PT e Igreja da Libertação
26/09/2002
- Opinión
Quatro forças principais entraram na construção do PT, partido que se apresenta como o
portador de um novo sonho de que um outro Brasil é possível.
A primeira é representada pelo novo sindicalismo brasileiro, donde vêm Lula e seus
companheiros. Ela conferiu ao partido o sentido de classe, em oposição ao sistema do
capital, hoje globalizado, sempre em luta com o trabalho.
A segunda força é constituida pela esquerda libertária que estava nos respectivos partidos,
nas universidades ou que retornava do exílio. Ela deu ao PT o sentido universalista, de uma
democracia a ser sempre construida.
A terceira força é o movimento social popular. Engloba centenas de organizações como o
MST. Construi-se como força social a partir de uma nova consciência, de organização e de
um projeto de Brasil diferente. Ela ajudou a fundar o PT, como força político-partidária,para
viabilizar uma alternativa, capaz de ocupar o poder central. O partido é visto como um
instrumento para se realizar um estado verdadeiramente democrático,com políticas sociais
justas, no qual todos possam caber, coisa que a política tradicional das elites sempre
inviabilizou. Essa força fêz o PT popular e lhe conferiu a caracteríistica de resistência e de
libertação.
A quarta força é a Igreja da Libertação. Por Igreja da Libertação entende-se aquela
porção das Igrejas (católica e outras Igrejas evangélicas) que compreendeu a íntima
associação entre evangelho de justiça social e que, em razão disso, fêz uma clara opção
pelos pobres, contra a pobreza e a favor de sua libertação. Essa porção, significativa mas
não majoritária,ensejou as milhares de comunidades eclesiais de base, centenas de milhares
de círculos bíblicos, centenas de centros de defesa dos direitos humanos e organizou a assim
chamada pastoral social(pastoral da terra, dos índios, dos negros, da saúde etc). Os
integrantes deste novo modo-de-ser-Igreja se entendem como parte do movimento social
com o qual estão sempre articulados. Por isso, assumiram o projeto do movimento social,
evitando, destarte, a pretensão de ter um projeto próprio. Logicamente, o projeto da fé inclui
mais que um novo Brasil, quer uma nova humanidade e ainda a ressurreição da carne, coisa
que nenhuma política pode dar. Mas a utopia da fé mostra profunda conaturalidade com o
projeto do movimento social e com o projeto do PT. Em outras palavras,o evangelho não é
só bom para nos prometer a vida eterna mas é bom também para nos ajudar a construir a
vida terrenal mais justa e espiritual.
Esses cristãos novos não entraram no PT. Ajudaram a fundá-lo porque viram nele um
instrumento, embora não único, de realizar o projeto popular e de acercar-se mais ao sonho
cristão.Em razão disso, criou-se, no Rio, em 1989, o Movimento Fé e Política, com as
assinaturas de políticos e cristãos como Benedita da Silva, Chico Alencar e outros. Esses
cristãos e políticos entendem a política como um instrumento para realizar os bens do
Reino que são a justiça, a fraternidade e a paz e viram o Reino como horizonte utópico da
política, na medida em que a política supõe uma utopia social. Essa força deu o PT uma
mística de luta e lhe transferiu o cabedal de generosidade, própria dos discípulos de Jesus. A
força do PT consiste em manter organicidade com essas forças geradoras na sua origem.
Elas lhe dão singularidade e vitalidade, elevando a cultura política do Brasil. Esse partido
merece chegar ao poder e dar a este um sentido verdadeiramene social e libertário.
* Leonardo Boff, Teólogo.
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