"What is Bolivia?
18/10/2003
- Opinión
A pergunta era de Sundance Kid – mas poderia ter sido de Bush -
quando Butsh Cassidy propunha que fugissem para esse estranho lugar e
recebeu a resposta: "It'a country, stupid!"
(Quando o então presidente dos EUA Ronald Reagan afirmava que a
Nicarágua era "a fronteira sul" do seu país, cancelando a existência do
México, da Guatemala, de Honduras e El Salvador, dizia-se que à pergunta
sobre onde ficava aquele perigoso país, ele respondia: "Você vai até a
Califórnia, depois vira à esquerda".)
Desde que o movimento atual contra o governo de Sanchez de Losada
começou, deve-se estar buscando no mapa onde fica esse perigoso e
estranho país. Para quem acompanha minimamente a história da Bolívia, não
era difícil perceber que estava incubada ali uma guerra civil. Antes de
tudo porque a Bolívia é um país explosivo, prenhe de grandes conflitos
sociais. Embora não aprendamos na escola, fez-se ali uma belíssima
revolução em 1952, que nacionalizou as minas, fez uma reforma agrária,
substituiu o Exército por milícias populares.
Depois de vários outros movimentos populares, assentados na força
organizada dos mineiros e dos camponeses, depois de um governo de
militares ligados ao narcotráfico, a Bolívia foi a primeira vítima de
experiências neoliberais no mundo, idealizada pelo então gurú desses
experimentos – Jeffrey Sachs – e posta em prática por Sanchez de Losada,
que liquidou a economia mineira boliviana para terminar com a inflação.
Sucederam-se então vários governos que deram continuidade às políticas do
FMI – incluído o ex guerrilheiro Paz Zamora e o ex-ditador Hugo Banzer.
Sanchez de Losada chegou a se eleger presidente na lua-de-mel do
modelo neoliberal e retornou o ano passado à presidência, quando o modelo
já estava esgotado. Norte-americano de formação e de vínculos, fala com
sotaque abertamente gringo, Sanchez de Losada foi ao segundo turno contra
o líder camponês Evo Morales, do Movimento ao Socialismo (MAS). Pela cara
da grande maioria dos bolivianos, Morales, por sua origem indígena,
deveria ganhar por grande maioria, mas foi derrotado fragorosamente no
Parlamento. Nessa "democracia liberal" já estava ali incubada o fracasso
do seu governo e do tipo de regime político que se considera democrático,
mas tem a cara de Sanchez de Losada e não de Evo Morales.
A destruição da economia mineira produziu sua vingança contra as
elites que desarticularam o movimentos sindical das minas, com
contingentes de ex-líderes sindicais descendo para trabalhar com os
camponeses, dando um caráter político ao movimento cocaleiro. Resistência
às políticas de fumigação do governo norte-americano, sem dar
alternativas aos camponeses caracterizou o movimento dos camponeses, que
também protagonizaram uma das mais belas lutas do movimento global contra
o neoliberalismo – a derrota da tentativa de privatizar a água na
Bolívia.
O movimento atual combina a força acumulada pelo movimento camponês
na resistência à política dos EUA de fumigação das plantações de coca –
em lugar de coibir o consumo no seu país, de longe o maior mercado
consumidor de drogas -, na luta contra a privatização da água, que tem no
líder indígena Felipe Quisque seu prinicpal dirigente, mais a força da
Central Operária Boliviana (COB) e do MAS (Movimento ao Socialismo), cujo
candidato à presidência, com apoio do movimento camponês foi Evo Morales,
seu principal dirigente. Esse movimento, iniciado pela oposição à venda
do gás boliviano aos EUA, via Chile – contra a venda sem processa-lo e
contra a utilização de porto do Chile, expropriado da Bolívia na guerra
do Pacífico, de 1879 -, canalizou o descontentamento popular que já havia
explodido no segundo semestre do ano passado e no começo deste em
mobilizações violentamente reprimidas pelo governo.
Sanchez de Losada se sustenta hoje no apoio do governo norte-
americano e do Exército, tutelado pelos EUA mediante sua política de
fumigação das plantações. Ninguém dá nada por sua permanência na
presidência. O movimento opositor luta também contra saídas golpistas de
Sanchez de Losada e propugna sua renúncia, a substituição pelo vice-
presidente e a convocação de uma Assembléia Constituinte que instaure um
sistema política democrático, que permita que as grandes maiorias do país
– indígenas, camponesas e operárias – assumam os destinos da Bolívia.
(Enquanto isso, espera-se que o embaixador brasileiro nesse país se
limite a proteger a vida dos brasileiros e deixe de opinar sobre a
natureza da oposição política boliviana, porque já se foram os tempos –
como no Chile de Pinochet – em que as embaixadas brasileiras serviam de
aliados de governos que reprimem os seus povos.)
https://www.alainet.org/es/node/108614
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