As duras lições da mídia e do golpe

10/05/2016
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Foto: Felipe Bianchi/Barão de Itararé ciclo debates
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A hora é de resistência, mas é inevitável a crítica a Dilma Roussef e ao governo pela falta de diálogo com as classes populares e, principalmente, por não ter enfrentado a discussão sobre a regulação e a democratização da comunicação. A avaliação é do jornalista e blogueiro Paulo Henrique Amorim, que participou de debate sobre mídia e subjetividade, na noite desta segunda-feira (9), em São Paulo.

 

A atividade, parte do Ciclo de Debates Que Brasil é Este?, promovido por parceria entre Barão de Itararé e Fundação Escola de Sociologia e Política (FESPSP), também contou com a presença da jornalista Renata Mielli. “Os grandes grupos de comunicação tem muita influência na formação da consciência da população brasileira”, afirma Mielli, “ e por isso é fundamental que haja democracia e diversidade no setor”.

 

Para a coordenadora do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) e secretária-geral do Barão de Itararé, falar em democratização da mídia não significa defender o fim da Globo, mas a construção de veículos para que a família Marinho, por exemplo, não seja a dona da opinião pública no país. “Os cidadãos enxergam o mundo, o país, a cidade e a si mesmos através das lentes dos meios de comunicação”, pontua. No sistema brasileiro de comunicação, porém, o que prevalece são os meios privados, “fortemente vinculados ao mercado financeiro e ao poder econômico e que, logo, atendem a esses interesses”, observa a jornalista.

 

O cenário de concentração e monopólio no setor explica, em boa dose, o processo de golpe à democracia em curso no país. Sem regras e limites para seu poder, os meios têm desempenhado papel crucial na aventura do impeachment. “Dilma explica, explica e explica que o golpe é o crime, mas não diz quem é o criminoso”, reclama Amorim. “Ora, Dilma, é a Globo!”, dispara.

 

O autor do blog Conversa Afiada também detonou a aliança entre a mídia e o Judiciário, que fazem vista grossa às ilegalidades e excessos praticadas pela Operação Lava Jato. “O objetivo claro de Sergio Moro e da Lava Jato é prender Lula”, defende Amorim. "A Polícia Federal”, em sua avaliação, tem funcionado como um instrumento do golpe. “A Polícia Federal grampeia e prende quem quer. Polícia sem chefe é coisa de ditadura”, diz. “Quem não tinha chefe era o delegado Fleury, que matava sem dar satisfação”.

 

Para ele, as famílias donas da mídia se enganam se acham que o papel jogado por elas no golpe passará batido na história. “Em 1964, ainda tinha a camuflagem da guerra fria. Agora não. Esse golpe é pra entregar a Petrobras e mexer nos direitos trabalhistas, no salário mínimo, na Previdência. Essas são as vísceras do projeto golpista, e elas estão visíveis a todos”, argumenta. “A Globo acha que o cidadão liga no Bom Dia Brasil e acha normal ter um novo presidente? O pau vai comer, e ter luta”.

 

Governo promoveu mudanças, mas não disputou ideias

 

Apesar da promessa de resistência, Amorim e Mielli têm críticas duras à resignação do governo quanto ao monopólio midiático. Para Mielli, não ter disputado ideias, os corações e as mentes dos brasileiros, foi um erro imperdoável do PT. “Pouco foi feito nesse campo, como a aprovação da Lei do Direito de Resposta, que está judicializada. O Ministério das Comunicações, que deveria ser um espaço de direitos, segue funcionando como um balcão de negócios”, opina.

 

A TV Brasil também foi assunto. Exercendo papel de destaque na cobertura do golpe, a emissora pode estar com os dias contados. “Ela finalmente cumpre sua tarefa e, mesmo assim, sofre críticas internas. Ora, todos os canais têm a mesma postura e ainda querem que um Merval Pereira vá à TV Brasil?”, contesta. Na opinião dela e de Amorim, faltou investimento e decisão política para construir uma TV pública à altura da necessidade do país. “Agora, a emissora fatalmente será fechada por Michel Temer”, aposta Mielli.

 

Questionado sobre a Ley de Servícios de Comunicación Audiovisual da Argentina, popularmente conhecida como Ley de Medios, o blogueiro lamentou a falta de percepção do governo e dos movimentos populares sobre a importância do tema. “Cristina Kirchner só levou à lei adiante pois multidões foram às portas da Casa Rosada pedir. Aqui nós fomos?”, lamenta.

 

Ainda tomando como exemplos as experiências da região, Mielli acredita que o exemplo argentino não basta ter êxito na batalha da comunicação. Mesmo com a Ley de Medios, a situação da Argentina é drástica: as medidas do presidente Mauricio Macri não só promoveram graves retrocessos econômicos e sociais, como ameaçam, inclusive, liquidar a iniciativa que deveria impor limites ao poder do monopolista Clarín e promover a pluralidade de vozes na comunicação do país. Nesse sentido, reflete Mielli, quem fez melhor o dever de casa foi Hugo Chávez. “A Venezuela só resiste até hoje porque investiu e fortaleceu os meios comunitários e populares”, diz. “Isso, sim, constrói consciência”.

 

Sem lastro para buscar o tempo perdido, Amorim aponta para as tarefas que a esquerda terá de assumir frente ao iminente desfecho do golpe. “É tempo de resistir e lutar, mas essa crise tem de ter efeito pedagógico. Consumada a derrota, o PT e os movimentos sociais deverão refletir e muito”.

 

10 Maio 2016

http://baraodeitarare.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=1268:as-duras-licoes-da-midia-e-do-golpe&catid=12&Itemid=185

 

https://www.alainet.org/pt/articulo/177355?language=es
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