político brasileiro é a fonte principal do clientelismo e da corrupção políticos.
Aliás, trata-se aqui de uma longa tradição que provém da forma de estruturação política que aqui se articulou na colonização. Desde então os setores dominantes da sociedade se articulam para constituir alianças que possam garantir a satisfação de seus interesses e o mecanismo privilegiado foi a constituição de “redes familiares” onde a prática da lealdade se constituía como a principal virtude. Isto criou uma cultura política que se traduziu em instituições em que o poder é exercido na base de troca de favores, fundamentalmente econômicos, como garantia de apoio aos projetos do governo.
Um sinal muito claro disto hoje é o excessivo número (quase 20.000) de cargos em comissão preenchidos por nomeação política.No entanto, a reação dos segmentos organizados da sociedade é muito positiva e constitui uma chance de provocar uma mudança de rumo. Esta reação se articulou de uma postura unitária de uma boa representação da sociedade civil e dos movimentos sociais “contra a corrupção e a desestabilização política do governo.
Por mudanças na política econômica, pela prioridade dos direitos sociais e por reformas políticas democráticas”. É extremamente significativa esta formulação, porque vincula, o que não faz de modo geral a mídia, a luta contra a corrupção com a luta por uma outra política econômica e pela reforma política democrática. Portanto, sinaliza uma mudança de rumos que pode fazer o governo retornar ao ideário em função do qual foi eleito.
- Filósofo, teólogo e professor da Universidade Federal do Ceará.
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