Muita onda por nada
21/02/2013
- Opinión
Definitivamente a blogueira cubana Yoani Sánchez, em visita ao Brasil, não representa nenhuma ameaça real ao socialismo – nem o de Cuba, o de qualquer outro país e menos ainda o do sonho de todos aqueles que lutam por um sistema que supere o capitalismo. Na verdade, a passagem dela por aqui teria ocorrido em brancas nuvens – salvo algum alarido na imprensa conservadora – não fosse os equívocos praticados pela diplomacia cubana e por grupos de ativistas de esquerda interessados em aplacar os eventos programados para ela por seus patrocinadores.
Ganhou a dimensão de uma personalidade internacional que ela não é; e serviu de pretexto para a direita brasileira alardear muito mais a sua campanha sistemática contra o governo e o regime cubanos; pulou da programação sustentada pelo jornal O Estado de S. Paulo, onde ela é colunista, pela editora de seu livro e de outros apoiadores, para a dimensão da internet e os debates nas escolas e nos locais de trabalho. A direita não teria alcançado tal sucesso na projeção do seu troféu cubano sem a ajuda dos que tentaram abafar o discurso conhecido e puído dela.
Todos sabemos que há anos a blogueira Yoani critica o governo cubano e o cotidiano da vida na Ilha. Por isso mesmo granjeou apoios pelo mundo não só dos desafetos de Fidel e de Raul, mas de todos que querem desgastar o regime cubano, principalmente o seu sentido referencial e simbólico da resistência contra o império. Por isso mesmo Yoani recebeu prêmios de inúmeras instituições afiliadas ao capitalismo e ao imperialismo. Ela tem uma condição de vida muitas vezes superior à maioria dos cubanos e uma rede de apoio internacional – tudo porque ela faz críticas ao seu país. Quem, de esquerda, no Brasil, teria status de colunista no Estadão? Isso significa que ela não deve ter o direito de falar livremente em público?
O que transformou o giro de Yoani num acontecimento muito além de sua própria dimensão foi uma seqüência de trapalhadas da reação à sua visita, como o fato de a diplomacia cubana distribuir dossiês da blogueira; e de grupos de jovens articularem manifestações contra ela – inclusive para impedir que ela pudesse se manifestar. Tais grupos, ao se utilizarem do método do “empastelamento” lembram as posturas mais autoritárias da nossa história política, como as manifestações dos integralistas, dos integrantes do CCC e daqueles que usaram até correntes para defender o Joaquinzão e bater na oposição metalúrgica de São Paulo.
É preciso recolocar a blogueira no seu devido lugar: ela faz oposição ao governo cubano e está sendo alimentada pelo conservadorismo de direita que existe em muitos países, inclusive no Brasil. Ela tem o direito de ir e vir e de se expressar livremente. Ela não representa nenhuma ameaça do socialismo. Ela deve seguir o seu caminho. Temos aqui no Brasil muita gente mais perigosa do que ela – gente que tem poder, que manda de verdade e que usa as Yoani da vida apenas como úteis estafetas. Nada mais do que isso!
- Hamilton Octavio de Souza é jornalista e professor
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