Uruguai reafirma críticas à reforma trabalhista de Temer
- Opinión
O governo do Uruguai voltou a criticar a reforma trabalhista imposta ao Brasil pela administração de Michel Temer. Na quarta-feira 16, o país vizinho informou que não vai seguir o caminho de reforma trabalhista adotado pelo Brasil, considerada um "retrocesso" que pode ter uma repercussão regional negativa.
"Não vamos seguir o caminho do Brasil, e se tiver gente no Uruguai querendo segui-lo, vai nos encontrar do outro lado", disse à imprensa o ministro do Trabalho Ernesto Murro. Murro destacou que a administração do presidente de esquerda Tabaré Vázquez aposta no crescimento econômico "mas não às custas de reduzir direitos sociais e dos trabalhadores". Governado desde 2005 pela Frente Ampla, uma coalizão de esquerda, o Uruguai completará 15 anos de crescimento ininterrupto em 2017.
Aprovada em julho, reforma trabalhista abre a possibilidade para que negociações entre trabalhadores e empresas se sobreponham à legislação trabalhista, o chamado "acordado sobre o legislado". Poderão ser negociados à revelia da lei o parcelamento de férias, a jornada de trabalho, a redução de salário e o banco de horas. Por outro lado, as empresas não poderão discutir o fundo de garantia, o salário mínimo, o 13º e as férias proporcionais.
Para a jornada de trabalho, o texto prevê que empregador e trabalhador possam negociar a carga horária num limite de até 12 horas por dia e 48 horas por semana. A jornada de 12 horas, entretanto, só poderá ser realizada desde que seguida por 36 horas de descanso. Já as férias poderão ser divididas em até três períodos, mas nenhum deles poderá ser menor que cinco dias corridos ou maior que 14 dias corridos.
Ainda que a maior parte da grande imprensa não aborde o impacto negativo das mudanças, como mostrou levantamento da ONG Repórter Brasil, inúmeros especialistas são contrários ao texto. "Com a reforma trabalhista, o poder do empregado fica reduzido a pó", disse a CartaCapital Maria Aparecida da Cruz Bridi, professora de Sociologia da Universidade Federal do Paraná. Ricardo Antunes, da Unicamp, referência na sociologia do trabalho, fez duras críticas ao texto em entrevista a CartaCapital. "Na escravidão o trabalhador era vendido. Na terceirização, é alugado", afirmou ele.
Murro disse que essa lei "é um tema dos brasileiros, mas pode ter repercussões importantes nas empresas uruguaias e afetar os empresários e trabalhadores locais".
O Uruguai entende que a Declaração Sócio-Laboral, assinada pelos sócios do Mercosul em 2015, deve ser respeitada e que a nova legislação afeta negativamente os direitos dos trabalhadores e vai incidir na competitividade interna do bloco.
A reforma trabalhista estremeceu o vínculo bilateral entre Brasil e Uruguai. Na segunda-feira 14, o Itamaraty convocou o embaixador do Uruguai no Brasil, Carlos Daniel Amorín-Tenconi, para prestar esclarecimentos sobre as declarações de integrantes do governo uruguaio contra a reforma trabalhista de Temer.
No sábado 12, o próprio Murro havia atacado a reforma e sua possível repercussão negativa no Uruguai. "Se vale mais um acordo individual entre um empregado e um patrão que uma lei ou convênio, retrocedemos dois ou três séculos, e isso não será só para os trabalhadores brasileiros". "Se no Mercosul devemos fazer respeitar diversos direitos e obrigações, também devemos fazer respeitar os direitos sociais e trabalhistas", disse.
No domingo 13, o ministro de Relações Exteriores do Uruguai, Rodolfo Nin Novoa, também criticou a reforma trabalhista e indicou que o Uruguai vê a reforma trabalhista brasileira também como uma forma de competição desleal. "Não vamos nos meter na legislação interna dos países, mas queremos marcar preocupações, porque assim vai ser difícil competir", afirmou. Nin Novoa também entrou no mérito da reforma. "O salário dos trabalhadores não pode ser a variável de ajuste para a competição nos mercados", afirmou.
Nesta semana, Nin Novoa anunciou que o governo vai pedir uma reunião de órgãos sócio-laborais dos demais sócios do Mercosul por esse tema. "Preocupa o Uruguai porque é uma maneira de competir com base na retirada de direitos trabalhistas, coisa que sempre tentamos evitar", afirmou.
*Com informações da AFP
17/08/2017
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