Jogo perverso da especulação
30/12/2002
- Opinión
Refletindo o quadro de crise cambial crônica vivido pelo país, gerado
pela orientação econômica adotada por Fernando Henrique Cardoso, o dólar
voltou a subir nos últimos dias, após algumas semanas consideradas de
calmaria. A explicação inicial, sugerindo que a volta da alta do dólar
devia-se à "demora" do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva,
indicar o novo presidente do Banco Central, faz parte do jogo de pressão
dos mercados financeiros visando mais uma vez impor suas saídas ao novo
governo e se aproveitar para especular com a moeda e obter lucros.
Dados recentes apontam que os bancos estrangeiros ganharam 1,54 bilhão de
dólares nos últimos dois meses com a especulação feita na campanha
eleitoral. Depois de comprarem títulos da dívida externa brasileira nos
mais baixos preços dos últimos dez anos - cotações que ajudaram a forjar
com relatórios pessimistas sobre o País durante a campanha eleitoral -,
bancos e corretoras como o JP Morgan, o Goldman Sachs, o Morgan Stanley,
Bank of America e a Merrill Lync estão vendendo os papéis. Desde 27 de
setembro, os C-Bonds, títulos mais negociados, valorizaram-se 31%. Agora
o índice de "risco-país" volta a se elevar para nova rodada especulativa.
Assim, estamos subordinados a verdadeiro sistema de especulação que rege
suas regras visando ganhos astronômicos ao capital financeiro, às custas
do país.
Consumindo a renda nacional
Até o dia 2 de janeiro, vencerão 6,1 bilhões de dólares de papéis
cambiais, o que atiça a sanha de lucros astronômicos dos especuladores.
A dívida interna brasileira em setembro atingiu R$ 640 bilhões e sua
composição dá base para a especulação. Em 1994, apenas 8,3% da dívida
interna eram atrelados ao dólar, hoje são 29%. Em 1994, apenas 16% eram
atrelados à taxa de juros do dia do vencimento, hoje são 52,9%.
Portanto, 82% da dívida são atrelados ao câmbio e à taxa de juros da data
do vencimento. A especulação sobre o valor da moeda e a imposição de
altíssimas taxas de juros possibilitam polpudos lucros para os detentores
dessas dívidas, que consomem enorme parcela da renda nacional. Às
vésperas dos vencimentos desses papéis, a ação especulativa joga o valor
do dólar às alturas!
Essa é a irracionalidade criada pela administração de FHC. Sem modificar
esse esquema nefasto, será difícil retomar o desenvolvimento. As
riquezas do país são apropriadas pelos especuladores, e o povo amarga
condições de vida cada vez mais difíceis, em meio à crise.
A economia brasileira apresenta grande potencial. Agora mesmo a
Petrobrás fez outra grande descoberta de petróleo na Bacia de Campos,
desta vez no Espírito Santo. As novas reservas foram avaliadas em 300
milhões de barris de petróleo. Mesmo com a retração mundial e a grandes
disputas comerciais, nosso país realiza grandes negócios. A unidade
brasileira da Volkswagen acertou a exportação de modelos Gol para a
China, que representará US$ 500 milhões em 5 anos, no seu maior contrato
desde os anos 90. Também a Ford brasileira bateu seu recorde mensal de
exportação, com faturamento de US$ 67 milhões. Já a Empresa Brasileira
de Aeronáutica (Embraer) acertou a instalação de uma linha de montagem em
território chinês para fornecimento de 500 aviões. Todos com componentes
e tecnologia brasileira. O investimento total é de US$ 25 milhões.
O potencial brasileiro é inegável. Caberá ao novo governo preparar as
condições para o rompimento do círculo vicioso perverso, imposto ao país
pelo atual governo. O caminho para a construção de um novo projeto de
desenvolvimento nacional deve considerar os compromissos assumidos, mas
questionando seu conteúdo e buscando renegociações. O Brasil deve
preparar as condições para a montagem de um novo modelo, de soberania,
democratização crescente e desenvolvimento do país, com justiça social.
https://www.alainet.org/es/node/106813
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