Plebiscito: mais de 10 milhões dizem não a ALCA
19/09/2002
- Opinión
Culminando mais um processo que durou cerca de um ano, chegamos aos
resultados do Plebiscito sobre a ALCA, organizado pela Campanha Jubileu
Sul/Brasil, que é coordenado por mais de 100 entidades nacionais.
De 1 a 7 de setembro, 41.758 urnas recolheram os votos de
10.149.542 pessoas. O Plebiscito contou com o trabalho voluntário de mais
de 150 mil pessoas, em 3894 municípios (de um total de 5550). Em relação
ao Plebiscito da Dívida externa, o Plebiscito da ALCA atingiu 450
municípios a mais e superou em 70% o número de votantes.
Quanto aos resultados, 98,35% dos votantes, disseram não ao tratado
da Alca; 96% rejeitam as negociações que estão em andamento e; 98,6% não
aceitam a entrega da Base de Alcântara, no Maranhão, para controle
militar dos EUA.
Principais avanços...
O Plebiscito evidenciou a pedagogia do processo. Foi mais uma etapa
de uma caminhada de dez anos, que vivenciou as Semanas Sociais
Brasileiras; o Simpósio, Tribunal e Plebiscito da Dívida Externa, oito
edições do Grito dos Excluídos e, agora, o Plebiscito Nacional sobre a
ALCA. Um processo que apostou na soma de interesses comuns em detrimento
dos interesses departamentalizados. Intensificaram-se as parcerias,
solidificando ainda mais esta forma de trabalho. Foram mais de 100
entidades nacionais (igrejas, sindicatos, movimentos populares, partidos
políticos etc.) Aqui vale merecido destaque o papel desempenhado por
escolas, universidades e rádios comunitárias. Do ponto de vista
ecumênico, houve um salto qualitativo. Foram centenas de igrejas
evangélicas que participaram do Plebiscito da ALCA.
A campanha contra a ALCA foi um sucesso do ponto de vista
educativo e mobilizador. Talvez o maior processo educativo realizado no
Brasil nos últimos anos. Foram milhares de encontros, debates e reuniões
sobre o tema, que tomaram ruas, escolas, igrejas, associações, espaços
públicos e meios de comunicação.
O processo revelou ainda que a população, quando chamada e
esclarecida, tem grande interesse em discutir temas que dizem respeito à
soberania da nação. Os comitês e grupos de base mais uma vez mostraram
que sabem unir questões micro e macro. Ao mesmo tempo em que o Plebiscito
era organizado (urnas, atas, mesários etc), discutia-se a política
imposta pelo governo norte americano, suas implicações comercias,
militares e de soberania. Um tema que, a principio parecia ser complicado
para ser popularizado, tornou-se assunto de debate em bares, igrejas,
escolas, famílias, etc.
O Plebiscito, com sua dimensão continental, contribuiu para o
estabelecimento de pontes com a América Latina reforçando a importância
do Brasil como parte deste continente.
Um destaque especial deve ser dado à qualidade do material
produzido pela clareza e didática de seu conteúdo. Foram milhões de
cartilhas, jornais, folders, vídeos, spots para rádios com clara posição
política contra a intervenção norte americana. Nosso povo deve ser o
protagonista de sua história, de sua política, de seu futuro. Que os
americanos cuidem de seu país. Do Brasil, cuidamos nós.
Em Brasília, nos dias 17 e 18 de setembro, cerca de dois mil
militantes participaram de debates e estudos sobre a ALCA, enquanto os
resultados do Plebiscito eram divulgados na imprensa e entregues ao
Senado e Câmara Federal, Superior Tribunal Federal, à embaixadora norte
americana e ao Presidente da República. Dom Franco Masserdotti, disse: "O
Plebiscito é um exercício de cidadania e democracia. É o desejo de ver
nossa pátria traçando sua soberania... de nosso povo ser o protagonista
de sua história. Precisamos globalizar a solidariedade, avançando juntos
para construir um novo mundo possível." Para o líder do MST, João Pedro
Stédile, "...o mais importante não é o número, mas o fato de que milhões
de brasileiros, durante meses, tomaram conhecimento de um tema que as
elites queriam esconder. Foi um grande exercício de pedagogia de
massas... A vocação do povo brasileiro é criar uma grande integração
latino-americana."
O Plebiscito sinaliza aos poderes Executivo, Legislativo e
Judiciário do Brasil, ao governo dos Estados Unidos e às grandes
corporações transnacionais, que o povo brasileiro não abre mão de forjar
seu próprio destino. Reafirma para os povos irmãos das Américas que
partilham conosco a organização da Campanha Continental contra a ALCA,
que o povo brasileiro não abre mão de lutar, sempre e em todo o lugar,
por uma nação e um Continente livres da exploração neocolonial e de toda
injustiça; por uma nação e um Continente em que caibam todas as cidadãs
e cidadãos plenos de dignidade e de direitos. Os resultados do
Plebiscito Nacional sobre a ALCA e Alcântara são a afirmação clara de
que é possível a construção de um mundo sem dominação de uma nação sobre
as demais; em que a economia esteja a serviço dos povos; em que as
relações entre as pessoas e entre as nações estejam baseadas na
igualdade e no respeito às diferenças; um mundo, enfim, em que caibam
todos os mundos, todas as culturas, todas as aspirações de todos os
povos. (Manifesto do Plebiscito).
Perspectivas...
Este processo não pára. A mobilização continua através do
fortalecimento e criação de novos comitês de luta e resistência contra a
ALCA. Serão realizadas jornadas de formação e luta contra a implementação
deste tratado e produzidos materiais didáticos exigindo do governo a
realização de um plebiscito oficial. Também como continuidade desta luta,
continuarão sendo debatidos os temas da dívida externa, da militarização
impulsionada pelos EUA e da soberania da Amazônia.
No calendário de lutas estão colocadas as mobilizações de Quito no
final de outubro, a 10ª Plenária Social Nacional, a elaboração do projeto
de iniciativa popular sobre o Plebiscito Oficial, a 3ª Edição do Fórum
Social Mundial, em janeiro de 2003 e as Jornadas de abril de 2003, na
Argentina, quando serão apresentados os resultados dos Plebiscitos
realizados em diversos países do continente.
* Luiz Bassegio, é secretário executivo do Grito dos Excluídos
Continental e membro da coordenação da Campanha Jubileu Sul.
https://www.alainet.org/fr/node/106400
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