Amazônia: a ilusão da terra prometida

06/11/2012
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Apresentação
 
Este é o segundo livro de uma série de quatro volumes que tratam da Amazônia Legal brasileira. Algumas precauções foram tomadas no sentido de escrevê-los de maneira independente, para que o leitor não tenha a necessidade de ler o primeiro volume para poder entender o segundo. Porém, quando lidos contribuem no entendimento global do processo de expansão, ocorrido na região através dos tempos.
 
O presente trabalho não tem o objetivo de criar mecanismos que venham solucionar os problemas que envolvem os atores sociais que vivem a Amazônia no seu dia-a-dia. Temos o propósito de apontar a problemática ocorrida através da interferência desses ao longo dos tempos na região e contribuir no processo da aprendizagem através da demonstração da realidade ali imposta pelas metas sistêmicas nacionais e internacionais. Também não temos a pretensão de apresentar soluções prontas, pois entendemos que esta é um tarefa de toda a sociedade no seu conjunto.
 
A estratégia desse trabalho é criar mais desafios e questionamentos, por meio da apresentação da realidade, vista através dos cenários que escancaram e escamoteiam a expropriação do homem e do seu ambiente, em detrimento da expansão capitalista instalada na região para concentração da terra e da riqueza. A realidade é apresentada sem contornos e meias palavras e, quando necessário, apontamos as causas que levam a produzir dois extremos no acesso à terra na região, um de muitos pobres “Sem Terra” e o outro de poucos ricos concentrando a terra.
 
Não temos o objetivo de esgotar a discussão sobre a Amazônia, mas contribuir de maneira humilde, apontando situações que envolvem o reino animal e vegetal num processo avançado de destruição da vida. Não pretendemos fechar o diálogo, mas colaborar no entendimento dos conhecimentos já existentes e apontar outras versões para o debate. O nosso propósito é somar, através da organização dos  conceitos e teorias da Amazônia, que apontam para um novo espaço de expansão de forma integrada por meio das diretrizes sistêmicas mundiais.
 
No cenário apresentado, o livro tem o objetivo de identificar os atores que fazem a história da Amazônia brasileira – vítimas dessa expansão capitalista – bem como apontar de que forma foi realizada na região a expropriação dos povos originários, dos posseiros, dos garimpeiros e da força de trabalho. Objetiva-se também verificar a destruição dos mais variados ecossistemas regionais, que sustentam uma rede de equilíbrio da vida entre os reinos animal e vegetal.
 
O homem da floresta foi expulso através de verdadeiros genocídios. Episódios estes por muitas oportunidades ignorados pelo Estado, através de suas representações e instâncias. A brutalidade praticada contra esses agentes ao longo dos tempos e a forma mais severa de tortura foram evidenciadas, pois esse cenário desencadeia o complexo mundo das armas.
 
Um espaço complexo onde jorra mel, leite e sangue, que envolve os marginalizados, os despossuídos, os grupos econômicos, os jagunços e os pistoleiros, determinando-se dois mundos distintos. O crime é colocado a serviço das elites com a finalidade de aparelhar o modo capitalista de produção na região, e a violência é o meio. A meta final do projeto ali instalado é a concentração da terra, para a produção de monoculturas que venham servir ao mercado internacional através dos produtos para a exportação. Para atingir essas metas, a intolerância e a brutalidade fazem a ponte entre o capital e o Estado contra as massas.
 
Nesta mesma perspectiva, verificamos o tratamento da força de trabalho que chega à região através do exército industrial de reserva do País, com o objetivo de abrir as áreas para implantar os projetos econômicos na agropecuária, no extrativismo mineral e florestal, bem como para dar suporte às cidades fabricadas pelos projetos de colonização. Identificamos o quadro de trabalhadores na agropecuária, na indústria, na prestação de serviços e em outras funções que estruturam o novo espaço de ocupação.
 
As formas de obtenção de mão-de-obra para a região se caracterizaram pela presença de trabalhadores em estado flutuante: os concentrados nas cidades planejadas ou fabricadas e os importados de outras regiões do Brasil, para servirem de força de trabalho aos empreendimentos. Isso tudo acontece para suprir as necessidades locais de força de trabalho, por meio de um processo que serve de máscara  da realidade, para camuflar as relações de trabalho na região, identificado através do agenciamento de trabalhadores através do sistema “gato”.
 
Caracterizamos a importância da mineração no processo de colonização, sendo este o ponto alto para penetração das pessoas nas primeiras fases de transferência para a região. Movimento este que voltou à tona no período da pós-ditadura de 1964, pois o homem continua vendo a região por meio do sonho da terra prometida.
 
Na Amazônia passa a ocorrer um deslocamento progressivo de homens, mulheres e crianças em busca do “mel”[1]. O encontro com o “mel” passa a ser almejado e planejado através da posse da terra, bem como pelo acesso ao trabalho, para finalmente realizar o sonho dos marginalizados e dos despossuídos do País, que chegam à região com o firme propósito de serem incluídos pelo acesso à terra prometida e sonhada.
 
Argumentamos sobre a estratégia utilizada pelo Estado que entrega os recursos minerais da região aos grupos nacionais e internacionais para exploração destas riquezas nas últimas décadas. Verificamos o projeto garimpeiro ocorrido nos anos 80 do século XX, que é interpretado como uma nova fase da mineração manual dos garimpos auríferos do Brasil. Essa nova fase, volta-se à atração de mão-de-obra para servir aos grupos econômicos ali instalados.
 
Os garimpos servem para atrair os posseiros e os colonos na procura do ouro. Assim acontece a desistência na busca da terra. Enquanto se processava o abandono da terra, em seu lugar se instalaram grandes latifúndios, que receberam parte das áreas parcialmente abertas nos territórios amazônicos. O grande capital, através de seus projetos econômicos, passa  a concentrar ainda mais as terras, por meio da expulsão do homem do campo, tornando-se a alternativa que se apresentava mais promissora  para os marginalizados engrossarem as fileiras dos garimpos auríferos. 
 
A expansão capitalista da última fronteira brasileira trouxe prejuízos ao meio ambiente, não respeitou os vários ecossistemas bem definidos na região, principalmente os ligados ao Pantanal, ao Cerrado e à Floresta Amazônica. Estes capitalistas passaram a se reproduzir na região através da lógica do sistema capitalista periférico,  causando a depredação do meio ambiente e o adiantado estado de interferência do “homem civilizado” nas terras dos povos da floresta. Esse é o meio para facilitar a concentração da riqueza e promover a produção das monoculturas para servir ao mercado mundial, conforme suas exigências e tendências mercadológicas.
 
Os rios foram poluídos por mercúrio, e as florestas, por agentes químicos utilizados no solo e como desfolhantes, proporcionando sérios problemas ecológicos. As queimadas realizadas na abertura da região criaram uma nova paisagem, fruto da devastação que busca o lucro por meio do aproveitamento dos recursos naturais e a produção de monoculturas através da agropecuária. A concentração da terra também ocorre para especulação de mercado e agregação de valor, observada através das investidas das empresas que buscam lucros fáceis. 
 
Ficou caracterizada a vulnerabilidade da imensa floresta tropical com a interferência humana, não sendo respeitada a biomassa ali existente. Do mesmo modo, as riquezas foram sendo aos poucos destruídas pelas estratégias capitalistas nacionais e internacionais, por meio do dinheiro público. A grande quantidade de insetos, plantas, animais e microorganismos pouco estudados estão sendo destruídos e pirateados por grupos organizados que atuam impunemente na região, onde estão presentes grupos farmacêuticos multinacionais, apurando fórmulas do saber popular, praticando a biopirataria do conhecimento e patenteando os novos produtos para o mercado capitalista mundial.
 
É nesta perspectiva que tratamos a região Amazônica. No sentido de identificar a problemática do desenvolvimento econômico regional, bem como as formas de  expropriação do homem e do seu ambiente. Nesta  amplitude tecemos as relações entre o homem, o trabalho, o capital e o meio ambiente, com o intuito de identificar os atores sociais que fazem parte da Amazônia Legal brasileira.
 
Preocupamo-nos em contribuir com a discussão a fim de promover o debate e a crítica de forma ampla e não em apresentar os conceitos como definitivos, uma vez que não somos os detentores da verdade absoluta. Entendemos que se faz necessário rever teorias e conceitos, tendo em vista que a evolução do homem deve relacionar-se com a produção de novos conhecimentos, sem no entanto, desprezar os já existentes.
 
 
SUMÁRIO
PREFÁCIO ................................................................................... 07
APRESENTAÇÃO ........................................................................ 09
O CAPITAL E A EXPROPRIAÇÃO DO HOMEM E SEU AMBIENTE
A questão indígena, o genocídio de um povo .................. 13
A expropriação do posseiro e a luta pela terra ................. 27
As formas de exploração da força de trabalho ................. 45
A exploração do trabalho na mineração aurífera .............. 59
A devastação ambiental na expansão capitalista ............. 79
RESUMO ...................................................................................... 95
CONCLUSÃO ............................................................................. 105
LISTA DE ABREVIATURAS ........................................................ 109
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................ 111
 


[1] A busca do “mel”, bem como o encontro com este doce dourado, é uma metáfora usada ao longo do texto para demonstrar que as pessoas que se deslocam para a Amazônia buscam um sonho. Mesmo aos marginalizados e despossuídos no processo histórico, a região apresenta-se como um novo “eldorado”, e este veio acompanhado de muito brilho e luz intensa. Assim, o “mel” representa o alimento, a riqueza e a esperança de uma nova vida a todos os que chegam com o firme propósito de ver seus sonhos realizados. A metáfora que passamos a utilizar neste livro, também foi muito útil no livro “Amazônia: do mel ao sangue – os extremos da expansão capitalista” (Picoli, 2004: 16).
https://www.alainet.org/en/node/162438?language=en
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