Instabilidade política e desafios para os movimentos populares no Haiti

30/04/2019
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Protesto na capital do Haiti, em fevereiro de 2017
Foto: Dieu Nalio Chery/AP Photo
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Neste artigo, apresento um breve informe sobre a situação atual no Haiti, que continua muito explosiva com o governo de Jovenel Moïse, impossibilitado de governar, e uma total separação entre as instituições do Estado e a população.

 

O presidente haitiano continua aplicando políticas neoliberais agressivas. Recentemente, em fevereiro de 2019, o governo confirmou um acordo assinado com o FMI para a obtenção de um crédito de 229 milhões de dólares para o período de três anos. Entre as decisões recentes, está também a privatização dos setores de energia e combustíveis após deixar a Petrocaribe.

 

Esta privatização, evidentemente, é um retrocesso grave que terá gravíssimas consequências. O acordo com o FMI foi assinado imediatamente após voto do Haiti contra a Revolução Bolivariana na OEA. O voto contra Nicolás Maduro na OEA e o reconhecimento do “governo” fantoche e ilegal de Juan Guaidó também estão entre os motivos que levaram a uma indignação geral por parte da população. Do mesmo modo, o orçamento do governo, com medidas de ajuste fiscal, são consideradas antipopulares.

 

Coordenado pelo Departamento de Estado, o Haiti vendeu ao Qatar a dívida de 4,2 mil milhões que tem com o governo venezuelano. Suspeita-se que o governo do Qatar, estaria desembolsando, através desta operação, uma quantia relevante de dinheiro à Juan Guaidó, assim como teria recebido promessas não muito claras do governo do Haiti para o controle de alguns recursos estratégicos. Também os Estados Unidos estão utilizando o governo de Jovenel Moïse como cavalo de Tróia para fragilizar a Caricom (Comunidade e Mercado Comum do Caribe, que reúne 15 países e 5 territórios associados) e intensificar o processo de recolonização das ilhas dos Caribe, com o objetivo estratégico de destruir a Revolução Cubana e tomar o controle dos imensos recursos estratégicos da região.

 

Há algumas semanas, a situação do país se intensificou com a atuação de bandos violentos nos bairros populares e um foco de revolta comandado pelo chefe de um desses bandos – Arnel Joseph, conhecido por controlar uma quadrilha –, no último dia 19, com um ataque armado ao quartel Petite Rivière de l’Artibonite [no estado de Artibonite]. A atividade desses grupos armados está associada a episódios de massacres nos principais bairros populares da capital, entre eles, La Saline e Cité Soleil.

 

O presidente acaba de designar um novo primeiro ministro, Jean Michel Lapin, alinhado a seu partido, o Partido Haitiano Tet Kale (PHTK), e tenta agora, com o apoio decidido do imperialismo ianque, convencer aos setores social-democratas a participar de seu governo.

 

Já no campo popular, estamos construindo uma nova coalizão de forças de esquerda que agrupam seis organizações políticas (GRML, AKAO, KONTRAPEPLA, RASIN Kan Pèp La, Ayiti Djanm e BOURAD). Desde fevereiro, foram realizados treze encontros com um processo positivo de aproximação – ainda frágil – mas que inspira muita esperança de avançar na construção de uma frente unitária de esquerda, que é o único caminho para mudar a correlação de forças no nosso terreno político. No último período, também publicamos duas declarações sobre a crise que foram bem recebidos pela população.

 

No nível tático, estamos iniciando algumas conversas com outros setores políticos para frear o processo de negociação no contexto da formação de um novo governo. Queremos manter a reivindicação inicial dos setores populares, que exigem a renúncia do presidente e a dissolução do Parlamento. É fundamental alcançar esses objetivos e avançar rumo à formação de um governo de transição. Pensamos que as forças políticas de centro-direita e social-democratas do país (OPL, Fusion, MOKRENA, Ayisyen pou Ayiti, Verite, Veye yo, Tèt ansanm, MOPOD, Fanmi Lavalas e Pitit Desalin) estarão de acordo.

 

Neste momento, consideramos que alguns pontos são fundamentais para as forças populares e a recuperação da democracia no Haiti.

 

O primeiro deles é o fim do monopólio de todas as estruturas do poder estatal pelo clã da extrema direita em torno do partido PHTK e seus aliados, comandados pelos Estados Unidos.

 

O segundo, impedir que as próximas eleições abram espaço para a restauração de um “neoduvalierismo” [como é chamada a continuidade do governo de Jean Claude Duvivier através de seu filho, Nicolás Duvalier], que iniciou uma agressiva campanha eleitoral, com o mesmo apoio e estratégias que escolheram outros candidatos de extrema direita em país como o Brasil e Espanha, entre outros.

 

Em terceiro lugar, impedir que o atual parlamento, que é controlado pelo imperialismo e o clã PHTK, adote reformas no texto da Constituição, o que significaria a destruição de todas as conquistas democráticas dos últimos trinta anos.

 

Em quarto, devemos mudar radicalmente o sistema eleitoral, que está sob controle do imperialismo através do PHTK, de algumas famílias da oligarquia e dos traficantes de drogas. Esses setores estão se preparando para encerrar o jogo eleitoral com benefícios exclusivos e manter um controle total da vida política do país durante os próximos 40 anos.

 

Por último, é preciso frear o processo de saque das terras ocupadas historicamente pelos camponeses, que busca transferir estes territórios a empresas transnacionais e grandes empresas haitianas. Essas transferências para as grandes empresas se dão em diversos setores, zonas francas de exportação de produtos têxteis para o mercado estadunidense, indústria de exploração de recursos minerais, turismo comercial, agroindústria para a exportação.

 

Acreditamos que, na atual conjuntura, é possível construir uma ampla aliança pontual para conter os planos dos grupos dominantes no Haiti.

 

- Camille Chalmers é economista, professor e secretário da Plataforma Haitiana pela Defesa de um Desenvolvimento Alternativo (Phada) e integrante do Jubileu das Nações Unidas para o país.

 

Edição: Rodrigo Chagas | Versão para o português: Luiza Mançano

 

https://www.brasildefato.com.br/2019/04/29/artigo-or-instabilidade-politica-e-desafios-para-os-movimentos-populares-no-haiti/

 

https://www.alainet.org/es/node/199575
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