O desafio atual: contra o Estado pós-democrático, resgatar a democracia

É sabido que a ordem capitalista, por seu individualismo e fúria de acumulação nunca se deu bem com a democracia.

20/07/2018
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Não são poucos os analistas sociais e juristas da maior qualidade que denunciam a atual situação política do Brasil como a instauração de um Estado de exceção. O golpe parlamentar, jurídico e mediático de 2016 permitiu que os golpistas passassem por cima da Constituição, modificassem as leis trabalhistas em favor dos patrões, engesassem o país com o teto de gastos, em saúde e educação, impedindo a criação de um Estado de Bem Estar Social.

 

A justiça deixou de ser imparcial e, mesmo nos níveis mais altos, em alguns, mostra ter lado, contra o PT e a figura carismática de Lula. O que o juiz federal de primeira instância Sérgio Moro faz, é a aplicação deslavada do lawfare e não esconde o ânimo persecutório ao ex-Presidente, condenando-o sem provas materiais irrefutáveis. Por isso é considerado um prisioneiro político..

 

Importa observar que este tipo de política obedece a uma ampla estratégia pensada a partir dos interesses do Império com os aliados internos de nosso pais. O Brasil é decisivo em termos de geopolitica e de abundantes bens e serviços naturais, capazes de garantir a base físico-química que sustenta o sistema-vida e o sistema-Terra, já em alto gru de erosão.

 

O golpe foi dado sob a égide do mais rigoroso neoliberalismo e da voracidade do capital especulativo de cariz capitalista que domina a políitica no mundo inteiro.

 

É sabido que a ordem capitalista, por seu individualismo e fúria de acumulação nunca se deu bem com a democracia. Se democracia implica mais que o direito de votar, mas de buscar a igualdade de todos os cidadãos com referência às leis, aos direitos basicos, à justiça social e às garantias fundamentais, devemos dizer que ela é antes um engodo que uma realidade. A democracia moderna se construiu como representativa de toda a sociedade. Na verdade, em geral, representou os interesses dos poderosos e sub-representou os do povo trabalhador ou pobre.

 

Dados de várias entidades sérias nos relatam que cerca de 8 bilhardários controlam grande parte da economia mundial, deixando milhões emilhões na pobreza e na fome. Como a lógica capitalista é a competição e não a solidariedade, entramos numa era de barbárie e de grande desumanidade,

 

Esse tipo de capitalismo necessita de demcracias de baixíssima intensidade, com um Estado submetido ao mercado, com a menor participação popular possível. A estratégia dos países capitalistas visam a recolonizar a América Latina e o Brasil condenados a serem meros exportadores de commodities (alimentos, minérios e outros)

 

O golpe de 2016 foi dado com esse propósito, em si, anti-patriótico, anti-popular e profundamente injusto, em benefício dos endinheirados e herdeiros da Casa Grande. Esse golpe liquidou com o Estado democrático de direito. Guardou asaparências e as instituições. Mas não funcionam como a Constitição prevê oufuncionam sem imparcialidade.

 

Inaugurou-se o “pós-Estado democrático”, categoria usada por Rubens Casara, juz de direito do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e professor universitário, com notável capacidade teórica de pensar o desastre da democracia brasileira e a ideologia subjacente. Agora vigora de fato um Estado de exceção, à moda do jurista alemão Carl Schmitt (1888-1985) que justificava o regime de Hitler, pois para ele o critério do político reside na definição do inimigo a ser satanizado e destruido(cf. O conceito do político,Vozes 1992,51-53). Acima de todas as leis está o “Führer” ou o “Ducce”, que sempre têm razão.

 

A consequência se lê no sub-título do livro de Casara:”neo-obscurantismo e gestão dos indesejáveis”. Quer dizer, mantem-se a farsa democrática e se castigam os mais pobres, pois são indesejáveis ao sistema de acumulação e de consume.

 

O desafio atual consiste em resgatar a democracia mínima (nem aquela “sem fim” de Boaventura de Souza Santos nem como “valor universal” de Norberto Bobbio, nem a democracia “sócio-ecológica” de Zaffaroni e minha) mas simplesmente a pura e simples democracia, expressa no Estado Democrático de Direito. Devemos repudiar o Estado pós-democrático como excrecência da democracia e outro nome para o regime de exceção.

 

- Leonardo Boff escreveu: “Brasil: concluir a refundação ou prolongar a dependência”, Vozes 2018.

 

https://www.alainet.org/pt/articulo/194247?language=es
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