Luis Britto García:

Direita pode estar cometendo suicídio na Venezuela

25/04/2013
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"Na Venezuela tivemos a sorte de que o aviso popular não
foi acompanhado de uma derrota eleitoral"
 
Considerado um dos maiores intelectuais da Venezuela, o escritor, ensaísta, dramaturgo e pintor, Luiz Britto García, é um dos maiores pensadores do país. Em entrevista ao ComunicaSul, o escritor nega que morte de Hugo Chávez represente o fim do chavismo, ressalta a importância da vitória de Nicolás Maduro e diz ser necessário refletir sobre os motivos que levaram ao crescimento da oposição no país.
Diante da ofensiva realizada pela direita na Venezuela, que tem usado violência para questionar o resultado eleitoral de 14 de abril, sua teoria é de que “é do pacto entre o grande capital financeiro, bastião da direita, e o poder do Estado que surge o fascismo e a classe média aterrorizada, sem expectativa, é o caldo de cultura desta ideologia (…) porque a enganam dizendo que vão proletarizá-la; e por ínfima que seja a classe média, sua única satisfação é estar um pouquinho acima do proletariado e isso provoca um pânico inconcebível porque pensam que o ser depende do ter e não do que se é. Estes fatores explosivos e incentivados por uma propaganda que incita o terror, sobre a insegurança, que se baseia em pesquisas equivocadas sobre a quantidade de vítimas violentas, resulta em uma mescla explosiva que leva a esta loucura”, definiu, durante encontro de intelectuais com o presidente Nicolás Maduro.

Ao ComunicaSul, García avalia que a direita pode estar cometendo um suicídio político ao não reconhecer o resultado anunciado pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE). Confira:

ComunicaSul: Como avalia a situação atual da Venezuela? 
Luiz Britto García: Em primeiro lugar quero ressaltar que foi uma vitória bolivariana apertada, mas contundente. A oposição se nega a admitir resultados que os favorece muito, já que revelam um crescimento de mais de 700 mil votos. Em todo caso, o sistema venezuelano tem sido qualificado quiçá como o melhor do mundo pelo ex-presidente [dos Estados Unidos] Jimmy Carter. Além disso, o processo foi acompanhado por uma centena de observadores internacionais que não encontraram nenhum defeito.

Agora tem que se perguntar: se a direita insiste em desconhecer o CNE, como irão concorrer às próximas eleições? Eles teriam que se declarar fora do jogo político. A direita fez isso na Venezuela e foi fatal. Retirou-se das eleições e não elegeu nenhum deputado na Assembleia Nacional, que teve maioria de 100% de esquerda. Se eles querem cometer de novo este suicídio político, é seu direito, mas não é sensato, nem recomendável.

No Brasil, os jornais tradicionais dizem é o fim do chavismo... 
Não. Quem certifica isso é a própria direita. O que fez Capriles Radonski para aparecer em público? Se apresentou com o boné, os símbolos do bolivarianismo. Prometeu que iria continuar com as missões, que são símbolos do bolivarianismo. Então ele mimetizou na medida do possível a linguagem do adversário. Agora, se o chavismo tivesse acabado, por que a direita teria tanta paixão por copiá-lo?

Eu creio que há uma situação conjuntural por uma desvalorização da economia capitalista, que provocou uma série de desabastecimentos, acaparamentos de produtos essenciais e isso provocou um grande surto e lamentavelmente, não foram tomadas sanções oportunas a tempo. Bom... eu acho que isso tem relação com a margem dos votos.

A Revolução Bolivariana tem muitas conquistas e também falhas. Crê que esta mudança do eleitorado tem relação com estas debilidades? 
Evidentemente. Mesmo as autoridades dizem: houve problemas de burocracia, de ineficiência que o próprio Chávez denunciou e tentou combater, mas às vezes estas coisas não são corrigidas tão facilmente. Mas esta mudança no padrão eleitoral evidentemente é um aviso e creio que é muito saudável, porque a revolução sandinista perdeu as eleições quando esperava ganhá-las e foi um longo processo de mais de dez anos para recuperar o poder. Aqui tivermos a sorte de que o aviso não foi acompanhado pela derrota eleitoral. Teremos tempo para corrigir, melhorar, reparar estas falhas.

Três anos até o pedido de referendo revogatório, que a oposição poderá fazer, somada à questão econômica, à inflação… serão suficientes para que Maduro reconquiste estes votos? 
Sim, esperamos que sim. Em todo caso, a situação econômica da Venezuela é infinitamente melhor do que a de outros tantos países. A Venezuela tem o menor índice de desigualdade social da América Latina e o salário mínimo mais alto. Recuperou o salário mínimo dos trabalhadores, deu aposentadoria para os idosos. Um em cada três venezuelanos está estudando e a maioria deles em escolas gratuitas. Então não creio que o povo queira perder estas conquistas.

Em poucas horas houve um exemplo do que seria um governo da direita, que começou a destruir hospitais, mercados onde são vendidos produtos a preços solidários [mercais], destruir sedes partidárias. Então isso mostra que [em um possível governo] não haverá liberdade política. É uma pequena prova do que poderia ser um governo da direita.

Qual foi o papel desempenhado pelos meios de comunicação nestes últimos dias? 
A Venezuela tem uma centena de jornais, mais de uma centena de televisões, milhares de rádios e todos são abertamente contra o processo. Até 2004, [o governo] contou com apenas uma TV e uma rádio nacional e de pequeno alcance. Desde então se criou seis televisões públicas, rádios e um grande setor de emissora de meios de comunicação alternativos e comunitários. Mas segue havendo uma minoria favorável ao processo.

Foi feito um estudo dos meios de comunicação nos tempos do golpe [2002]. A pesquisa foi feita por um comunicador direitista. Ele provou que somente em dois jornais houve algum tipo de equilíbrio na cobertura. Isso mostra que o que o processo tem a seu favor é a mensagem: da igualdade contra a desigualdade social, da inclusão contra a mensagem racista da direita, do nacionalismo contra a desnacionalização, imperialista.

Eu penso que o extraordinário êxito da revolução bolivariana se deve a seu próprio conteúdo, porque estabeleceu uma hegemonia comunicacional com poucos meios de comunicação. Hoje, não seria tão fácil outro golpe midiático na Venezuela.
 
- Vanessa Silva, de Caracas. comunicasul  
 
https://www.alainet.org/es/node/75683
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