A crise global e a reestruturação dos países
- Opinión
Sete anos após o seu início, a grave crise de dimensão global segue sem solução à vista e sem uma interpretação convergente. Na ausência de compreensão comum, tem importância a difusão de análises econômicas cada vez mais contraditórias.
De um lado, os integrantes do pensamento econômico ortodoxo (neoliberal), que hegemonizaram o discurso até 2007, sustentam o urgente desmonte das políticas anticíclicas adotadas face à perspectiva de retomada das economias para uma situação pré-crise internacional. Os sinais disso, notados pela recuperação das bolsas de valores e do mercado financeiro, bem como pela elevação dos preços das commodities, tenderiam a apontar para a normalidade dos mercados desregulados e para a volta da compressão dos gastos públicos com aumento da tributação sobre a população. Para isso, a necessidade de seguir com políticas fiscais de austeridade.
De outro, os defensores do pensamento econômico heterodoxo (anti-neoliberal) alertam para os riscos de bolha especulativa presentes no comportamento das bolsas de valores, do mercado financeiro e dos preços das commodities ainda descolados de uma considerável melhora na economia real. Por conta disso, caberia manter a condução das políticas anticíclicas, assim como aprofundar as ações de reformulação da governança mundial (revisão do papel de agências multilaterais como FMI e Banco Mundial) e de regulação e promoção do desenvolvimento em novas bases econômicas, sociais e ambientais.
Para além das interpretações sobre a crise mundial e o papel das políticas governamentais adotadas, cabe ressaltar ainda o movimento emergente de reestruturação das economias. Três evidências disso chamam a atenção tanto pela rapidez com que se difundem como pela dimensão estrutural que se apresenta, nem sempre percebido pelo conjunto da sociedade.
A primeira evidência pode ser percebida pela conformação de outra partilha mundial decorrente do esvaziamento relativo do poder dos Estados Unidos no exercício de uma ordem unipolar. Em contrapartida, o avanço do mundo policêntrico, com novas regiões exercendo a promoção do desenvolvimento supranacional, apresenta-se para o contexto sul-americano a inédita oportunidade de o Brasil contribuir decisivamente na integração regional do verdadeiro desenvolvimento.
A segunda evidência corresponde ao recente fortalecimento do papel do Estado, associado, em parte, ao apoio de grandes empresas na competição global e à conformação de novo padrão de políticas públicas matriciais. A forte transferência de recursos públicos às grandes corporações transnacionais (bancos e empresas não financeiras) indica tanto o aprofundamento da concorrência intercapitalista como a maior competição entre os próprios Estados nacionais. A posição brasileira, em virtude disso, volta-se também para a reestruturação patrimonial de empresas privadas nacionais e de estatais acompanhada da perspectiva de maior fortalecimento das ações para as micro e pequenas empresas no espaço nacional.
A terceira evidência, por fim, localiza-se na concentração de esforços técnico-científicos voltados para a geração de um novo modelo de produção e consumo menos degradante do meio ambiente. Isso porque a eficácia das ações públicas que procuram minorar as emissões de gases por meio da conscientização, tributação e promoção de alternativas ambientalmente sustentáveis pressupõe outra base tecnológica para produzir e distribuir. Ademais das iniciativas em torno da matriz energética renovável, amplia-se a importância da implementação de estrutura bioindustrial capaz de promover a geração de crescente nível de empregos verdes.
- Marcio Pochmann é professor do Instituto de Economia e do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Universidade Estadual de Campinas.
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