Brasil neoliberal vê fortuna de ricos crescer e salário de pobres estagnar
- Opinión
Desde 2015, patrimônio financeiro dos milionários subiu 45%, desemprego quase dobrou e salário estancou
O Itaú teve lucro recorde em 2018, 25 bilhões de reais, e anunciou recentemente outra fortuna em ganhos no primeiro semestre, 13 bilhões. Ao comentar o novo resultado, seu presidente, Cândido Bracher, disse nunca ter visto o Brasil em situação macroeconômica “tão boa”. Motivo: o desemprego está alto, daí que o País pode crescer sem que a inflação suba junto.
Desde a adoção de uma política econômica neoliberal por sucessivos governos de 2015 em diante, reforçada na dosagem por cada um dos que vieram depois, bancos, banqueiros e seus clientes vips não têm mesmo do que se queixar. Já os mais pobres, os trabalhadores, aqueles cujo desemprego Bracher festeja, esses têm. Vagas somem, salários estancam.
O retrato do avanço da concentração de renda pós-neoliberalismo pode ser visto ao se comparar a evolução do mercado de trabalho com o dinheiro aplicado em banco pelos mais ricos. O economista Fernando Nogueira da Costa, da Unicamp e ex-diretor da Caixa Econômica Federal, apresentou dados em 2 de agosto, no Conselho Federal de Economia (Cofecon), que permitem a comparação.
Em 2015, os clientes de private banking, um serviço oferecido pelos bancos só a ricaços, tinham 6,4 milhões de reais cada um, em média, conforme dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). Eram 109 mil pessoas. Em maio de 2019, esse clube tinha crescido um pouco, 123 mil pessoas. Grana per capita deles: 9,3 milhões.
Enquanto a riqueza dos milionários subia 45%, foi de 31% o crescimento do patrimônio financeiro de um outro grupo de endinheirados que Costa cataloga como “classe média alta”. Cada pessoa desse grupo, 3,1 milhões de pessoas ao todo, tinha 158 mil reais em média em bancos em 2015, conforme a Anbima. Em maio, eram 4,2 milhões de pessoas e cada uma tinha 208 mil.
Já a parcela que Costa define como “classe média baixa” viu sua riqueza financeira recuar cerca de 20%. Em maio de 2015, as pessoas desse grupo tinham em média 45 mil reais nos bancos, ainda de acordo a Anbima. Eram 6,2 milhões de pessoas. Em maio, tinham 37 mil. O grupo somava então 8 milhões de pessoas.
Para essa classe média baixa e os pobres em geral, a vida no neoliberalismo tem sido complicada.
A dificuldade começou quando Dilma Rousseff botou Joaquim Levy no ministério da Fazenda, logo após ter sido reeleita em outubro de 2014. Corte de gastos públicos e privatizações foram reforçados a partir de maio de 2016 com Henrique Meirelles na Fazenda, na gestão Michel Temer. E mais ainda com Paulo Guedes à frente da economia no governo Jair Bolsonaro, iniciado em 2019.
A obra de Levy, Meirelles e Guedes é salário baixo e desemprego alto. Em junho, último dado disponível do IBGE, a renda média dos trabalhadores foi de 2.290 reais. Ao todo, há 93 milhões de trabalhadores. Quando Levy entrou, a renda era de 2.274 reais. Quando Meirelles assumiu, de 2.227 reais. Na entrada de Guedes, 2.321 reais. Em cinco anos, o salário praticamente não saiu do lugar.
E o desemprego? Na chegada de Levy ao governo, era de 6,5%. Quando Meirelles assumiu, estava em 11,2% (11,4 milhões de pessoas). Na passagem do cargo para Guedes, era de 11,6% (12,2 milhões). Um semestre depois, o “posto Ipiranga” entrega índice de 12% (12,8 milhões).
O número de pessoas que desistiu de procurar trabalho por achar que não adianta nada, o chamado desalento, está em 4,9 milhões. No início da política econômica neoliberal, era de 1,5 milhão.
Entre os mais pobres, a situação é ainda pior. São eles os que mais sofrem, disse Nogueira da Costa no Cofecon, a destacar que a análise de dados mais detalhados expõe mais nitidamente a desigualdade brasileira – somos o 10o país de renda mais concentrada, segundo a ONU.
Enquanto o desemprego geral era de 12,3% em maio (a apresentação de Costa tinha dados de maio), na classe E era de 30%. No início da política econômica neoliberal, a desocupação na classe E era de 18%. Costa bota dentro dessa classe pessoas com renda máxima de 1,1 mil.
Já nas classes B (de 7,2 mil a 11 mil) e A (acima de 11 mil), o neoliberalismo não fez diferença empregatícia. Desde 2015, a desocupação nessas duas classes oscila pelos 3,5%, o nível de maio. Praticamente não mudou. E apesar disso, elas ficam mais endinheiradas, como se viu nos dados sobre a riqueza financeira.
- André Barrocal é repórter correspondente da revista CartaCapital em Brasília-DF
7 de agosto de 2019
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