O Consenso de Buenos Aires

14/10/2003
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Lula e Kirchner quiseram dar a este encontro não apenas pelo aprofundamento das relações bilaterais entre os dois países, mas impor-lhe um selo ideológico, propondo-se a assinar o documento a que chamaram "Consenso de Buenos Aires". O nome não é novo e, de alguma forma, é pouco auspicioso. Foi a denominação dada ao documento elaborado ainda na década passada por Jorge Castañeda – ex-ministro de relações exteriores de Vincente Fox – e Mangabeira Unger, assinado por Fernando de la Rúa, por Vicente Fox, por Ricardo Lagos , por Ciro Gomes, entre outros. Representantes do PT participaram até um certo momento da elaboração do documento, mas finalmente não assinaram sua versão final. Seu destino não foi positivo, tendo no fracasso de de la Rúa seu certificado de morte. Era uma tentativa de "humanização do neoliberalismo", porque mantinha as políticas de ajuste fiscal, tentando compatibiliza-las com mais políticas sociais. Ao retomar o nome agora Lula e Kirchner pretendem dar-lhe um novo conteúdo. Ambos pretendem sair do modelo neoliberal, embora enfrentem até aqui grandes dificuldades para faze-lo. Porém os dois têm consciência que são hoje o eixo de uma alternativa de integração continental, através do Mercosul, opondo-se ao projeto patrocinado pelos EUA, mediante a ALCA. Assim, depois de reafirmação de objetivos comuns – como a garantia de direitos e liberdades para todos os cidadãos, a consolidação da democracia política, o aporfundamento das políticas públicas, a prioridade da educação – o documento tem seu centro na crítica da desigualdade imposta pela globalização e na afirmação estratégica do papel do Mercosul. "Ratificamos nossa profunda convicção de que o Mercosul não é apenas um bloco comercial, mas constitui um espaço catalizador de valores, tradições e futuro compartilhado." A integração regional é entendida como "uma opção estratégica para fortalecer a inserção de nossos países no mundo, aumentando sua capacidade de negociação." Em seguida fica claro um dos objetivos estratégicos: "Uma maior autonomia de decisão nos permitirá fazer frente mais eficazmente aos movimentos desestabilizadores do capital financeiro especulativo e aos interesses contrapostos dos blocos mais desenvolvidos, ampliando nossa voz nos diversos foros e organismos multilaterais." Menciona-se que a integração sul-americana tem como objetivo "a constituição de um novo modelo de desenvolvimento, em que se associem o crescimento, a justiça social e a dignidade dos cidadãos." Reforça-se assim a impressão que a polarização Mercosul/Alca não é apenas externas, mas remete a políticas econômicas diferenciadas, uma privilegiando a exportação, outra mais voltada para o mercado interno. O documento reafirma a posição dos dois países de crítica às posições internacionais do governo Bush, sem menciona-lo, defendendo ao mesmo tempo soluções multilaterais para os problemas do mundo e fortalecimento do papel da ONU e do seu Conselho de Seegurança. No seu conjunto, ao contrário do Consenso de Washington, que pretendia dar os métodos de obter os fins assumidos pelos organismos que os patrocinavam, o Consenso de Buenos Aires se centraliza mais em enunciar objetivos, embora faça do Mercosul e da integração regional seu grande instrumento de realização desses objetivos.
https://www.alainet.org/es/node/108587
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