A América do Sul pode prosperar impulsionada por commodities?

29/04/2015
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Siderurgia. Imagem: Payton Chung / Creative Commons / Flickr Siderurgia Creative Commons Flickr
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A história econômica da América do Sul tem sido caracterizada por ciclos de impulsos e aumentos de negócios impulsionados pela demanda internacional por commodities, tornando a região volátil e dependente da demanda internacional por esses produtos. Desde as altamente protecionistas políticas de industrialização por substituição de importações – destinadas a desenvolver a indústria durante os anos 1970 – à integração ao mercado nas últimas décadas, os doze países da região estão lentamente tentando superar suas dependências diversificando seus modelos econômicos e abordando questões sociais, como o combate a desigualdade. Mas as economias destes países são fortes o bastante para evitar a recessão e consolidar modelos únicos que atinjam as necessidades de suas populações?

 

Segundo o Banco Mundial, o cenário atual não é muito brilhante, uma vez que não apenas a América do Sul, mas também a taxa de crescimento de toda a América Latina diminuiu nos últimos dois anos. Em janeiro último, o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) regional caiu para um terço do registrado em 2013, representando 0,8% ao ano. Brasil, a maior economia da região, com uma população de 200,4 milhões de pessoas, sobreviveu a um declínio consistente do crescimento econômico desde o início do ano. A Reuters reporta que “a mediana das estimativas para o crescimento econômico para o Brasil [que é uma estimativa do ano anterior aos resultados oficiais de crescimento do PIB serem liberados]caiu para 0,13% de 0,38% na pesquisa da semana anterior e 0,55% no mês antecedente”.

 

Nos países andinos – que são grandes exportadores de commodities – a situação também não é muito otimista. O Chile é responsável por produzir sozinho um terço do cobre do mundo, enquanto a Colômbia e o Peru são famosos por possuírem um setor industrial fraco tendo suas economias altamente focadas na exportação de commodities, que representa dois terços do total de suas exportações. Como consequência, “déficits em conta corrente [na soma dos dois países]devem atingir 5% do PIB neste ano”, um nível visto pela última vez “na década de 1990, quando a região estava associada à crise da dívida”.

 

Argentina e Venezuela podem receber mais atenção devido à turbulência política causada por governos altamente intervencionistas, frequentemente acusados de manipular números macroeconômicos, mas não são diferentes do resto da região quando se trata de commodities. As exportações de soja praticamente guiam a economia argentina, mas com a desaceleração da demanda global a dívida externa do país ainda é persistente e tornou-se um grande problema. Dados do Banco Mundial mostram que, durante o ano fiscal de 2014, as “contas registraram um déficit primário de 0,9% do PIB e um deficit total de 2,5% do PIB”. Consequentemente, “os ganhos do setor público aumentaram 42,5% enquanto as despesas subiram 45%”. Em termos gerais, isso significa que, em comparação com anos anteriores, o crescimento da Argentina deve ser próximo a zero.

 

Neste contexto, possuir grandes reservas de petróleo tem sido mais uma maldição do que uma bênção para a economia venezuelana, que enfrenta uma recessão. A queda recente dos preços do barril de petróleo para uma média de US$ 57 dólares (cerca de R$ 168) empurrou o país para a crise, já que o petróleo representa 96% das exportações da Venezuela. De acordo com o Financial Times, o cenário anterior coloca a Venezuela em um “espectro de preocupação“, uma vez que os investidores temem que o país não honre suas dívidas.

 

Apesar da impressionante desaceleração nas taxas de crescimento da região, a América do Sul nunca esteve tão integrada e aberta ao mercado. Um exemplo disso é o Mercado Comum do Sul (Mercosul). Composto por Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai e Venezuela, o bloco comercial garante uma união aduaneira completa aos seus membros, proporcionando uma redução das tarifas e barreiras comerciais intra-regionais. Em termos gerais, o bloco comercial é positivo para a América do Sul, pois assegura a livre concorrência entre os seus membros, o que leva a políticas macroeconômicas coordenadas, mesmo que seus regulamentos sejam plenamente implementados por todos os membros.

 

Apesar do aumento da integração e dos esforços internos para desencadear o crescimento econômico, a desaceleração na atividade econômica da América do Sul apenas prova que a região ainda não é forte o suficiente para resistir com maior eficiência a choques internacionais. A produção industrial pode ser significativa para países como o Brasil, mas que carece de consistência em Estados como Chile e Peru. Logo, as commodities ainda são a principal força por trás da economia local. Para se tornar mais competitiva globalmente, a América do Sul precisa fortemente desenvolver um ambiente econômico consistente e confiável, no qual as commodities não sejam percebidas como um problema, mas uma solução para aumentar as reservas em tempos de crise.

 

Isso só pode ser alcançado por meio da consolidação das instituições públicas e privadas que tenham sido historicamente questionadas por escândalos de corrupção envolvendo o governo, como é o caso da Petrobras no Brasil. Instituições mais fortes trazem credibilidade e o desenvolvimento de um ambiente favorável às empresas, o que gera crescimento econômico e de investimentos. Por exemplo, a América do Sul precisa  investir em educação, a fim de obter uma transição de uma força de trabalho pouco qualificada para uma altamente qualificada. Os países da região precisam investir em pesquisa e desenvolvimento e aumentar o seu nível tecnológico, para depois possuir indústrias inovadoras e especializadas capazes de competir em escala global.

 

Por enquanto, a América do Sul registra grandes déficits em conta corrente causados pela queda da demanda externa por commodities e altos níveis de inflação, que pode atingir 8% até ao final de 2015 no Brasil e 16,5% registrados na Argentina em março último. A tendência é haver um aumento nas taxas de juros e desvalorização das moedas dos países da região. Com taxas mais elevadas, os preços sobem e os empréstimos ficam mais caros. Logo, com menos dinheiro circulando a economia tem seu dinamismo reduzindo e as empresas diminuem suas atividades.

 

Neste sentido, há uma necessidade urgente de alterar a política econômica da região como um todo, visando ajustes fiscais e consequentes cortes nos gastos públicos. Isso pode ser atingido, por exemplo, estimulando a privatização de empresas e aumentando o investimento estrangeiro para evitar a repetição do ciclo histórico de dependência desencadeada pela demanda internacional.

 

- Priscila Azevedo Rocha é jornalista e historiadora econômica com mestrado pela London School of Economics. Journalist and economic historian with a master degree from the London School of Economics.

 

http://politike.cartacapital.com.br/?p=979

https://www.alainet.org/es/node/169313?language=es
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