42,5% de conflitos pela água aconteceram nos estados banhados pelo rio São Francisco
11/01/2007
- Opinión
Estamos oferecendo hoje à sociedade brasileira os dados parciais dos conflitos no campo, relativos aos meses de janeiro a setembro de 2007. Acompanham esta nota, em anexo, as tabelas de Violência contra a Ocupação e a Posse; de Violência contra a Pessoa, um Relatório Síntese dos conflitos e uma tabela de Manifestações. Todos de janeiro a setembro de 2006 e 2007. Segue também em anexo, a relação de todos os assassinatos ocorridos no campo até dezembro de 2007, somando um total de 25.
Os conflitos pela água, neste ano, apresentaram crescimento em relação a igual período de 2006. De 38 conflitos para 40 em 2007. O número de pessoas envolvidas, porém, mais que dobrou: de 12.632 para 25.919. Na região Sudeste houve o maior crescimento desses conflitos, de 6, em 2006, para 14, em 2007. Destes, 11 são em Minas Gerais. 17 dos 40 conflitos, 42,5%, foram registrados nos Estados banhados pelo rio São Francisco, objeto do projeto de Transposição do governo federal.
Diminuição de conflitos não esconde a violência
Mesmo que em termos absolutos tenha havido uma queda geral nos números dos conflitos, em termos relativos há crescimento da violência. Em 2006, para cada ocorrência de conflito houve 1,2 famílias expulsas, 16 despejadas e os assassinatos correspondiam a um para cada 47 conflitos. No mesmo período de 2007, (é bom ressaltar que são dados ainda parciais) para cada ocorrência de conflito se computam 5 famílias expulsas, 19 despejadas e um assassinato para 44 conflitos.
Mas é em relação ao número de famílias expulsas pelo poder privado que se verifica o maior crescimento da violência, não seguindo a tendência de queda verificada em outros indicadores. As famílias expulsas passaram de 1.657, em 2006, para 2.711, em 2007, mais de 100% a mais. Este aumento verificou-se em todas as regiões do País, sem exceção:
Isto mostra que o poder do latifúndio e do agronegócio está atento e atuante, disposto a agir por conta própria caso o poder público não atenda suas reivindicações de punir os trabalhadores que se levantam na defesa de seus direitos.
Número de conflitos em queda
No geral, porém, o ano de 2007 apresenta números inferiores aos de igual período de 2006. O total de conflitos no campo (conflitos por terra, por água, trabalhistas e etc.) de 1.414, em 2006, caiu para 837. O número de pessoas envolvidas passou de 652.284 para 561.926, e o número de assassinatos de 30 para 19.
Também em relação ao trabalho escravo o número de ocorrências caiu de 214, em 2006, para 177, em 2007, com, respectivamente, 5.767 e 5.127 trabalhadores submetidos a condições análogas à escravidão.
Os conflitos exclusivamente por terra passaram de 1.042, para 540. As ocupações despencaram de 329 para 247, e os acampamentos de 60 para 35. O número de famílias, nas ocupações, porém, cresceu, passou de 35.315 para 37.630. O número de famílias despejadas foi menor: 17.443, em 2006; 10.669, em 2007.
Por outro lado, o número de Manifestações cresceu passando de 579, com a participação de 359.998 pessoas, em 2006, para 671, com a participação de 465.394 pessoas, em 2007.
O que explicam esses números
O aumento no número de famílias em ocupações, apesar de estas terem sofrido uma diminuição expressiva, acaba evidenciando que o número de famílias sem terra continua muito elevado e que há necessidade de um programa efetivo de reforma agrária.
A queda acentuada no número de conflitos se dá não porque tenha sido adotada uma política mais eficaz de reforma agrária ou de combate à violência. O que se pode sentir é que a não execução da reforma agrária, com famílias acampadas há 4, 5, 6 ou mais anos, desestimula a ação dos trabalhadores e dos seus movimentos, daí a queda expressiva dos números de ocupações e acampamentos. Aliado a isso, o bolsa-família dando um mínimo de condições para as famílias terem o alimento de cada dia, acaba arrefecendo o ímpeto de quem, premido pela necessidade, tem que buscar a qualquer custo seus meios de sobrevivência.
Número de assassinatos dobra no Centro-Oeste
Analisando os números em detalhe, o que se vê é que o número de assassinatos que decresceu no país como um todo, teve um aumento de 100% no Centro-Oeste passando de 2, em 2006, para 4 em 2007; e de 50% na região Nordeste, passando de 4 para 6.
No Centro-Oeste, 3 dos 4 assassinatos são de indígenas, dois deles no Mato Grosso do Sul onde os Guarani-Kaiowá vivem a situação mais dramática de que se tem conhecimento, encurralados em pequenas áreas ou acampados na margem de estradas, não se garantindo espaço para quem era o dono de toda aquela região. O outro indígena foi assassinado no Mato Grosso.
No Nordeste, dos 6 assassinatos, 3 são também de indígenas, 1 na Bahia, 1 no Ceará, e 1 no Maranhão. Também ali se configura uma situação em que o avanço do agronegócio não respeita nada, muito menos comunidades tradicionais, taxadas de improdutivas e de serem empecilho para o progresso.
No Centro-Oeste, cresceu o número de pessoas submetidas ao trabalho escravo. De 1.078, em 2006, passaram para 1.157, em 2007, com destaque para Goiás que de 3 ocorrências, em 2006, passou para 8, em 2007, com envolvimento de pessoas passando de 113 para 441. O mesmo acontecendo em Mato Grosso do Sul onde se registraram 9 ocorrências, envolvendo 628 pessoas, em 2007, contra 3 ocorrências e 39 pessoas, em 2006. O trabalho escravo também cresceu expressivamente no Maranhão e no Piauí. Goiás também se destaca por ter aumentado o número geral de conflitos, de 28 para 31 e de famílias envolvidas de 16.870 para 25.904.
Sudeste, onde conflitos e violência crescem
O que mais chama a atenção, porém, na análise mais regionalizada dos números é a região Sudeste que se comportou de modo inverso ao restante do país. A região foi a única que apresentou crescimento no número de conflitos passando de 180, para 193 e no número de pessoas envolvidas, que saltou de 71.983 para 112.356. Em relação às famílias expulsas a região Sudeste seguiu a tendência geral do País, passaram de 95 para 435. O Sudeste também foi o único que apresentou crescimento no número de famílias despejadas passando de 980 para 1.477. Foi só nessa região, ainda, que houve crescimento no número de ocupações: 78, em 2006; 88, em 2007, e de acampamentos: 4, em 2006; 7, em 2007.
Na região mais rica e urbanizada do País é impressionante constatar que ocorreram 23,5% de todos os conflitos no campo, e onde estão 20% das pessoas envolvidas em conflitos. O grande progresso tecnológico aplicado ao campo e o avanço das monoculturas geram, além das riquezas propagandeadas, maior desigualdade, exclusão e, em conseqüência disso, novos e graves conflitos.
A bem da verdade pode-se imputar este destaque do Sudeste à presença mais próxima dos meios de comunicação que registram os fatos, na maior parte das vezes, para criticar a ação dos trabalhadores. Em outras regiões do País, boa parte dos conflitos nunca chegam ao conhecimento público. Como diz o professor Carlos Walter Porto Gonçalves, da Universidade Federal Fluminense: “Não deixa de ser preocupante que a região mais rica do Brasil apresente crescimento da violência no campo em relação às demais regiões. Uma nova geografia da violência está se desenhando, conforme indicam estes dados parciais de 2007. Tudo indica que o avanço do cultivo da cana, diante da febre dos agrocombustíveis, esteja trazendo implicações no aumento do preço da terra, que rebate no programa de Reforma Agrária, e consigo carrega o aumento da violência .”
- Os dados que ora divulgamos referem-se aos meses de janeiro a setembro de 2007. São dados parciais porque muitas informações só chegam ao conhecimento do setor de documentação da CPT no encerramento do ano.
Comissão Pastoral da Terra – Secretaria Nacional
Assessoria de Comunicação
Os conflitos pela água, neste ano, apresentaram crescimento em relação a igual período de 2006. De 38 conflitos para 40 em 2007. O número de pessoas envolvidas, porém, mais que dobrou: de 12.632 para 25.919. Na região Sudeste houve o maior crescimento desses conflitos, de 6, em 2006, para 14, em 2007. Destes, 11 são em Minas Gerais. 17 dos 40 conflitos, 42,5%, foram registrados nos Estados banhados pelo rio São Francisco, objeto do projeto de Transposição do governo federal.
Diminuição de conflitos não esconde a violência
Mesmo que em termos absolutos tenha havido uma queda geral nos números dos conflitos, em termos relativos há crescimento da violência. Em 2006, para cada ocorrência de conflito houve 1,2 famílias expulsas, 16 despejadas e os assassinatos correspondiam a um para cada 47 conflitos. No mesmo período de 2007, (é bom ressaltar que são dados ainda parciais) para cada ocorrência de conflito se computam 5 famílias expulsas, 19 despejadas e um assassinato para 44 conflitos.
Mas é em relação ao número de famílias expulsas pelo poder privado que se verifica o maior crescimento da violência, não seguindo a tendência de queda verificada em outros indicadores. As famílias expulsas passaram de 1.657, em 2006, para 2.711, em 2007, mais de 100% a mais. Este aumento verificou-se em todas as regiões do País, sem exceção:
|
FAMÍLIAS EXPULSAS |
|
Região |
2006 |
2007 |
Centro-Oeste |
0 |
318 |
Nordeste |
459 |
491 |
Norte |
714 |
757 |
Sudeste |
95 |
435 |
Sul |
49 |
710 |
Total |
1.317 |
2.711 |
Isto mostra que o poder do latifúndio e do agronegócio está atento e atuante, disposto a agir por conta própria caso o poder público não atenda suas reivindicações de punir os trabalhadores que se levantam na defesa de seus direitos.
Número de conflitos em queda
No geral, porém, o ano de 2007 apresenta números inferiores aos de igual período de 2006. O total de conflitos no campo (conflitos por terra, por água, trabalhistas e etc.) de 1.414, em 2006, caiu para 837. O número de pessoas envolvidas passou de 652.284 para 561.926, e o número de assassinatos de 30 para 19.
Também em relação ao trabalho escravo o número de ocorrências caiu de 214, em 2006, para 177, em 2007, com, respectivamente, 5.767 e 5.127 trabalhadores submetidos a condições análogas à escravidão.
Os conflitos exclusivamente por terra passaram de 1.042, para 540. As ocupações despencaram de 329 para 247, e os acampamentos de 60 para 35. O número de famílias, nas ocupações, porém, cresceu, passou de 35.315 para 37.630. O número de famílias despejadas foi menor: 17.443, em 2006; 10.669, em 2007.
Por outro lado, o número de Manifestações cresceu passando de 579, com a participação de 359.998 pessoas, em 2006, para 671, com a participação de 465.394 pessoas, em 2007.
O que explicam esses números
O aumento no número de famílias em ocupações, apesar de estas terem sofrido uma diminuição expressiva, acaba evidenciando que o número de famílias sem terra continua muito elevado e que há necessidade de um programa efetivo de reforma agrária.
A queda acentuada no número de conflitos se dá não porque tenha sido adotada uma política mais eficaz de reforma agrária ou de combate à violência. O que se pode sentir é que a não execução da reforma agrária, com famílias acampadas há 4, 5, 6 ou mais anos, desestimula a ação dos trabalhadores e dos seus movimentos, daí a queda expressiva dos números de ocupações e acampamentos. Aliado a isso, o bolsa-família dando um mínimo de condições para as famílias terem o alimento de cada dia, acaba arrefecendo o ímpeto de quem, premido pela necessidade, tem que buscar a qualquer custo seus meios de sobrevivência.
Número de assassinatos dobra no Centro-Oeste
Analisando os números em detalhe, o que se vê é que o número de assassinatos que decresceu no país como um todo, teve um aumento de 100% no Centro-Oeste passando de 2, em 2006, para 4 em 2007; e de 50% na região Nordeste, passando de 4 para 6.
No Centro-Oeste, 3 dos 4 assassinatos são de indígenas, dois deles no Mato Grosso do Sul onde os Guarani-Kaiowá vivem a situação mais dramática de que se tem conhecimento, encurralados em pequenas áreas ou acampados na margem de estradas, não se garantindo espaço para quem era o dono de toda aquela região. O outro indígena foi assassinado no Mato Grosso.
No Nordeste, dos 6 assassinatos, 3 são também de indígenas, 1 na Bahia, 1 no Ceará, e 1 no Maranhão. Também ali se configura uma situação em que o avanço do agronegócio não respeita nada, muito menos comunidades tradicionais, taxadas de improdutivas e de serem empecilho para o progresso.
No Centro-Oeste, cresceu o número de pessoas submetidas ao trabalho escravo. De 1.078, em 2006, passaram para 1.157, em 2007, com destaque para Goiás que de 3 ocorrências, em 2006, passou para 8, em 2007, com envolvimento de pessoas passando de 113 para 441. O mesmo acontecendo em Mato Grosso do Sul onde se registraram 9 ocorrências, envolvendo 628 pessoas, em 2007, contra 3 ocorrências e 39 pessoas, em 2006. O trabalho escravo também cresceu expressivamente no Maranhão e no Piauí. Goiás também se destaca por ter aumentado o número geral de conflitos, de 28 para 31 e de famílias envolvidas de 16.870 para 25.904.
Sudeste, onde conflitos e violência crescem
O que mais chama a atenção, porém, na análise mais regionalizada dos números é a região Sudeste que se comportou de modo inverso ao restante do país. A região foi a única que apresentou crescimento no número de conflitos passando de 180, para 193 e no número de pessoas envolvidas, que saltou de 71.983 para 112.356. Em relação às famílias expulsas a região Sudeste seguiu a tendência geral do País, passaram de 95 para 435. O Sudeste também foi o único que apresentou crescimento no número de famílias despejadas passando de 980 para 1.477. Foi só nessa região, ainda, que houve crescimento no número de ocupações: 78, em 2006; 88, em 2007, e de acampamentos: 4, em 2006; 7, em 2007.
Na região mais rica e urbanizada do País é impressionante constatar que ocorreram 23,5% de todos os conflitos no campo, e onde estão 20% das pessoas envolvidas em conflitos. O grande progresso tecnológico aplicado ao campo e o avanço das monoculturas geram, além das riquezas propagandeadas, maior desigualdade, exclusão e, em conseqüência disso, novos e graves conflitos.
A bem da verdade pode-se imputar este destaque do Sudeste à presença mais próxima dos meios de comunicação que registram os fatos, na maior parte das vezes, para criticar a ação dos trabalhadores. Em outras regiões do País, boa parte dos conflitos nunca chegam ao conhecimento público. Como diz o professor Carlos Walter Porto Gonçalves, da Universidade Federal Fluminense: “Não deixa de ser preocupante que a região mais rica do Brasil apresente crescimento da violência no campo em relação às demais regiões. Uma nova geografia da violência está se desenhando, conforme indicam estes dados parciais de 2007. Tudo indica que o avanço do cultivo da cana, diante da febre dos agrocombustíveis, esteja trazendo implicações no aumento do preço da terra, que rebate no programa de Reforma Agrária, e consigo carrega o aumento da violência .”
Comissão Pastoral da Terra – Secretaria Nacional
Assessoria de Comunicação
https://www.alainet.org/es/node/124705?language=en
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