Mercosul e União Europeia: acordo obscuro significa desequilíbrios e perda de empregos

15/12/2017
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Enquanto altos funcionários do Mercosul e da União Europeia ratificaram, nos últimos dias, o forte desejo de formalizar um acordo antes do fim do ano, crescem as dúvidas e os pedidos para se transparentar os detalhes do que está sendo negociado nas reuniões, que até agora se mantêm sob o mais rigoroso secretismo.

 

Na Argentina, o Secretário de Relações Econômicas Internacionais, Horacio Reyser, afirmou perante o Congresso do seu país que se trata de uma  “inserção inteligente”, mas segundo os deputados presentes o fato mais destacado é somente o próprio secretismo: o fato de que os critérios e posições a serem apresentados por parte do Mercosul na nova rodada de negociação estão em completa reserva.

 

Alguns legisladores argentinos supõem que não se chegaria a um entendimento pelo fato de que os europeus não ampliariam sua oferta com relação aos temas críticos da carne e dos bicombustíveis, mas que não descartariam que os governos do Mercosul terminassem aceitando as restrições europeias em troca de promessas de cooperação e/ou futuras aberturas.

 

Os presidentes da Argentina e do Brasil, Mauricio Macri e Michel Temer, com o aval silencioso de Paraguai e Uruguai, estão decididos a mostrar sua vontade de “se abrir ao mundo” aceitando as exigências europeias de no fazer maiores concessões às demandas de apertura de seus mercados agrícolas (suas mais recentes ofertas de abertura para as carnes e os biocombustíveis é ainda menor que em propostas anteriores).

 

Em meio a um clima político anti tratados de livre comércio existente nos países europeus, e cooptado pelo avanço de uma direita regressiva, o presidente da Comissão Europeia, o luxemburguês Jean Claude Juncker, deseja demonstrar à opinião pública que graças à atitude aberturista dos governos neoliberais do Mercosul, a Europa só obterá benefícios do acordo, não só por ganhar maiores mercados para os produtos europeus como também pela estimativa de ganhos ao redor de 4,4 bilhões de euros (5,2 milhões de dólares), que por sua vez representam três vezes mais que as reduções de taxas aduaneiras conseguidas nas negociações com o Canadá e o Japão.

 

Além disso, o acordo garantiria aos europeus, entre outros benefícios, uma maior renda para suas empresas na área de serviços, incluindo em particular o setor financeiro compras públicas, e a maior extensão para a proteção monopólica de suas patentes medicinais.

 

Jorge Marchini, economista e docente da Universidade de Buenos Aires, mostra um ponto em que, se fosse alcançada a assinatura imediata do acordo nas condições planteadas, mesmo que de forma preliminar e que estivesse cheio de expressões falando sobre os desejos de cooperações e complementariedade, tal como ocorreu em outros países que fizeram acordos como os europeus na região, é de se esperar o avanço das assimetrias nas relações comerciais e econômicas da região com a Europa, que já na atualidade são crescentemente deficitárias tanto em termos de comércio como no movimento de capitais.

 

Por outra parte, o eurodeputado Helmut Scholz afirma que “uma abertura precipitada a outra economia, como a europeia, pode trazer consequências dramáticas ao Mercosul, especialmente em temas como o emprego – em particular o industrial – ou segurança alimentária, focando no uso da terra para produtos de exportação como o etanol, e para a estabilidade financeira da região, uma vez que a liberalização financeira limita fortemente o espaço político dos governos para reagir contra qualquer futura crise financeira, que desafortunadamente não tardará, considerando que os governos não han reagiram com decisão depois da crise de 2008”.

 

A desinformação e o secretismo

 

A desinformação sobre o tema faz com que reine certa confusão, desconhecimento e/ou uma perda de foco de atenção sobre o acordo e suas consequências nos setores progressistas.

 

Os europeus foram muito inteligentes em apresentar este acordo como diferente da ALCA (Área de Livre Comércio das Américas, projeto de George W. Bush abandonado em 2005 pela aliança de Chávez, Kirchner e Lula), embora suas condições e exigências sejam ainda mais severas. O que também contribui ao desconcerto nesta negociação historicamente regressiva é o fato de que la maior parte das organizações e movimentos antiglobalização (muitos deles com apoio de fundos públicos europeus ou de partidos políticos que apoiam o acordo) concentram sus atenção na próxima Conferência Ministerial da OMC (Organização Mundial do Comércio) em Buenos Aires, em meados de dezembro.

 

O paradoxal aqui é que enquanto toda a atenção está concentrada na rodada da OMC, uma reunião da qual não se esperam grandes novidades, talvez a mesma sirva para “tirar da cartola” o anúncio do acordo entre Mercosul e União Europeia com um abraço dos presidentes do Mercosul com Juncker. Se isso acontecer, poderia entrar para a história como uma mostra mais das dificuldades dos setores progressistas e de esquerda para se posicionarem de forma efetiva, e não somente declamativa, neste período de tantas mudanças políticas.

 

- Claudio della Croce é economista e docente argentino, investigador associado ao Centro Latino-Americano de Análise Estratégica (CLAE).

 

12/12/2017

https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/Mercosul-e-Uniao-Europeia-acordo-obscuro-significa-desequilibrios-e-perda-de-empregos/4/38975

 

https://www.alainet.org/pt/articulo/189883?language=en
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