Campanha no Chile defende renacionalização do cobre e de bens públicos estratégicos
Projeto de Iniciativa Popular foi o primeiro a ultrapassar as assinaturas necessárias na Comissão de Meio Ambiente e Modelo Econômico da Convenção Constituinte.
- Opinión
A campanha pela renacionalização do cobre e dos bens públicos estratégicos entregues às transnacionais durante o governo de Augusto Pinochet (1973-1990) tem sido impulsionada após a vitória de Gabriel Boric à presidência, em dezembro de 2021, e ao engajamento de referências históricas como Orlando Caputo ao processo constituinte, a partir de abril.
Colhendo o resultado da mobilização, já nas primeiras semanas de janeiro, o projeto de Iniciativa Popular de Norma Constitucional 15.150 foi o primeiro a ultrapassar as assinaturas necessárias para que seja aceita sua tramitação na Convenção Constitucional, na Comissão de "Meio ambiente, direitos da natureza, bens naturais comuns e modelo econômico".
Sobre a relevância da proposição, o representante do presidente socialista Salvador Allende (1970-1973) no comitê executivo de Corporação Nacional do Cobre (Codelco), e gerente da estatal, responsável pelas empresas nacionalizadas, Orlando Caputo vem contribuindo com o debate, sustentando a sua relevância para o progresso independente da nação sul-americana.
“A nacionalização do cobre foi algo muito exitoso, reconhecido pelos economistas e historiadores como a principal transformação econômica, social e política do Chile no século 20. Depois veio a desnacionalização do cobre que, para nós, constitui um assalto ao país nos séculos 20 e 21”, denunciou. Caputo recordou que a política de esvaziamento da estatal em função da política do enriquecimento alheio atingiu em cheio não só a Codelco, mas o país. “A Codelco controlava 100% da produção do cobre e agora as grandes empresas mineiras estrangeiras controlam mais de 70%, ficando a Codelco com apenas 28%”, protestou.
Luta contra as trasnacionais
Na avaliação do renomado economista, há uma verdade e um farsa: uma a que proporciona o desenvolvimento com justiça social, emprego e renda, e a outra veiculada pelos oligopólios de mídia em função dos rentistas e dos interesses externos. “Nós estamos convencidos que a desnacionalização do cobre é altamente prejudicial para o nosso país, apesar de toda a propaganda feita pelo Conselho Mineiro, pelos economistas de direita, pelos neoliberais. Somos economistas da Universidade do Chile, mas economistas críticos, que analisamos a economia a partir da defesa dos recursos naturais e dos trabalhadores”, frisou Caputo.
Para o país atual, assinalou, “mais do que na época em que Eduardo Frei era presidente (1964-1970), em que o cobre era a viga mestra, e mesmo da de Allende, em que o cobre era o salário do Chile, este minério é atualmente ainda mais relevante”. “Porque o cobre está entrando, junto com o lítio, em uma nova era em que será a base de uma plataforma energética da economia mundial. E nada poderá ser feito no país se não nacionalizarmos o cobre”, explicou Caputo, acrescentando que “este é um processo de industrialização nacional que incrementará valor agregado ao cobre e também impulsionará uma indústria nacional potente”.
O fato, recordou, é que apesar de liderar mundialmente a extração do lítio, o Chile exporta mais de 80% do mineral na forma de concentrados, ou seja, sem processamento. Algo semelhante acontece com outros minerais, como o lítio, e em grande medida com a pesca e a silvicultura.
Trabalhadores em campanha
Para a Confederação Nacional dos Trabalhadores do Cobre, que apresentou o projeto de Iniciativa Popular, é essencial incorporar de forma integral o artigo 24 inciso sexto da atual Constituição, aprovada em 11 de julho de 1971. “O problema a ser solucionado é que a histórica nacionalização do cobre apresentada pelo presidente Allende, aprovada pelo parlamento e mantida na Constituição atual, tem sido flagrantemente violada em virtude da legislação nela arraigada pela ditadura e mantida até hoje”.
E ao ser ultrajada, acrescentou a entidade, “permitiu que a propriedade efetiva da maior parte do cobre extraído, bem como de quase todo o subsolo em todo o território nacional, tenha sido usurpada gratuitamente por um pequeno grupo de grandes corporações privadas. Uma situação semelhante ocorreu nos principais bens comuns de todo o nosso território”.
A partir de amplos estudos, a Confederação descobriu que “o imenso fluxo de receitas associado aos recursos assim usurpados, cuja ordem de grandeza só no caso do cobre equivale à metade do orçamento do Estado, confere a essas corporações uma posição hegemônica que determina a direção geral dos negócios públicos, impondo à economia um marcado viés rentista, extrativista e predatório e constitui a principal causa da desigualdade social”.
Desta forma, ressaltam os trabalhadores, “a recuperação do domínio público do Estado sobre bens estratégicos é condição indispensável para a efetiva recuperação da soberania dos povos e instituições democráticas e sobre a determinação dos rumos dos negócios públicos”. Sendo assim, “considerando o peso determinante do principal recurso do território, pode-se afirmar com certeza que quem controla o cobre controla o Chile”.
Recuperação do domínio público
A Iniciativa Popular 15.150 projeta que ao renacionalizar o cobre e os bens públicos estratégicos, “a Nova Constituição permitirá a recuperação do domínio público efetivo sobre eles, reservando ao Estado a exclusividade de sua gestão no caso dos principais, como a grande mineração de cobre e outros minerais, água e outros recursos desta natureza”. Esta decisão, esclarecem os trabalhadores, permitirá o estabelecimento de uma Política de Mineração Sustentável que busca moderar a exploração de forma compatível com o equilíbrio da natureza, “antes e depois de sua extração, que constitui a base de um novo modelo de desenvolvimento econômico, bem como financiar um bom viver para todos os povos, em primeiro lugar para as comunidades do entorno das tarefas produtivas”.
Simbolicamente, a Confederação propõe “manter na Nova Constituição o parágrafo da nacionalização de 1971, que nem mesmo modificou a atual Constituição, que se sugere reproduzir palavra por palavra devido ao seu significado histórico”. Porém, ao mesmo tempo, o projeto defende que se adeque o conjunto de novos regulamentos aos propósitos do dito parágrafo, “revogando a atual lei de concessões e demais dispositivos constitucionais que tenham violado flagrantemente o seu espírito”.
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