O que significou a greve geral no Paraguai?

27/03/2014
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As sete centrais sindicais paraguaias convocaram uma massiva greve geral na última quarta-feira (26). Foi a  primeira paralisação destas dimensões nos últimos 20 anos, com uma alta participação por parte dos trabalhadores paraguaios. As reivindicações: 25% de aumento salarial; controle de preços da cesta básica; não ao aumento do transporte público e o rechaço à polêmica Aliança Público-Privada (APP) sancionada recentemente. Em suma, a exigência de uma mudança na política econômica por parte do governo conservador do empresário Horacio Cartes.
 
A exitosa greve geral dos trabalhadores tem uma explicação pouco feliz para o campo popular paraguaio: se dá em um contexto de avanço de uma política econômica concentrada e excludente para as grandes maiorias por parte do governo de Cartes. O significado da APP não dá lugar a várias interpretações, uma vez que efetivamente significa uma sensível perda da autonomia em relação à infraestrutura pública, em benefício do setor privado. O texto afirma que o Executivo poderá impulsionar tais alianças por licitação e outros mecanismos que não foram especificados. Para o jornal conservador La Nación do Paraguai, um dos objetivos da norma é que o setor privado “recupere seu investimento com a exploração do serviço que presta tal obra, por exemplo, construção de estradas e pontes para o trânsito ou comunicação por terra”. O que se busca, de acordo com essa explicação? Em suma: trazer capitais privados, para então dar a concessão, a gestão e a cobrança de tarifas pelas obras realizadas.
 
Os defensores e detratores da Aliança Público-Privada
 
O FMI qualificou, em fevereiro último a APP como “um instrumento importante para o investimento em infraestrutura no país”, como afirma o subdiretor da agência, Naoyuki Shinohara , em visita oficial a Assunção. No interior do país, um dos principais expoentes da defesa da Aliança Público-Privada foi nada menos que Germán Ruiz, presidente da Associação Rural do Paraguai, quem inclusive se permitiu dizer que “os que criticam a APP são antipatriotas”. Isso mostra a defesa corporativa que alguns setores do poder econômico paraguaio fazem da nova lei, que garantirá uma maximização dos lucros para o setor privado.
 
Contra a lei se pronunciaram, em primeiro lugar, a Plenária de Centrais Sindicais, que convocaram esta greve geral desde o final de 2013 — logo após a promulgação da APP—. Também se somaram à convocatória a Coordenadora Democrática e a Federação Nacional Camponesa. Podemos dizer, portanto, que um amplo espectro de organizações sociais, sindicais e políticas conseguiram convergir em uma exitosa jornada de greve geral e mobilização, com sensíveis reivindicações como o aumento salarial de 25%, a defesa do controle de preços para produtos da cesta básica, o rechaço ao aumento das tarifas no transporte público, e a rejeição da APP.
 
A discussão da APP se reabre?
 
Sem dúvidas, o sucesso da jornada abriu rachaduras no caminho a seguir no mesmo governo paraguaio. O próprio vice-presidente, John Afara, afirmou que “o governo cometeu um erro durante a criação da Lei de Aliança Público-Privada. Não socializamos com todos os setores, mas convidamos a cidadania para que leia a lei e se informe”, após anunciar a formação de uma “mesa de diálogo” com representantes sociais, políticos e econômicos.
 
Esta mesma autocrítica pode significar um primeiro passo para promover não só a discussão sobre a lei, mas também o modelo econômico que está sendo implementado pelo governo de Cartes — do qual esta legislação é um ponto a mais, embora claro, com uma transcendência inegável —. É que, em um momento em que a América Latina em geral discute uma maior participação do Estado nos assuntos econômicos cotidianos, produto do surgimento de governos pós-neoliberais em grande parte de nossos países, debates como os que ocorrem no Paraguai nos fazem lembrar de outras décadas, da resistência frente aos avanços do grande capital concentrado.
 
O desafio para as organizações sociais e políticas do Paraguai será seguir pleiteando, tanto nas ruas como nos ambientes institucionais, suas justas demandas sobre estas questões, para evitar retrocessos nas conquistas sociais e direitos. Aparentemente, a maciça participação popular na greve geral e mobilização é uma notícia saudável, da que o governo deverá tomar nota rapidamente.
 
- Juan Manuel Karg é licenciado em Ciência Política na Universidade de Buenos Aires. Pesquisador do Centro Cultural da Cooperação de Buenos Aires.
 
Traducción: Vanessa Martina Silva
https://www.alainet.org/es/node/84372?language=es
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